sexta-feira, 18 de março de 2022

LIÇÃO 12: AS EPÍSTULAS INSTRUEM E FORMAM OS CRISTÃOS

INTRODUÇÃO

O termo grego epistole, traduzido para o português como “epístola”, indica uma comunicação escrita, uma carta ou missiva de natureza formal. As Epístolas da Bíblia apresentam instruções vitais para a compreensão da doutrina cristã, bem como para a formação dos cristãos. Elas correspondem 21 dos 27 livros do Novo Testamento. As treze escritas por Paulo são denominadas de “paulinas”. As oito epístolas restantes são de outros autores e designadas de “gerais”.

Esses livros são divinamente inspirados e representam quase 80% do cânon do Novo Testamento. Apenas os quatro Evangelhos, Atos e Apocalipse não são considerados Epístolas. O conjunto de doutrina dessas Epístolas, revelado aos seus diversos autores, continua a instruir o povo de Deus, a formar o caráter do crente salvo em Jesus e a preparar a Igreja para a vinda do Senhor. Neste capítulo, agrupamos as Epístolas por temas e autoria, e destacamos alguns de seus aspectos doutrinários.

I – COMO AS EPÍSTOLAS PAULINAS NOS INSTRUEM

1. Instruções Salvíficas Nesse grupo, enfatizamos os aspectos da doutrina da salvação. Em Romanos, destaca-se o texto: “Porque nele [Cristo] se descobre a justiça de Deus de fé em fé, como está escrito: Mas o justo viverá da fé” (Rm 1.17). Paulo ensina que, pela fé em Cristo que nos libertou do pecado mediante seu sacrifício remidor, somos declarados justos diante de Deus (Rm 3.23-25). A sentença “o justo viverá pela fé” remonta ao profeta Habacuque (Hb 2.4b) e aparece em Gálatas 3.11 e Hebreus 10.38, o que faz da declaração um preceito antigo que se cumpre na Nova Aliança. Essa expressão significa que “os cristãos viverão por causa da fidelidade de Deus, e por causa de sua resposta de fé a Deus: como resultado, eles terão vida eterna e experimentarão a plenitude de vida”.

Em Gálatas, ressalta-se que “o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo [...] porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada” (Gl 2.16). Na construção da última parte desse versículo, Paulo faz alusão a Salmos 143.2 e explica que a justificação do crente não vem por observar a Lei. A condição de ser declarado “não culpado” diante de Deus vem por meio da fé na obra redentora de Cristo. O apóstolo reitera que somente a fé em Cristo nos liberta do jugo da Lei (Gl 5.1). O ensino ratifica que pela fé em Cristo “o crente é colocado em um relacionamento direto com todos os requisitos da Lei, absolvido de todas as penalidades da Lei e consequentemente liberto da maldição da Lei”.

Em 1 Coríntios sublinha-se a mensagem do “Cristo crucificado” (1 Co 1.23). O texto informa que os judeus buscavam “sinais” e os gregos buscavam “sabedoria” (1 Co 1.22). Portanto, a mensagem de salvação por meio da cruz de Cristo era escândalo para os judeus e loucura para os gregos. Não obstante, Paulo lhes assevera que Cristo é o “poder de Deus” e a “sabedoria de Deus” (1 Co 1.24), que morreu pelos nossos pecados e ressuscitou ao terceiro dia (1 Co 15.3-4). Em 2 Coríntios, frisa-se o “ministério da reconciliação” (2 Co 5.18). Por causa do pecado, o homem vivia em inimizade com Deus. No entanto, Deus estava disposto a perdoar as ofensas e enviou um Mediador. Assim, Cristo levou os nossos pecados na cruz e nos reconciliou com Deus (2 Co 5.19-21).

2. Instruções a Respeito de Cristo. Nesse enfoque, o destaque são os aspectos da doutrina de Cristo. Em Efésios, observam-se dois polos: Cristo e a Igreja — ambos representados pela imagem simétrica de “Cristo, a cabeça” (Ef 1.22; 4.15; 5.23) e “Igreja, o corpo” (Ef 1.23; 4.12; 5.30). Paulo ensina que é exclusivamente em conexão com Cristo que somos abençoados com todas as bênçãos espirituais. Nesse sentido, a Igreja foi eleita em Cristo (Ef 1.4), redimida em Cristo (Ef 1.7) e para a glória de Cristo (Ef 1.12). Em Cristo passamos da morte para a vida (Ef 2.1) e, em Cristo, fomos libertos das concupiscências (Ef 4.22). Assim, a nova vida do crente é caracterizada pela salvação “em Cristo”.

Em Filipenses, a mensagem enfatiza que para o cristão “o viver é Cristo” (Fp 1.21). Matthew Henry descreve que “a glória de Cristo deve ser a finalidade da nossa vida, a graça de Cristo, o princípio dela, e a Palavra de Cristo, a regra dela. A vida cristã é derivada de Cristo e dirigida a Ele. Ele é o princípio, a regra e o fim dela”. Em vista disso, Cristo é o modelo de vida para o salvo. Assim sendo, o crente deve regozijar-se em Cristo diante de todas as circunstâncias (Fp 1.18; 2.2; 3.1; 4.4-13); por amor a Cristo, fugir de contendas e manter a comunhão com os irmãos (Fp 2,1-4); e andar nos mesmos passos de humildade de Cristo Jesus (Fp 2.5-11).

Em Colossenses, Paulo sublinha que a “vossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3.3). Indica que Cristo é a vida do crente, e que essa nova vida é de Cristo. O Comentário Bíblico Beacon avalia que “trata-se de uma realidade para o crente e é realizada numa nova consciência e poder éticos para a justiça”. Quem recebe essa graça deve despojar-se do velho homem e das suas más obras, e revestir-se da nova natureza em Cristo (Cl 3.5-10). E, dessa forma, a igreja está unida com Cristo em Deus, morta para os pecados e para o mundo, e ressuscitada com Cristo (Cl 2.13-15; 3.1,2). Em suma, Cristo é tudo em todos, Ele é a suficiência para todo cristão (Cl 3.11).

3. Instruções sobre as Últimas Coisas. Essas orientações enfatizam os aspectos da segunda vinda de Jesus. Em 1 Tessalonicenses, Paulo ensina que, no retorno de Cristo, “os que ficarmos vivos, seremos arrebatados” (1 Ts 4.17). Quanto à vinda de Cristo, nossa Declaração de Fé professa que é um evento a ser realizado em duas fases:

A primeira é o arrebatamento da Igreja antes da Grande Tribulação (1Ts 1.10; 4.17; 5.9); a segunda fase é a sua vinda em glória depois da Grande Tribulação e visível aos olhos humanos (Ap 1.7). Nessa vinda gloriosa, Jesus retornará com os santos arrebatados da terra: “na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, com todos os seus santos” (1 Ts 3.13).

O arrebatamento é um termo que designa o rapto da Igreja da face da terra para o encontro com o Senhor nos ares. Nesse evento, os mortos em Cristo e os santos do Antigo Testamento ressuscitarão primeiro (1 Ts 4.16), seguindo-se a transformação dos salvos vivos e o simultâneo encontro de ambos os grupos com o Senhor nos ares (1 Ts 4.17). Acontecerá em fração de segundos, e nosso corpo será transformado num corpo glorioso, que estará revestido de incorruptibilidade e imortalidade (Fp 3.21; 1 Co 15.51,53). Será um evento repentino e secreto (Mt 24.36,44,50; 25.13). A condição para fazer parte desse glorioso evento é estar em Cristo. Enquanto aguarda o arrebatamento, o crente deve conservar irrepreensível o espírito, a alma e o corpo (1 Ts 5.23).

Em 2 Tessalonicenses, Paulo corrige o falso ensino de que Cristo já tinha vindo (2 Ts 2.1,2). Esclarece que somente após o arrebatamento da Igreja é que o “Dia do SENHOR” terá início com a manifestação do Anticristo (2 Ts 2.3,8). A expressão “Dia do SENHOR” também é designação para a Grande Tribulação (Is 13.6-9; 1 Ts 5.2,3), ocasião em que a ira de Deus será derramada sobre os moradores da terra. Após a Grande Tribulação se dará a segunda fase da Segunda Vinda de Cristo, que será visível e corporal com a sua Igreja glorificada (Lc 21.27). Enquanto o salvo aguarda, deve orar para que o evangelho tenha livre curso, e vigiar para não viver desordenadamente (2 Ts 3.1,11,12).

4. Instruções Pastorais e Pessoais. As Epístolas particulares abrangem instruções de natureza prática. Duas delas foram dirigidas a Timóteo, um jovem pastor em Éfeso, natural de Listra, filho de pai gentio e de mãe cristã judia (At 16.1). Após sua conversão, tornou-se um auxiliar de confiança na obra missionária. Paulo se refere a ele como “irmão” e “cooperador” (1 Ts 3.2); “filho amado” e “fiel no Senhor” (1 Co 4.17); “verdadeiro filho na fé” (1 Tm 1.2). As orientações são pessoais, mas servem para aplicação na vida espiritual e gestão da Igreja.

Dentre outros temas, em 1 Timóteo, Paulo orienta o combate às heresias por meio da “sã doutrina” (1 Tm 1.3,9,10). Timóteo deveria coibir o ensino de “outra doutrina” que minava a fé da Igreja, esmerando-se em ensinar a ortodoxia cristã (doutrina correta). Para tanto, precisava combater as inovações, tais como, “fábulas ou a genealogias intermináveis” (1 Tm 1.4). Refere-se a doutrinas espúrias permeadas de mitos, ficções, lendas e revelações falsas em contraste com a verdade do Evangelho. Em vista disso, depreende-se que o líder deve ser apto para ensinar (1 Tm 3.2; 4.13,16).

Em 2 Timóteo, destaca-se que o obreiro deve ser aprovado diante de Deus e manejar “bem a Palavra da verdade” (2 Tm 2.15). Paulo orienta o líder a esforçar-se para receber a aprovação divina, e não dos homens. O apóstolo aconselha tanto Timóteo como a Igreja a não participarem de falatórios vazios e profanos como faziam os hereges (2 Tm 2.14,16). Para isso, deveria estudar com zelo as Escrituras para não ser um obreiro despreparado, a fim de instruir aos que resistiam a sã doutrina (2 Tm 2.25).

As outras duas missivas pessoais de Paulo foram endereças a Tito e a Filemom. Tito era um grego convertido (Gl 2.3), que se tornou cooperador de confiança de Paulo, com as mesmas virtudes de Timóteo (Tt 1.4; 2 Co 2.13; 8.23; 12.18). Ele foi comissionado pelo apóstolo para pastorear em Creta (Tt 1.5). Na Epístola a Tito, enfatiza-se que o pastor deve contrapor os falsos ensinos (Tt 1.5,10,11) e, para tanto, é exortado a falar “o que convém à sã doutrina” (Tt 2.1). Nessa tarefa, cabe ao ministro reafirmar a autoridade da Palavra de Deus e manter-se fiel às doutrinas bíblicas.

Em Filemom, a mensagem enfatiza o perdão. O destinatário principal é Filemom e a Igreja em sua casa (Fm 1,2). Esse detalhe indica que a casa de Filemom era o lugar de cultos dos crentes de Colossos (Cl 4.8,9). O assunto gira em torno de Onésimo, um escravo fugitivo que Paulo converteu ao evangelho na prisão (Fm 10). Paulo aconselha Filemom a acolher Onésimo com brandura e apreço, e ainda se dispõe a pagar todo o prejuízo causado (Fm 17,18). O apóstolo ensina que o transgressor arrependido deve ser recebido não como servo, mas como irmão amado (Fm 16).

II – COMO AS EPÍSTOLAS GERAIS NOS FORMAM

1. As Epístolas de Pedro A 1ª Epístola de Pedro foi escrita aos irmãos dispersos no “Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia” (1 Pe 1.1). Refere-se aos judeus convertidos a Cristo, mas principalmente aos gentios cristãos que habitavam em uma dessas cinco províncias romanas. Eles eram minoria em uma sociedade pagã, idólatra, injusta, pervertida e imoral. Estavam sofrendo pressões e perseguições por causa da sua fé em Cristo e de seu modo de viver e agir contrário a cultura predominante. Nesse contexto, ressalta-se que em 1 Pedro a abordagem enfatiza o sofrimento cristão (1 Pe 1.6).

O apóstolo ensina que as provações fortalecem a fé. Afirma que a fé é testada no fogo das adversidades (1 Pe 1.7). Exorta os cristãos a não ceder às concupiscências, mas manter uma vida de santidade (1 Pe 1.15). Orienta os crentes a suportar os agravos para a glória de Deus (1 Pe 2.19) e alegrar-se por serem participantes das aflições de Cristo (1 Pe 4.13). Assegura que o próprio Deus é quem aperfeiçoa, confirma, fortifica e estabelece o crente fiel (1 Pe 5.10). Essas verdades devem nos dar a confiança, paciência e esperança para perseverar, mesmo quando formos perseguidos.

A 2ª Epístola de Pedro foi destinada aos leitores da primeira missiva (2 Pe 3.1) e provavelmente a um grupo maior de cristãos. A ocasião da escrita revela um quadro bem desolador para os servos de Cristo. Nero, o imperador de Roma (54 d.C.-68 d.C.), promovia crescente perseguição à Igreja. Como já visto na primeira Epístola, Pedro advertiu e encorajou os crentes a manter a fidelidade e a esperança em meio ao sofrimento. Nessa segunda Carta, antes de morrer, Pedro escreve suas últimas orientações aos irmãos. Em 2 Pedro, a mensagem faz alerta aos ensinos dos falsos mestres (2 Pe 1.12-14).

O apóstolo exorta acerca das heresias que perturbavam a fé da Igreja, tais como a negação da divindade de Jesus e a negação da Segunda Vinda de Cristo (2 Pe 2.1; 3.4). Pedro vaticina que muitos seriam enganados (2 Pe 2.2), e que os hereges por avareza fariam da igreja um negócio para ganhar dinheiro (2 Pe 2.3). Para combater esses males, Pedro ratifica que Jesus é o Filho de Deus (2 Pe 1.16,17) e anima a Igreja a manter-se fiel e imaculada até a volta do Senhor (2 Pe 3.9-14). Assim, os escritos de Pedro estimulam as virtudes do discernimento, santidade e perseverança.

2. As Epístolas de João. A 1ª Epístola de João adverte sobre o falso ensino que negava a encarnação de Jesus (1 Jo 1.1; 4.2,3) e as demais heresias gnósticas (1 Jo 5.13-21). Os hereges ensinavam que Cristo só tinha a aparência de ser humano. Essa heresia é chamada de “docetismo” (do grego dokeo, “parecer”). O gnosticismo ligava a salvação a uma experiência de revelação esotérica (do grego gnosis, “conhecimento”). João esclarece que ele próprio era testemunha da encarnação (1 Jo 1. 1-4). Explica que o salvo deve viver em comunhão com os irmãos (1 Jo 1.6,7); afastar-se da prática do pecado (1 Jo 2.1; 3.7); amar uns aos outros (1 Jo 4.11); vencer o mundo por meio da fé (1 Jo 5.4); e permanecer no que é verdadeiro: Jesus Cristo (1 Jo 5.20).

Em 2 João, o apóstolo reitera a prática do amor como mandamento divino (2 Jo 1.5,6) e novamente refuta as heresias do docetismo e gnosticismo. João assegura que todo aquele que não confessa que Cristo veio em carne é enganador e anticristo (2 Jo 1.7). Portanto, a Igreja é exortada a não se deixar enganar, nunca ir além daquilo que está escrito, mas perseverar na doutrina de Cristo (2 Jo 1.9). A Epístola orienta os cristãos a não receber pessoas com falsos ensinos em casa (2 Jo 1.10). Nesse quesito, João declara que aquele que escuta um herege tem parte nas suas más obras (2 Jo 1.11).

Em 3 João, destaca-se em posições opostas a fidelidade e a infidelidade. A Epístola condena a soberba e a rivalidade mesquinha que coloca cristãos uns contra os outros. O apóstolo aprova o comportamento de Gaio e Demétrio, cujas virtudes são: “andar na verdade”, “proceder fielmente”, “exercitar o amor” e “dar verdadeiro testemunho” (3 Jo 1.4-8,12). De outro lado, Diótrefes é reprovado por “desejar a primazia”, “desprezar os líderes”, “ser maledicente” e “causar escândalos” (3 Jo 1.9,10). Nessa missiva, somos exortados a seguir o bom exemplo dos servos que são fiéis a Deus, a sua obra e a seus líderes.

3. As outras Gerais. A Epístola aos Hebreus foi provavelmente escrita aos judeus cristãos helenistas que são instados a manter firme a fé em Cristo (Hb 3.6,14; 4.14; 10.23). A ênfase da mensagem repousa na supremacia de Cristo: Ele é superior aos Pais e aos Profetas (Hb 1.1); superior aos anjos (Hb 1.4); superior a Moisés (Hb 3.3); e superior ao sacerdócio levítico (Hb 4.14). Ele é Mediador de uma melhor aliança (Hb 8.6); Ele é o Sumo Sacerdote de um maior e mais perfeito tabernáculo (Hb 9.11) e por seu próprio sangue executou uma eterna redenção (Hb 9.11,12). Desse modo, o crente é estimulado a olhar para Cristo, o “autor e consumador da fé” (Hb 12.2).

Tiago foi destinada aos judeus cristãos que tinham deixado a Palestina (Tg 1.1). O autor é meio-irmão de Jesus (Mc 6.3). Seus leitores estavam enfrentando pressão a respeito de seus valores e crenças (Tg 1.2-4). Em vista disso, entre outros conselhos, Tiago adverte que “a ira do homem não opera a justiça de Deus” (Tg 1.20); esclarece que “a fé sem obras é morta” (Tg 2.26); acentua que a fé deve ser mostrada em ações (Tg 2.14); enfatiza a importância de controlar a língua (Tg 3.2), e estimula os crentes a orar e ajudar uns aos outros (Tg 5.16-20). Para tanto, o texto adverte o cristão a ser praticante da Palavra, e não somente ouvinte (Tg 1.22).

Judas foi endereçada aos cristãos judeus espalhados pelo mundo (Jd 1b). O autor é também meio-irmão de Jesus (Jd 1a). Judas exorta o salvo a “batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Jd 3). Isso por causa dos hereges infiltrados na igreja (Jd 4). Eles diziam que a liberdade em Cristo os isentava das regras morais; eram insubmissos aos líderes; e desprezavam o mundo espiritual (Jd 8). Em suma, ensinavam concupiscências e licenciosidade (Jd 18,19). Em vista disso, o crente é instruído a se firmar na fé, orar e a preservar a esperança da vida eterna (Jd 20,21).

III – AS EPÍSTOLAS CONTINUAM A FALAR

1. A Doutrina da Justificação. A doutrina da justificação pela fé ensina, em termos gerais, que o pecador é justificado (absolvido da punição e da condenação do pecado) unicamente pela fé na graça divina (Rm 5.1,2). Assevera que a salvação é dom gratuito e imerecido de Deus aos pecadores e que só pode ser recebida por meio da fé (Ef 2.8,9). Significa dizer que as obras humanas não podem salvar, mas apenas a fé em Cristo por meio da recepção da graça de Deus (Gl 2.16). Lutero afirmava que “a doutrina da justificação não é apenas mais uma doutrina; é o artigo fundamental da fé, pelo qual a igreja se firmará ou cairá e do qual depende toda a doutrina”. Desse modo, a doutrina da justificação pela fé é considerada como a grande verdade que a Reforma Protestante restituiu à Igreja.

Nossa Declaração de Fé professa crer na restauração do homem por meio do arrependimento e fé na obra expiatória e redentora de Cristo (Rm 3.23,24), no novo nascimento pela graça de Deus mediante a fé (Ef 2.8,9) e na justificação pela fé no sacrifício de Cristo (Rm 10.13; Hb 5.9; 7.25). Nosso documento doutrinário explica que a justificação é um ato da graça de Deus, o Supremo Juiz, pelo qual a justiça de Cristo é imputada a todo aquele que crê em Jesus declarando-o justo (Rm 3.24,28). O primeiro resultado da justificação é a paz com Deus (Rm 5.1). Juntamente com a salvação e a justificação, o pecador arrependido recebe a adoção de filho de Deus (Jo 1.12; Gl 4.4-6). Nesse entendimento, ratifica-se que essa é uma doutrina fundamental da fé cristã.

2. A Doutrina da Santificação. Etimologicamente (do hebraico kadosh e do grego hagios), o significado da palavra “Santo” é respectivamente “puro” e “separado para Deus”. Nesse sentido, a doutrina da santificação implica uma vida separada do pecado e dedicada a Deus (Rm 12.1,2). É um processo mediante o qual Deus purifica os que a Ele se achegam e passam a ser orientados pelo Espírito Santo (1 Jo 3.3). A Bíblia Sagrada ensina enfaticamente que Deus é “Santo”: Ele é o “Santo de Israel” (Is 1.4); “Deus, o Santo” (Is 5.16); o seu nome é “Santo” (Is 40.25; 57.15), dentre outros textos. Portanto, o Deus “Santo” requer que sua criação ande em santidade (1 Pe 1.15,16), isto é, o atributo comunicável de Deus da santidade é concedido a todos os que verdadeiramente são regenerados.

Nossa Declaração de Fé ensina que “já salvo e justificado, o novo crente entra de imediato no processo de santificação, pois assim o requer a sua nova natureza em Cristo (Rm 6.22; 1 Ts 4.3)”. Porém, essa transformação vai sendo aperfeiçoada durante a jornada do cristão (2 Co 3.18; Fp 1.6). Nesse aspecto, a santificação “é uma continuação do que foi começado na regeneração, quando então uma novidade de vida foi conferida ao crente e instilada dentro dele”. 15 Desse modo, o salvo precisa ser santificado pelo Espírito Santo (1 Pe 1.2). O fruto do Espírito nos é concedido para andarmos no mundo conservando a nossa santidade (Gl 5.16-17, 22). Portanto, o crente deve purificar-se tanto da carne como do espírito (2 Co 7.1), pois sem a santificação ninguém verá o Senhor (Hb 12.14). 3. A Doutrina da Glorificação A Escritura Sagrada diz: “se é certo que com Ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados” (Rm 8.17). Acerca desse texto, o Comentário Aplicação Pessoal sublinha que “só iremos gozar da nossa herança futura, se o nosso relacionamento com Cristo for suficientemente autêntico para podermos enfrentar o sofrimento em seu nome, por amor ao Senhor”. Indica que o cristão justificado pela fé e santificado pelo Espírito Santo ao sofrer perseguição por amor a Cristo, e suportar injustiças por causa de seus valores, está experimentando o sofrimento de Cristo para poder compartilhar de sua glória na eternidade. Paulo ratifica essa verdade ao declarar que aos que Deus “chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.30).

Desse modo, a doutrina da glorificação é a última etapa de nossa salvação. Nesse processo, o pecador é salvo pela graça, justificado pela fé, santificado pelo Espírito e prossegue até que todos cheguemos “a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo” (Ef 4.13, ACF). Em nossa trajetória cristã, continuamos sendo aperfeiçoados, mas nunca chegaremos à perfeição até chegarmos ao céu. Quer dizer que, somente ao final do processo da salvação, a glória perdida no Éden pelo primeiro Adão será finalmente restaurada (1 Co 15.45). Trata-se de uma promessa da futura transformação de nosso corpo mortal em corpo glorioso (Fp 3.21), que se dará por ocasião da vinda do Senhor (1 Co 15.52-54; 2 Co 3.18). Esse novo corpo será eterno, imortal, imperecível.

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A Supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível Palavra de Deus. Rio de Janeiro, 2022, p. 135-144.

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