sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

LIÇÃO 9: AS HISTÓRIAS E AS POESIAS FALAM AO CORAÇÃO

 

LIÇÃO 9  – AS HISTÓRIAS E AS POESIAS FALAM AO CORAÇÃO

INTRODUÇÃO

A Bíblia Sagrada faz uso de gêneros literários para expressar a revelação divina. Para contar as histórias do povo de Deus, os livros históricos servem-se da literatura chamada de “narrativa”. As experiências do povo de Deus na conquista e posse da Terra Prometida apontam para a soberania divina. Os livros poéticos e de sabedoria recorrem ao “texto lírico” com o propósito de despertar sentimentos. Os escritos bíblicos em prosa e poesia revelam a sabedoria divina, que deve ser aplicada em nosso viver diário. Essas mensagens servem de bom remédio e conservam saudável o nosso espírito, alma e corpo (Pv 17.22). Em vista disso, neste capítulo, estudaremos as experiências e as instruções relatadas nesses livros, cujas verdades produzem fé e esperança em nossos corações.

I – AS HISTÓRIAS DO ANTIGO TESTAMENTO

1. Os Livros Históricos. A narrativa é um tipo literário que abrange mais de 40% do Antigo Testamento. O termo narrativa é preferido no uso técnico para o registro da história. Toda a narrativa é constituída de enredo, trama e personagens. Contudo, ao contrário das narrativas humanas que, por questões ideológicas, tendem a impor o falso como verdadeiro, a narrativa bíblica é divinamente inspirada, totalmente verídica, Deus é o autor e personagem principal. Gordon Fee enfatiza que elas não são meramente histórias das pessoas que viveram no período da Antiga Aliança. As narrativas “são, antes de tudo, histórias acerca daquilo que Deus fez para aquelas pessoas e através delas”.

Na estrutura e classificação literária da Bíblia Sagrada, os registros da experiência dessas pessoas com Deus, e da posse da Terra Prometida, são chamados de “livros históricos”. Refere-se à segunda seção do Antigo Testamento, imediatamente após o encerramento do Pentateuco. São um total de 12 volumes, que retratam a história de Israel desde a entrada em Canaã (cerca de 1400 a.C.) até o tempo de Esdras e Neemias (cerca de 400 a.C.). Após a morte de Moisés, Deus chamou Josué para liderar o povo na conquista da Terra Prometida (Js 1.1,2). Desse modo, o livro de Josué faz abertura do grupo dos “livros históricos”.

Josué pertencia ao grupo dos doze líderes escolhidos para espiar a Terra Prometida. Ele era da tribo de Efraim e, juntamente com Calebe, exortou o povo a confiar nas promessas (Nm 13.8,16; 14.6- 9). Josué foi comissionado para ser o general do Exército de Israel (Êx 17.8,9); esteve junto no Sinai quando Moisés recebeu as tábuas da Lei (Êx 24.13; 32.17); quando jovem foi encarregado do Tabernáculo (Êx 33.11); e, era o aprendiz e o servidor leal de Moisés (Êx 24.13; Nm 11.28). Foi um oficial comandante vitorioso (Êx 17.13), e um exemplo de fé, confiança, ousadia e coragem (Nm 14.36-38; Nm 32.11,12). Em sua trajetória, Josué foi forjado e aprovado, e, assim, tornou-se o legítimo sucessor de Moisés (Dt 31.23; 34.9)

A narrativa de seu livro relata a história da nação, desde a travessia do Jordão (Js 3.14-17) até a sua morte aos 110 anos de idade (Js 24.29). Durante os 30 anos de sua liderança, Josué alocou uma porção de terra para as tribos de Israel, exceto aos levitas (Js 13.14; 21.43). Contudo, ainda muitíssima terra ficou para possuir (Js 13.1-7). As gerações seguintes, para assegurar a herança, disputaram o espaço com outras nações. Nesse período, Israel experimentou, dentre outros, a fidelidade divina ao desfrutar da promessa feita aos patriarcas (Gn 17.3-8; Êx 3.13-17); a providência divina como na travessia do Jordão e na queda de Jericó (Js 4.7; Js 6.20), a repreensão e o juízo como no caso do anátema (Js 7.5;11;24-25), a proteção e a vitória sobre os inimigos (Js 24.1). Tais relatos demonstram que Deus controla o curso da história (Js 21.45).

2. As Histórias dos Juízes. O título hebraico desse livro em hebraico é “shõphetim” e “kritai” em grego, ambos os termos têm o significado de “juízes”. Refere-se ao modelo de governo adotado pelos israelitas no interlúdio da morte do líder Josué e a coroação de Saul como primeiro rei da nação. Gleason Archer anota que “o tema básico do livro é a falha de Israel como teocracia, no sentido de não ter conseguido lealdade à aliança mesmo sob a liderança de homens escolhidos por Deus, os quais libertavam a nação da opressão do mundo pagão ao derredor”. Séculos depois, as sucessivas falhas em manter fidelidade a Deus e a Lei de Moisés conduziram Israel a instituir um governo monárquico.

Após Josué, os juízes governaram Israel até ao profeta Samuel (At 13.20). Esse período abrange cerca de 400 anos de história com a atuação de doze líderes (Jz 3.11–16.30). Josué, antes de falecer, exortou a nação para não servirem outros deuses, mas cumprir a aliança com Deus (Js 24.14,15). Em resposta, o povo jurou solenemente: “Nunca nos aconteça que deixemos o Senhor para servirmos a outros deuses” (Js 24.16). Esse juramento foi cumprido enquanto viveram os anciãos conterrâneos de Josué (Js 24.31). Passada essa geração, por rebeldia e pela inexistência de uma liderança forte (Jz 18.1), cada um fazia o que achava reto a seus próprios olhos (Jz 21.25).

Por essas razões, a nação entrou em declínio espiritual. Os israelitas não expulsaram todos os povos da terra de Canaã e passaram a coabitar com eles (Js 3.5); em desobediência à Lei, realizavam casamentos mistos com os estrangeiros e serviam os seus deuses pagãos (Js 3.6). A narrativa do livro informa que se esqueceram do seu Deus e “fizeram o que parecia mal aos olhos do Senhor” (Jz 3.7). Como resultado da rebelião, a mistura com os ímpios e a idolatria, os israelitas eram subjugados pelas nações vizinhas (Jz 3.8,12; 6.1; 10.7). Porém, mediante o arrependimento do povo, Deus levantava libertadores para resgatar a Israel da opressão (Jz 3.9,15; 6.7; 10.10).

William Lasor avalia que existe um padrão de comportamento do povo que pode ser observado na história de todos os juízes: “o povo faz o que é mau, servindo a outros deuses. Javé envia uma nação para oprimi-lo. O povo clama a Javé. Javé levanta um libertador. O opressor é derrotado. O povo tem descanso”. Esse padrão é como um círculo vicioso em Israel. A terra sossegava por um determinado tempo, e depois “os filhos de Israel [tornavam] a fazer o que parecia mal aos olhos do Senhor” (Jz 3.12) e todo o processo começava novamente. Essas histórias apontam para a fidelidade e a misericórdia divina; embora o povo fosse infiel, Deus permanecia fiel (2 Tm 2.13).

3. As Histórias dos Reis. Passado o período dos juízes, ocorreu a transição para a monarquia. A história da era dos reis é narrada nos livros de 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas. Os livros de Samuel, dentre outros relatos, mostram a ascensão de Saul e de Davi ao trono de Israel. Os livros de Reis registram o reinado de Salomão, e os reis que se sucederam tanto no Reino do Norte como no Reino do Sul. Os livros das Crônicas, escritos após o retorno de Judá do exílio babilônico, retratam especialmente os sucessivos reis de Judá, mencionando os reis de Israel esporadicamente. Essas narrativas enfatizam que apenas os reis obedientes a Deus eram por Ele abençoados.

A monarquia tem seu início por volta do ano 1050 a.C., quando Deus constituiu a Saul como rei em Israel (1 Sm 8.5; 9.17). Até esse tempo, Israel tinha sido governado diretamente por Deus por meio de seus porta-vozes: Moisés, Josué e os juízes. O último porta-voz do governo teocrático foi Samuel (1 Sm 8.7). A partir da instituição do governo monárquico, os reis passaram a liderar Israel. A designação de um rei não encerrava a aliança de Deus com Israel, embora a motivação do povo estivesse errada (1 Sm 8.20). Contudo, Deus já tinha feito provisão para a monarquia na Lei de Moisés e, assim, manteve o pacto com a nação. Os reis deveriam obedecer à Lei, sujeitar-se à palavra profética de Deus e reinar com justiça (Dt 17.14-20).  

Porém, Saul não observou esses preceitos e o seu reinado fracassou (1 Sm 13.13; 16.1). Então, Deus o substituiu por “um homem segundo o seu coração” (1 Sm 13.14). Davi foi escolhido e recebeu a promessa de um reino que não teria fim (2 Sm 7.16). Essa promessa é conhecida como aliança davídica. Salomão lhe sucedeu no trono e, após a sua morte, o reino se dividiu: Israel no Norte; e Judá no Sul (1 Rs 12.16,17). As histórias do reino dividido enfatizam a atitude de cada rei em seu relacionamento com Deus e sua postura dentro da aliança mosaica. A frase “fez o que era reto” ou o seu oposto “fez o que era mau” é empregada para avaliar o reinado e diferenciar os bons reis dos reis ímpios.

Por fim, ambos os reinos quebraram a aliança com Deus. A lista de pecados cometidos é enorme: idolatria, sincretismo religioso, imoralidade sexual, violência, litígio, injustiça social e jurídica dentre tantos. Como consequência, os dois reinos foram levados para o exílio. Em 722 a.C., Israel foi conquistado pelos assírios. Em 586 a.C., Judá caiu diante da Babilônia. Contudo, em 539 a.C., cumprindo sua promessa, Deus restaurou o trono de Davi. E, do reino de Judá, a esperança messiânica se cumpriu em Jesus (Lc 1.32,33). Essas narrativas mostram que os planos do Senhor não podem ser frustrados (Jó 42.2) e que o bem-estar de uma nação depende da fidelidade com Deus (Sl 33.12).

II – OS LIVROS POÉTICOS (E DE SABEDORIA) DO ANTIGO TESTAMENTO

1. Os Livros Sapienciais e Poéticos. Os livros sapienciais são conhecidos como “livros de sabedoria”. Os livros poéticos são conhecidos como “livros de poesia”. Trata-se de estilo literário empregado na redação do terceiro grupo dos livros do Antigo Testamento. Nesse aspecto, convém esclarecer que essa composição literária não desqualifica a inspiração divina, nem a autoridade ou canonicidade desses escritos bíblicos. A mensagem poética traz sabedoria para o relacionamento com Deus e o viver diário em qualquer época.

Stanley Ellisen informa que “os hebreus identificavam três grandes livros poéticos: Jó, Salmos e Provérbios. Na classificação da Vulgata estão também incluídos os livros didáticos, Eclesiastes e Cantares, perfazendo um total de cinco livros”. Quanto aos livros sapienciais, Jó, Provérbios e Eclesiastes são considerados tanto poéticos como de sabedoria. A poesia veterotestamentária abrange também grande parte dos ditos proféticos ou da literatura sapiencial.

Em relação à importância desses livros, transcrevemos o seguinte:

Esses livros continuam sendo importantes para os cristãos hoje. Seus principais temas — louvor e oração, orientação para uma vida santa, nosso relacionamento com Deus e com as pessoas ao nosso redor — e sua linguagem forte, evocativa, continuam a moldar o coração e a mente do povo de Deus. Ao lermos Salmos, meditarmos em Provérbios, nos comovermos com a beleza de Cantares de Salomão e nos esforçarmos para entender tópicos difíceis de Jó e Eclesiastes, o Espírito Santo transforma e renova nosso coração e nossa mente.

Em suma, esses escritos ensinam a sabedoria por meio da poesia ou da prosa. Eclesiastes foi escrito quase todo em prosa, e os outros livros foram redigidos, em sua maioria, em forma de poesia. De modo geral, a prosa retrata o modo como normalmente falamos. E a poesia expressa sentimentos e pensamentos mediante versos que atingem o intelecto e as emoções. Na Bíblia, esse gênero literário trata da aplicação da verdade divina à experiência humana, refere-se à sabedoria prática mais do que teórica (Jó 28.28; Sl 19.7; Pv 23.12; Ec 7.12, Ct 8.7).

2. Eclesiastes, Provérbios e Jó O título de Eclesiastes é uma tradução grega do hebraico qôhelet, significando “aquele que convoca uma congregação” a fim de pregar para ela. Por isso, a expressão “pregador” usada por alguns é perfeitamente adequada (Ec 1.1). O livro afirma “que sua sabedoria vem do ‘único pastor’, e que ao ultrapassar os limites de tal sabedoria, o pretendente a sábio deve exercer o máximo de cuidado (Ec 12.11ss)”. Essa declaração reivindica sua inspiração divina. A expressão “único pastor” é referência a um dos títulos divinos. O tema de Eclesiastes está na frase “é tudo vaidade” (Ec 1.2). Indica a efemeridade e a futilidade da vida humana. O pregador convida seus leitores a abandonar a confiança na visão secular da vida. Por isso, ao final, o autor declara que o sentido e o verdadeiro significado da vida é “teme a Deus e guarda os seus mandamentos” (Ec 12.13).

O título de Provérbios é uma tradução grega do hebraico mãshãl, que deriva de uma raiz que significa “ser como” ou “comparado com”. Desse modo, entende-se que o propósito do autor é apresentar o contraste existente em uma vida de sabedoria e uma vida de insensatez. Corrobora com essa compreensão a introdução do livro quando o autor estabelece seu objetivo: “para se conhecer a sabedoria e a instrução; para se entenderem as palavras da prudência” (Pv 1.2). Provérbios oferece aos seus leitores a oportunidade de fazer a escolha pela sabedoria. Em vista disso, o tema de Provérbios afiança que “o temor do Senhor é o princípio da sabedoria” (Pv 9.10). Ensina que observar os princípios divinos nos faz pessoas sábias. Portanto, ao concluir, o escritor enfatiza que uma pessoa temente a Deus é digna de ser honrada (Pv 31.30).

O título de Jó é tradução do hebraico `iyyôb, que parece significar “onde está meu pai?”. O livro narra a experiência de um personagem real. O escritor registra que Jó alcançou o testemunho de ser um servo “íntegro e reto, que teme a Deus e se desvia do mal” (Jó 1.8, NAA). Apesar de sua vida justa, Jó experimentou muita dor e sofrimento. Inexplicavelmente, ele perdeu todas as suas posses (Jó 1.13-17); tragicamente perdeu todos os seus filhos (Jó 1.18,19) e inesperadamente foi atingido por uma dolorosa doença (Jó 2.7,8). Portanto, o tema de Jó é o sofrimento do justo (Jó 1.21). Mostra que a dor não é racional, que o sofrimento nem sempre é resultado de algum pecado. Por isso, se faz necessário sempre confiar na sabedoria do Senhor. Em última instância, Jó reconheceu que a aflição o aproximou de Deus (Jó 42.5).

3. Salmos e Cantares de Salomão. O título de Salmos reflete o grego Psalmoi, que designa o nome do livro na Septuaginta (LXX). Outro título grego por vezes empregado é Psalterion, que, na forma aportuguesada, é transliterado como “Saltério”. Ambos os termos entraram em nossas Bíblias pela Vulgata latina, que transliterou o grego. O termo Psalmoi descreve “um cântico ou um louvor”, e o Psalterion indica “uma coleção de cânticos ou louvores”. No Novo Testamento, o evangelista e historiador Lucas utiliza o título grego completo — “livro de Salmos” (Lc 20.42; At 1.20). A obra completa é uma coletânea de 150 poemas distribuídos em cinco livros: Livro 1 (Sl 1–41); Livro 2 (Sl 42–72); Livro 3 (Sl 73–89); Livro 4 (Sl 90–106); Livro 5 (Sl 107–150).

A autoria dos salmos é atribuída a vários escritores distintos. Dentre eles, citam-se os setenta e três salmos que são reputados ao rei Davi, o que equivale a quase metade deles; dois salmos são de autoria do rei Salomão (Sl 72 e 127); ao menos um salmo é de Moisés (Sl 90); doze salmos são atribuídos a Asafe (Sl 50; 73–83); dez salmos são dos filhos de Coré (Sl 42; 44–45; 47–49; 84–85; 87– 88). Os tradutores da LXX atribuíram a profetas a autoria de alguns dos Salmos, tais como Jeremias (Sl 137), Ageu (Sl 146), Zacarias (Sl 147), e outros salmos são de ilustres anônimos chamados de “salmos órfãos”. Não obstante, reitera-se que a diversidade de autores não invalida a autoridade dos ensinos e nem a inspiração divina da totalidade do livro de Salmos.

Outro aspecto a frisar é que o título hebraico para “Salmos” é tehillim, com o significado de “louvores” ou “cânticos de louvor”. E era com essa finalidade utilizado pelos israelitas em suas liturgias. O cântico sempre esteve presente na história de Israel. A nação cantava em todas as situações, por vezes acompanhada por algum instrumento musical (Êx 5.20; Nm 21.17, 27; Jz 5.1; 2 Sm 1.17; Am 5.23). Assim sendo, a mensagem principal dos Salmos é o louvor, a oração e a adoração. Também é um livro de instrução, porque nos mostra como servir ao Senhor. E ainda fala profeticamente acerca do Messias. Nesses aspectos, considera-se como verso-chave Salmo 29.2: “Dai ao Senhor a glória devida ao seu nome; adorai o Senhor na beleza da sua santidade”.

O livro de Cantares de Salomão ou “Cântico dos Cânticos” significa o cântico que supera todos os outros cânticos. O Guia Cristão de Leitura da Bíblia o considera como “um comovente e dramático poema sobre o desenvolvimento de um relacionamento”. Ilustra o compromisso, a intimidade e o amor que deve existir no casamento. Refere-se ao plano original de Deus acerca do relacionamento conjugal. O versículo-chave sintetiza o ideal da fidelidade entre o marido e a sua mulher: “Eu sou do meu amado, e o meu amado é meu” (Ct 6.3). Teologicamente, esse amor é entendido “como uma tipificação do caloroso relacionamento pessoal que Deus deseja ter com a sua noiva espiritual, composta de todos os crentes redimidos que deram o seu coração a Ele”.

III – UMA MENSAGEM AO CORAÇÃO

1. Uma Mensagem de Soberania. A soberania indica o domínio absoluto de Deus sobre todas as obras criadas: a terra, os céus, a vastidão do universo, os seres espirituais, os animais, os homens, e sobre todo o curso da história: “Do SENHOR é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam” (Sl 24.1); “o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens” (Dn 4.25). A soberania é demonstrada, dentre outros atributos, pela sua Onipotência que executa o plano eterno e opera no controle de tudo e de todos (Rm 9.15-19).

As Escrituras apresentam o Senhor como “El-Shadday”, que significa o Deus Todo-Poderoso (Gn 17.1). Seu poder é ilimitado e jamais poderá ser resistido, impedido ou anulado, seja pelo ser humano, seja pela natureza ou por seres angelicais (Jó 42.2). Somente Ele pode realizar ou fazer tudo, conforme o seu entendimento e o beneplácito da sua vontade. Contudo, Ele não faz nada que contrarie a sua natureza (Hb 6.18). A soberania divina é exercida para abençoar os piedosos e punir os rebeldes (Rm 11.22).

Lewis Chafer anota que a soberania divina “é discernida de maneira absoluta pela qual todas as coisas receberam os seus devidos lugares na criação, no assinalar aos homens sobre o dia deles e sobre a geração deles assim como os limites da habitação deles, e no exercício da graça salvadora”. Porém, a soberania não é arbitrária a ponto de tolher o livre-arbítrio. Todavia, a ação humana é limitada aos desígnios divinos. Dessa forma, a paciência de Deus renova ao homem oportunidades de arrependimento para mantê-lo no centro da vontade divina (2 Pe 3.9).

Nesse sentido, ratifica-se que Deus controla o curso dos acontecimentos, remove e estabelece governos, a um abate, e a outro exalta visando a um fim auspicioso (Sl 75.7; Dn 2.21; 4.25; Jr 29.11). Por exemplo, Deus conduziu Josué de forma miraculosa na travessia do Jordão (Js 3.13). Esse feito extraordinário favoreceu o acesso à Terra Prometida (Js 5.1). Mais tarde, Deus levantou nações para punir a rebeldia de seu povo e ainda proveu o meio de escape, a fim de evitar a extinção da nação eleita (Rm 9.29).

Ele proveu o resgate do exílio babilônico ao remanescente, conforme a promessa feita a Davi (Ed 9.13). Foi Deus quem conservou a nação de Judá e assim preparou o caminho para a vinda do Messias prometido (At 13.17-23). Assim sendo, nosso coração deve se aquietar, Ele age na história e nada acontece fora da sua vontade (Mt 10.29,30). A soberania divina impede que a insensatez humana ou a malignidade de Satanás exerçam o controle. Deus é soberano, Ele é a base da paz e da confiança de todo o seu povo.  

2. Uma Mensagem de Sabedoria. Como já visto nesta obra, a sabedoria é a habilidade de aplicar o conhecimento para fazer escolhas certas no momento oportuno. Refere-se à prática da prudência que ultrapassa o mero conhecimento intelectual ou acadêmico. A Bíblia Sagrada ensina que temer ao Senhor e observar os seus preceitos nos fazem viver como pessoas sábias (Ef 5.15) e os que rejeitam ao Senhor e sua Palavra vivem na ignorância (Sl 14.1). Nos chamados livros “sapienciais” ou ‘poéticos”, Deus inspirou seus autores para nos agraciar com uma mensagem de sabedoria a ser executada em nosso viver diário.

A fonte dessa sabedoria é o próprio Deus, portanto, a sabedoria é dada por Ele. Significa que quando alguém recebe a sabedoria foi porque Deus lhe deu (Pv 2.5,6). O propósito da sabedoria é agradar a Deus e confiar nEle (Pv 3.5). Os sábios não confiam em si mesmos, antes confiam no Senhor e na sua soberania que controla o Universo. Dessa forma, todo o conselho prático está subordinado à sabedoria divina. Dentre eles, citamos: andar retamente de modo ético e irrepreensível (Pv 2.7); fugir da luxúria e se conservar puro (Pv 2.16); não ser preguiçoso (Pv 6.6); e, manter boa reputação (Pv 22.1).

As orientações incluem tomar cuidado no falar. As palavras precipitadas e descuidadas são um erro a ser corrigido. O sábio pesa o que fala, mas o tolo se compromete na multidão das palavras (Ec 5.2,3). Uma pessoa sábia não deve amar ou confiar no dinheiro e nem depositar a sua esperança nas riquezas materiais (Ec 5.10-12). Ser sábio também denota viver em contentamento e não em murmuração. Em virtude da brevidade da vida, o homem deve se alegrar com o fruto de seu trabalho como parte da dádiva divina, (Ec 9.7-10). Igualmente somos aconselhados a remir o tempo, e lembrar-se de Deus antes de ser chamado para se encontrar com Ele (Ec 12.1-7).

A mensagem bíblica também enaltece a integridade. A integridade se relaciona com firmeza de caráter e conduta ilibada. Os ensinos no livro de Jó sobrepujam os padrões de integridade do mundo. O manter-se íntegro independe das circunstâncias (Jó 1.22). O sofrimento e a dor são uma realidade, mas Deus provê os meios de cura (Jó 5.17,18). Por conseguinte, somos exortados a confiar sempre no Senhor (Jó 19.25); e a desfrutar do verdadeiro amor (Ct 8.7). No entanto, essas ações não devem ser observadas de forma legalista para evitar o castigo; ao contrário, elas devem ser o resultado do toque divino no coração humano (Pv 4.23).

3. Uma Mensagem de Adoração. As Escrituras ensinam que somente o Deus único e verdadeiro deve ser adorado (Êx 20.1-5). A adoração faz parte do culto prestado a Deus tanto individual como coletivo. Em geral, os elementos da adoração compreendem a oração, o louvor, os cânticos, o meditar na Palavra de Deus, dentre outros. O Dicionário Vine esclarece que a palavra hebraica sãhãh ocorre mais de 170 vezes no Antigo Testamento sendo “usada como termo comum para se referir a ir diante de Deus em adoração (Jr 7.2)”. No Novo Testamento, o verbo grego proskuneõ é empregado 59 vezes com o significado de adorar (cf. Mt 2.2,8,11; 4.10; Jo 4.21-24; 9.38; 1 Co 14.25; Hb 1.6; Ap 4.10; 5.14; etc.).

Moisés recebeu o modelo de adoração com ofertas e sacrifícios (cf. Nm 28.3-8; Lv 23.1ss). Desenvolveu um sistema de adoração pública com vários elementos: sacrifícios especiais (2 Cr 7.5ss); cerimoniais específicos (1 Rs 8.14); ministrações de louvor (2 Cr 5.13); oração pública (Dt 26.15); e discursos públicos (Ne 9.3-38). Na Nova Aliança, esses sacrifícios e ofertas foram abolidos (Hb 20.26), uma vez que Cristo tirou os pecados do mundo (Jo 1.29). No modelo cristão, a adoração pública envolve: salmos, doutrina, revelação, língua e interpretação (1 Co 14.26). Porém, exige-se que a adoração seja em espírito e em verdade (Jo 4.23). A verdadeira adoração é aquela que procede do interior, a que é do coração (Rm 2.29; Ef 3.16).

Nesse aspecto, os Salmos possuem a peculiaridade de expressar as mais profundas emoções do coração humano, tais como: medo, angústia e tristeza (Sl 116.3); força, segurança e alegria (Sl 118.14). Assim, eles refletem o ideal divino da espiritualidade e da adoração. Entre outros retratos da vida espiritual, destacam-se: o coração que confia (Sl 3.3); o coração contrito (Sl 6.1); o coração que glorifica (Sl 8.1); o coração agradecido (Sl 30.1); e o coração arrependido (Sl 51.1). A fim de manter a verdadeira adoração em todas as circunstâncias da vida, o salmista descreveu a conduta por ele adotada: “Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti” (Sl 119.11).

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2022, p. 103-114.

sábado, 19 de fevereiro de 2022

LIÇÃO 8: A LEI E OS EVANGELHOS REVELAM JESUS

LIÇÃO 8 – A LEI E OS EVANGELHOS REVELAM JESUS

 INTRODUÇÃO

 A Lei e os Evangelhos pertencem respectivamente ao Antigo e ao Novo Testamento. São livros sagrados de origem divina que integram o cânon das Escrituras. Possuem igual autoridade como regra de fé e prática, porém, com funções distintas. Os preceitos e as narrativas da Lei têm aplicações nos Evangelhos. A função da Lei era transitória; ela revela o pecado, mas também aponta o plano da salvação em Cristo (Gl 3.24,25).

Significa que a Lei não salva, mas esboça o plano da redenção em Cristo confirmado nos Evangelhos. A obra expiatória do Senhor Jesus nos libertou da condenação da Lei (Gl 3.10-13). Nesse sentido, todo o sistema mosaico foi abolido. Nos Evangelhos, as boas-novas dessa salvação estão reveladas. Em suma, as obras da Lei não justificam, mas pela graça somos salvos, por meio do arrependimento e da fé em Jesus Cristo. Neste capítulo, estudaremos a relação entre o Pentateuco e a mensagem de Cristo.

I – O PENTATEUCO: A LEI DE DEUS

1. Os Cinco Livros da Lei. Pentateuco é uma palavra que deriva de dois termos gregos, penta (cinco) e teuchos (estojo para o rolo de papiro). A junção desses termos tradicionalmente significa “cinco volumes”. Stanley Ellisen informa que “os livros antigos eram escritos em rolos, geralmente de nove metros de comprimento, mais ou menos o tamanho necessário para acomodar de Gênesis até Deuteronômio”. Portanto, a expressão “pentateuco” corresponde ao conjunto formado pelos cinco primeiros livros do Antigo Testamento.

O título desses livros corresponde à primeira palavra do texto hebraico, e na língua portuguesa obedece à tradução do grego da Septuaginta: Gênesis (“começo”), versão do hebraico bereshit (“no princípio”); Êxodo (“saída”), versão do hebraico Shemôt (“os nomes de”); Levítico (“aquilo que é dos levitas”), versão do hebraico wayyiqrã (“E Ele chamou”); Números (“aritmética, números, estatística”) versão do hebraico “Bemidbãr” (“no deserto de”); Deuteronômio (“segunda promulgação da lei”), versão do hebraico “Debãrim” (“palavras”).

No texto hebraico, e pelos judeus ainda hoje, esses volumes são denominados de “Torá” com o sentido de “instrução, ensino, direção, orientação”. A Torá assume o significado genérico de “livro da lei”, com abrangência de todas as normas (Dt 4.44; 17.18; 31.9) e está associado ao nome de Moisés (Js 8.31,32; 23.6; 2 Rs 14.6).

O historiador judeu do século I Flávio Josefo menciona, centenas de vezes, Moisés como o autor do livro de Gênesis. Dentre elas, cita-se: “Moisés fala ainda mais particularmente da criação do homem [...]”, “Moisés narra em seguida como Deus plantou do lado do oriente um jardim muito delicioso [...]”.

Quanto aos outros livros do Pentateuco, Josefo relata: “Assim falou Moisés a todos os israelitas e deu-lhes um livro, no qual estavam escritas as leis e a maneira de viver que deveriam observar”. 4 E, no comentário de Deuteronômio 22, Josefo escreve: “essas foram as leis que Moisés deixou à nossa nação. Ele deu também as que havia escrito quarenta anos antes, das quais falar-se-á em outro lugar”.

Com essas evidências, em resposta à alta crítica que questiona a concepção do Pentateuco, Stanley Elissen avalia que “rejeitar a autoria de Moisés é rejeitar o testemunho universal dos escritores bíblicos e solapar a credibilidade do Pentateuco e do resto da Bíblia. É da autoria de Moisés, e não apenas um ‘mosaico’ de diferentes autores”. Em vista disso, o melhor é permitir que a Escritura fale por si mesma.

Nas páginas da Bíblia Sagrada, a totalidade do Pentateuco é identificada como: a “Lei” (Êx 24.12; Mt 5.17); o “livro de Moisés” (Mc 12.26); a “Lei de Moisés” (Js 8.31,32; Lc 2.22; At 13.39); a “Lei de Deus” (Ne 8.8; Rm 7.22); a “Lei do Senhor” (Ne 10.29) ou simplesmente “Moisés” (Lc 24.27); e a todo o Antigo Testamento como “Moisés e os profetas” (Lc 16.29). Por fim, o próprio Senhor Jesus ratificou a autoria do Pentateuco quando disse: “convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na Lei de Moisés, e nos Profetas, e nos Salmos” (Lc 24.44).

2. A Grandeza da Lei. Estuda-se a Lei, de modo didático, sob três aspectos: (a) morais, que possuem validade permanente para todos os povos porque “tratam dos princípios básicos morais sem concessão”; (b) cerimoniais, que tratam da liturgia dos judeus e compreendem as “festividades religiosas, o sistema de sacrifício e da adoração no santuário, os alimentos limpos e imundos e as instruções sobre a pureza ritual, entre outros preceitos”; e, (c) civis, que dizem respeito à responsabilidade do israelita como cidadão, tais como os “regulamentos jurídicos e instruções que regiam a nação de Israel”. Contudo, na verdade, essas três partes integram uma mesma Lei, isto é, a Lei de Moisés — o Pentateuco.

Henrietta Mears resume cada livro do Pentateuco em uma frase, a saber: “em Gênesis o mundo foi feito, em Êxodo se narra a marcha, Levítico contém a Lei, em Números as tribos são contadas, em Deuteronômio a Lei é repetida”. Em concordância com essas sentenças, a Declaração de Fé das Assembleias de Deus ensina que “a Lei de Moisés” é o mais importante código de leis da antiguidade por sua santidade, por seu caráter espiritual e por sua autoridade divina: “a lei é santa; e o mandamento, santo, justo e bom [...] a lei é espiritual” (Rm 7.12,14). Contudo, enfatiza o documento doutrinário que a grandeza da Lei vai além de tudo isso, pois nela Deus esboça o plano da redenção humana em Cristo: “Porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10.4).

3. A Lei e a Fé Cristã. A Escritura afirma que a função da Lei era transitória (Hb 10.1). O texto de Hebreus descreve que a Lei não passava de uma sombra, e não a imagem exata das coisas, e que a necessidade de oferecer sacrifícios ano após ano demonstra a ineficácia do ritual levítico. O autor da Epístola já tinha declarado que a Lei nada aperfeiçoou (Hb 7.19). Essa é uma declaração que atesta a insuficiência da antiga aliança para efetuar a redenção da humanidade. Por isso, pela Lei ninguém será justificado diante de Deus (Gl 3.11).

Donald Hagner destaca que “a lei era apenas um estágio antecipatório dos bens futuros, não possuía em si mesma significado duradouro, ou final”. Martinho Lutero ensinou que “a função primária da lei de Moisés consistia em fazer com que as pessoas se sentissem culpadas, para que reconhecessem sua pecaminosidade e aceitassem que mereciam a ira de Deus”. O apóstolo Paulo assevera que a Lei era uma medida temporária, ela foi dada para revelar e punir o pecado, e assim demonstrar a necessidade da graça (Gl 3.19).

Nessa perspectiva, a Lei encerrou a toda a humanidade debaixo do pecado (Gl 3.22,23). Assim sendo, ninguém pode ser salvo pelas obras da Lei (Gl 2.16). Não obstante, a Lei também serviu de “aio” para nos conduzir à redenção em Cristo (Gl 3.24). Rudolf Gwalther pondera que a Lei “não se opõe a Cristo, antes nos leva a Ele e incentiva a nos voltarmos para Ele”. Desse modo, a Lei nos faz conscientes do pecado e nos leva a buscar refúgio e misericórdia em Deus.

Nesse aspecto, a obra de Cristo nos resgatou da maldição da Lei (Gl 3.13), e nos deu vida mediante o Evangelho (2 Tm 1.10). Somente quando Cristo veio, a Lei finalmente foi cumprida (Mt 5.17- 20). A revelação divina se consumou em Cristo (Hb 1.1,2). Cristo, o único sem pecado é mediador de um melhor concerto, de uma Nova Aliança: a dispensação da graça (Ef 3.2; Hb 4.15; 8.6; 12.24). Agora, livres do jugo da Lei, vivemos debaixo da graça divina (Rm 6.14). E, todo aquele que permanece em Cristo não vive pecando, porque é nascido de Deus (1 Jo 3.6,9).

II – OS EVANGELHOS: A MENSAGEM DE CRISTO

1. O Conceito de Evangelho. O termo “evangelho” tem origem no grego evangelion com o significado de “boas novas”. Refere-se à mensagem do Reino de Deus e da salvação por meio de Cristo (At 15.7; 20.24). Seus autores são chamados de evangelistas, que significa “portadores de boas-novas”. Benito Marconcini sublinha que os evangelistas “empregam um gênero literário novo e único que os distingue de qualquer obra daquela época e até mesmo dos outros escritos neotestamentários”.

De fato, os Evangelhos se destacam entre as Escrituras como o principal testemunho sobre a vida, morte e ressurreição de Jesus. Philip Comfort enfatiza que os Evangelhos “mantêm consistentemente o foco das atenções em Jesus, sendo o propósito óbvio da narrativa contar a história dos ensinamentos e obras dEle [...] Mais de um quarto dos relatos é tributado ao julgamento, crucificação e ressurreição de Jesus”.

Os três primeiros, Mateus, Marcos e Lucas, são chamados de Evangelhos “Sinóticos”. Esse adjetivo, “sinótico”, vem do termo grego “synopsis”, que significa “ver em conjunto”. A designação passou a ser utilizada a partir do século XVIII em razão do alto grau de semelhança desses evangelistas nas narrativas do ministério de Jesus. Os Sinóticos registram, especialmente, o ministério de Jesus na Galileia e se concentram nas curas, exorcismos e o ensino por parábolas.

D. A. Carson oferece uma sequência geográfica geral comum, a saber: ministério na Galileia, retirada para o norte, ministério na Judeia e Pereia, e o ministério final em Jerusalém. O quarto Evangelho, João, tem peculiaridades próprias e enfatiza o ministério de Cristo na Judeia, especialmente nas visitas periódicas de Jesus a Jerusalém. O discípulo amado registra algumas curas significativas, mas não faz referência aos exorcismos e às parábolas. João destaca os discursos mais profundos do Senhor Jesus.

Ressalta-se que, embora retratada de modo distinto, a mensagem do evangelho é única (Gl 1.8). Há somente um evangelho, apresentado de quatro maneiras. É indispensável lembrar que os Evangelhos não têm o propósito de fornecer um diário detalhado com o registro de todas as ações e ensinos de Jesus.

O evangelista João afirmou que havia “muitas outras coisas que Jesus fez; e, se cada uma das quais fosse escrita, cuido que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se escrevessem” (Jo 21.25), reiterou que muitos sinais de que Jesus fez não estavam escritos no seu Evangelho (Jo 20.30), mas que os que estavam registrados serviam para despertar a fé: “para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (Jo 20.31). O Guia Cristão de Leitura da Bíblia ratifica que os Evangelhos “não são biografia de Jesus e não nos fornecem todas as informações que poderíamos desejar ter. Entretanto, contêm tudo que precisamos saber a fim de compreender a relevância de Jesus e do que Ele fez por nós”.

2. A Mensagem do Reino de Deus. Em Mateus, o Senhor Jesus, após o batismo nas águas (Mt 3.16) e sua vitória na tentação do deserto (Mt 4.11), deu início ao seu ministério público e passou a pregar a chegada do “Reino dos céus” (Mt 4.17). A expressão “Reino dos céus” aparece 32 vezes no Evangelho de Mateus, em contrapartida a expressão “Reino de Deus” é usada apenas 5 vezes (Mt 6.33; 12.28; 19.24; 21.31,43).

Alguns estudiosos do Novo testamento tentaram estabelecer uma diferença entre essas duas expressões, porém, Warren Wiersbe anota que “por uma questão de reverência ao nome santo do Senhor, os judeus não pronunciavam o nome Deus, substituindo-o por céus”. David Stern salienta que “a palavra céus era utilizada numa tentativa de evitar a palavra Deus; e até os dias de hoje, a expressão o reino dos céus na religião substitui na literatura religiosa judaica reino de Deus”. Em suma, a expressão “Reino dos céus” é reverente substituição para “Reino de Deus”.

Nos demais Evangelhos Sinóticos, a pregação do Reino também aparece como tema central da mensagem de Cristo. Em diversos textos em que Mateus emprega a frase “Reino dos céus”, Marcos e Lucas usam “Reino de Deus” (Mc 1.15; Lc 4.43). Todos os Sinóticos registram que a condição de entrada no Reino é o arrependimento: “Arrependei-vos, porque é chegado o Reino dos céus” (Mt 4.17); “arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.15); “eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores, ao arrependimento” (Lc 5.32).

João Batista, o percursor de Jesus, já exortava o povo ao arrependimento em vista do Reino de Deus que chegava (Mt 3.2; Mc 1.4; Lc 3.3). O Senhor Jesus, durante o seu ministério, constantemente alertava a seus ouvintes acerca da necessidade do arrependimento (Mt 9.13; 11.21; 21.32; Mc 6.12; Lc 13.3,5; 15.7). Robert Mounce elucida que, “para participar do Reino de Deus, o arrepender-se não era apenas sentir tristeza por causa de alguma coisa, mas envolvia uma real mudança de direção”.

No seu Evangelho, João usa a expressão “Reino de Deus” (Jo 3.3,5). Em seus registros, o evangelista esclarece que o Reino de Deus não é deste mundo (Jo 18.36). Cristo ensinou que a natureza desse Reino não é terrena. Esse Reino está estabelecido no interior das pessoas (Lc 16.20,21). A riqueza, a autoridade e a glória desse Reino são espirituais (Mt 26.53). Contudo, os judeus esperavam um líder político que os libertasse do jugo romano, mas Jesus veio exercer soberania espiritual no coração do povo para os libertar do jugo do pecado (Mt 18.11; Mc 8.36; Lc 19.10; Jo 6.15). Não obstante, essa verdade não nega a realidade do Reino vindouro (Lc 22.30).

O anúncio da chegada do Reino constatava que as profecias messiânicas se cumpriram em Cristo (Lc 4.18-21). Os Evangelhos apresentam Jesus com os títulos messiânicos, tais como Filho de Davi, Rei dos Judeus, Filho de Deus, Cristo, Salvador e Senhor (Mt 1.1; 2.2; Mc 1.1; Lc 2.11; Jo 1.41). Sua vinda inaugura o começo do Reino e requer a conversão dos pecadores (Jo 3.5). O Reino abrange a obra Redentora de Cristo e a sua promessa de voltar (Jo 8.28; 14.3). O Reino aponta para a soberania de Deus sobre todas as coisas, agora no presente (Lc 17.21) e igualmente no Reino futuro, que será tanto temporal quanto espiritual (Lc 1.33).

3. A Mensagem da Salvação. Como já observado, Jesus é identificado por vários títulos messiânicos. Nesse ponto, destacamos as expressões contidas no anúncio angelical: Salvador, Cristo e Senhor (Lc 2.11). Ao se dirigir aos pastores no campo, o anjo enfatiza a obra salvífica de Jesus. Em diversas outras passagens, essa mensagem de Jesus como o Salvador do pecado é repetida nos Evangelhos (Mt 1.21; 4.15,16; 12.21; 20.28; Mc 10.45; Lc 1.78,79; 19.10; 11.19,20; Jo 3.16,17; 4.10,14; 5.25; 6.50,51; 7.37,38). A expressão Cristo significa “ungido”. Jesus é anunciado como o Messias e libertador de Israel (Jo 1.41; 4.25). O termo Senhor não é meramente pronome de tratamento; refere-se a um título divino. Por isso, para o cristão existe um só Senhor, Jesus Cristo (1 Co 8.6).

O evangelista Mateus registra que Jesus veio para salvar o povo de seus pecados (Mt 1.21). Aqui convém lembrar que o nome “Jesus” é oriundo da expressão hebraica “Iavé salva” ou “Iavé é salvação” e aponta para a sua nobre missão. O propósito da vinda de Jesus se revela no nome que lhe foi dado, isto é, Ele veio salvar os pecadores (1 Tm 1.15). O evangelista Marcos afirma que é preciso crer em Cristo para ser salvo (Mc 16.16). Nossa Declaração de Fé ensina que “somente a fé na morte expiatória de Jesus e o arrependimento podem remir o pecador e levá-lo ao Criador. Essa salvação é um ato da graça soberana de Deus pelo mérito de Jesus Cristo e não vem das obras (Ef 2.8,9)”. Dessa forma, reitera-se que a salvação está disponível a todos os que creem, estando condicionada à fé e ao arrependimento em Cristo Jesus.

O evangelista Lucas assevera que Jesus veio salvar o que estava perdido (Lc 19.10). Esse ensinamento ocorreu em casa de Zaqueu, o corrupto cobrador de impostos. Depois de crer no Salvador, o publicano demonstrou sua fé ao prometer indenizar as pessoas que tinha defraudado (Lc 19.8). A fé salvadora transformou o caráter daquele homem que outrora era ganancioso e materialista. Diante dessa mudança, disse-lhe Jesus: “Hoje, veio a salvação a esta casa” (Lc 19.9). Em passagens similares, Cristo ensinou que seu principal ofício era curar os doentes e buscar os pecadores (Mt 9.12; Mc 2.17; Lc 5.31). Craig Evans sublinha que “Jesus chama a todos ao arrependimento: religiosos e irreligiosos, sadios e doentes, ricos e pobres”.

O evangelista João esclarece que Jesus é o salvador do mundo (Jo 4.42). O contexto dessa declaração envolvia os samaritanos que creram nEle por causa da sua Palavra (Jo 4.41). Significa que a graça salvífica está disponível para todos os homens (Tt 2.11). Por isso, a mensagem da salvação é um ato do amor e da graça divina pelos méritos de Cristo, que foi enviado pelo Pai “para que o mundo fosse salvo por ele” (Jo 3.16,17). Em vista disso, ratifica-se que os elementos dessa salvação incluem fé no sacrifício de Cristo, arrependimento de pecados e novo nascimento (Jo 3.3,15). Nesse sentido, Cristo declarou: “aquele que crê em mim tem a vida eterna” (Jo 6.47).

III – UMA MENSAGEM TRANSFORMADORA

1. A Transformação do Caráter. O caráter é definido como “a maneira própria de cada pessoa agir e expressar-se”. Nicola Abbagnano define o caráter como “o modo de ser ou de comportar-se habitual e constante de uma pessoa, na medida que individualiza e distingue a mesma pessoa.

O caráter é a marca distintiva de cada pessoa que regula a sua forma de pensar, de sentir, de desejar, de proceder e reagir de forma habitual. Em vista disso, a pessoa dotada de um caráter firme mantém sua postura, persegue o mesmo ideal e não se move facilmente de seus princípios. De outro lado, a pessoa de um caráter volúvel frequentemente oscila na forma de agir, sua postura muda de acordo com as circunstâncias. Essa atitude demonstra a fraqueza e a hipocrisia de um caráter malformado.

Antonio Gilberto pondera que “o caráter é um componente da personalidade. É adquirido e não herdado. Resulta da adaptação progressiva do temperamento às condições do meio-ambiente: o lar, a escola, a igreja, a comunidade e o estado socioeconômico”. Portanto, o caráter pode ser forjado, mudado e transformado.

Na Lei de Moisés, o Decálogo, ou os Dez Mandamentos, apresenta as orientações básicas para o modo de viver e agir dos israelitas (Êx 20.1-17). Os três primeiros mandamentos dizem respeito à teologia e os demais se referem a ética. A ética são os fundamentos da moral. A ética e a moral referem-se ao conjunto de costumes, valores e obrigações adotados em uma sociedade. Os princípios éticos e morais do Decálogo também são aplicados nos Evangelhos (Mc 10.19), exceto a guarda do sábado (Mt 12.2-4). Contudo, a mera observância de códigos não pode salvar a ninguém (Lc 18.18-24).

Somente a graça divina é capaz de transformar o caráter humano. A mudança de caráter implica mudança de comportamento. Como já visto, quando o caráter de Zaqueu foi curado, ele mudou radicalmente de postura (Lc 19.8; cf. Ef 4.28-31). Hebreus nos adverte que, sem mudança de vida, ninguém verá a Deus (Hb 12.14). Paulo descreve que o poder transformador do evangelho opera em nós de glória em glória (2 Co 3.18). Por meio da ação do Espírito Santo, e da obediência ao evangelho, o homem pode compartilhar a natureza do caráter de Deus (Mt 5.48). Desse modo, a mensagem do evangelho de Cristo produz substancial mudança no caráter do cristão (Lc 19.8,9).

2. A Restauração da Família. A Constituição Federal do Brasil prescreve que “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Assim, o conceito constitucional de família tem sua base compreensiva nas relações monogâmicas e heterossexuais.

No livro de Gênesis, Deus instituiu a família com princípios reguladores da monogamia e da heterossexualidade (Gn 1.27; 2.24). Porém, desde cedo, parte dos homens negligenciaram essa ordenança divina. Lameque instituiu a poligamia (Gn 4.19). As cidades de Sodoma e Gomorra praticavam promiscuidade sexual, incluindo a homossexualidade, e, por isso, foram destruídas para servir de exemplo aos que vivem de modo desordenado (Gn 19.24; 2 Pe 2.6).

Somada a essas práticas, a dissolução do casamento por qualquer motivo era autorizada pela Lei Mosaica (Dt 24.1-4). Essas concessões banalizavam a união conjugal, e provocava rupturas na família. Nos Evangelhos, Cristo restaura o propósito divino para o casamento: a união monogâmica e indissolúvel entre um homem e uma mulher (Gn 1.27; 2.24; Mt 19.4,5). Nesse aspecto, nossa Declaração de Fé rejeita “qualquer configuração social que se denomina família, cuja existência é fundamentada em prática, união ou qualquer conduta que atenta contra a monogamia e a heterossexualidade, consoante o modelo estabelecido pelo criador e ensinado por Jesus”.

No ensino ratificado por Cristo, a indissolubilidade do casamento é enfatizada com as seguintes palavras: “o que Deus ajuntou não separe o homem” (Mt 19.6). Por essa razão, nossa Declaração de Fé não reconhece a união conjugal realizada entre pessoas divorciadas, em desacordo com o preconizado pelo Senhor Jesus. As exceções são justificadas em casos de morte (Rm 7.2), infidelidade (Mt 5.32) e deserção do lar pelo descrente (1 Co 7.15). E, mesmo nas situações de traição e abandono, a mensagem cristã apresenta o perdão e a reconciliação como atitudes preferíveis (Mt 5.9,44; 18.21,22).

3. A Regeneração da Sociedade. Nossa Declaração de Fé afirma que “a estrutura dos Dez Mandamentos se resume no amor a Deus e ao próximo, diz respeito a Deus e à sociedade e envolve pensamento, palavras e obras”. Desse modo, todo o sistema mosaico — a Lei e os Profetas — está resumido em duas ações: “amar a Deus e amar ao próximo como a si mesmo” (Mt 22.37-40). O amor a Deus deve ser pleno. Deus requer um amor que envolve a pessoa toda: “coração, alma e entendimento” (Dt 6.5; Mc 12.30; Lc 10.27). O amor ao próximo se estende a todas as pessoas, inclusive ao inimigo (Lv 19.18; Mt 5.44; Lc 10.29-37).

Os Evangelhos asseguram que o amor de Deus para com a humanidade é a base da salvação (Jo 3.16; 15.13). Por conseguinte, a virtude do amor é o princípio basilar de todas as ações do crente salvo por Cristo, entre tantas: “o amor não faz mal ao próximo” (Rm 13.10); “o amor não se conduz de forma inconveniente” (1 Co 13.5, NAA); “o amor não se alegra com a injustiça” (1 Co 13.6, NAA). Em vista disso, os cristãos receberam a missão de proclamar a mensagem do amor de Cristo às nações (Mt 28.19). Esse amor perdoa, salva, cura, liberta e regenera a sociedade. Assim sendo, a Igreja fiel e guiada pelo Espírito, ao pregar e viver o evangelho, torna-se em sal da terra e luz do mundo (Mt 5.13,14).

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2022, p. 92-102.

LIÇÃO 7: A BÍBLIA TRANSFORMA AS PESSOAS


 

sábado, 5 de fevereiro de 2022

LIÇÃO 6: A BÍBLIA COMO UM GUIA PARA A VIDA

INTRODUÇÃO

A Bíblia Sagrada, quando crida e obedecida, torna-se um seguro, autêntico e verdadeiro guia para o viver cristão. O texto sagrado aponta para Cristo como o único caminho que conduz à vida abundante (Jo 10.10). O próprio Cristo nos adverte ao exame das Escrituras porque nelas estão reveladas as palavras de vida eterna (Jo 5.39). O apóstolo Tiago assevera que a Palavra de Deus transforma a nossa natureza, e nos conduz pela vereda da salvação (Tg 1.21). Em vista disso, Peter Davids assinala “não ser suficiente que a pessoa esteja convencida a respeito de Jesus; a pessoa deve entregar-se a Cristo, aceitar seu ensino, e essa fidelidade é o estilo de uma nova vida”.

Nessa nobre tarefa, a imutável e inerrante Palavra de Deus alumia o caminho que devemos trilhar com plena segurança. O Senhor Jesus alerta que a porta é estreita, e o caminho é apertado, porém, é o único que leva à vida, e poucos há que o encontram (Mt 7.14). Nesse aspecto, Tasker lembra que “o que torna o caminho estreito difícil de achar é a existência de numerosos mestres falsos que têm as suas próprias fórmulas para o bem-estar do homem”. Assim, por meio da irrestrita obediência às Escrituras e o temor a Deus, recebemos sabedoria e prudência para andar como filhos da luz (Ef 5.8). Neste capítulo, veremos que a Escritura serve como alicerce de sabedoria e prudência.

I – A BÍBLIA É UM ALICERCE PARA A VIDA

1. A Palavra de Deus é alicerce. Importante ressaltar que a Bíblia é a única infalível revelação escrita, divinamente inspirada (2 Tm 3.16; Ap 1.1). Quem ouve e coloca em prática a Palavra de Deus é comparado a uma pessoa prudente cuja casa é alicerçada sobre a rocha (Mt 7.24). Na última seção do sermão do Monte, pouco antes do epílogo, Cristo narra a parábola dos “construtores sábios e os construtores tolos” (Mt 7.24- 27). Os editores do Comentário Bíblico Pentecostal chamam atenção para o paralelismo clássico apresentado na parábola: “o sábio constrói sobre a rocha; o tolo constrói sobre a areia”.

E quem é o sábio? “Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras [de Cristo], e as pratica” (Mt 7.24); consequentemente o tolo é “aquele que ouve estas minhas palavras [de Cristo], e não as cumpre” (Mt 7.26).

Nessa ilustração de Jesus, a casa simboliza a vida. A pessoa prudente constrói a sua casa e estabelece toda a sua vida em submissão genuína à Palavra de Cristo. A pessoa desobediente constrói sobre o fundamento frouxo da confiança própria e de falsas esperanças. Ambas as construções sofrem com as intempéries da vida: a chuva torrencial, a inundação e o temporal (Mt 7.25,27). Esses elementos simbolizam os tempos difíceis da nossa vida: perseguições, traições, doenças, violências e sofrimentos diversos. É importante notar que Cristo já tinha ensinado que o Pai “faz que o seu sol se levante sobre maus e bons e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mt 5.45). Significa que ninguém está imune das adversidades da vida.

Entretanto, existe uma diferença crucial entre os dois construtores, em especial no enfrentamento desses problemas. A casa edificada sobre a rocha, apesar de ter sido ferozmente combatida, nem caiu e nem quebrou (Mt 7.25). Porém, um toque dramático é acrescentado à casa fundada na areia: “caiu, e foi grande a sua queda” (Mt 7.27). A parábola claramente ensina que nossa vida deve estar edificada nos ensinos de Cristo a fim de alcançar a virtude e um destino glorioso (Jo 3.16). O próprio Cristo é a rocha sobre a qual devemos edificar a nossa casa (1 Co 10.4). É somente pela nossa união com Cristo que podemos ter esperança e segurança. Ele tem as palavras de vida eterna (Jo 6.68). A síntese desse grande ensinamento é que nem as crises dessa vida e nem a eternidade poderá abalar quem está firmado em Cristo e na sua Palavra (Mt 7.25).

2. A Palavra de Deus é Luz. Os Salmos declaram que a Palavra de Deus é “lâmpada para os pés” e “luz para o caminho” (Sl 119.105). Ao dissertar acerca desse salmo, Charles Spurgeon escreveu: “um dos benefícios mais práticos dos textos sagrados é a orientação nos atos da vida diária; esta tocha não é enviada para nos assombrar com seu brilho, mas para nos orientar com a sua instrução”. Quer dizer que a Bíblia possui orientações para cada passo do nosso viver e instruções para todo o curso da nossa vida. No salmo em questão, Davi guia os seus passos pelas Escrituras e assume o compromisso de guardar os seus estatutos (Sl 119.106).

O apóstolo Pedro fala da Palavra como “uma luz que alumia em lugar escuro” (2 Pe 1.19). Sobre essa declaração, o Comentário de Aplicação Pessoal discorre que “temos as Escrituras como a nossa luz e o Espírito Santo para esclarecer e nos orientar, à medida que aprendemos mais sobre a verdade”. Implica dizer que aquele que não é guiado pelas Escrituras encontra-se desorientado, cedo ou tarde irá tropeçar, e consequentemente sucumbirá. Somente a luz das Escrituras dissipa a escuridão espiritual e nos conduz em segurança pelo caminho da vida eterna. A respeito disso, Cristo declarou: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas” (Jo 8.12). Essa afirmação do Senhor Jesus lembra a coluna de fogo que orientou os filhos de Israel durante a noite nas suas peregrinações no deserto (Êx 13.21). O Comentário Bíblico Beacon enfatiza que “da mesma maneira como Jeová era o seu guia e Iluminador naquela ocasião, assim também Jesus é o EU SOU, sempre presente, sempre iluminado, dispersando a escuridão”. E, nessa direção, também Paulo ensina que devemos andar como filhos da luz (Ef 5.8), isto é, afastados da prática do pecado (1 Jo 3.6).

3. A Palavra de Deus é imutável. Tendo a inspiração divina como pressuposto, ratificamos que a Palavra de Deus é a nossa autoridade final de fé e prática (2 Pe 1.21). A Bíblia difere de outros livros porque seus ensinos são fidedignos e confiáveis, não erram e nem falham. O Senhor Jesus declarou enfaticamente que “a Escritura não pode ser anulada” (Jo 10.35). Compreende-se a partir dessa sentença que a Escritura não pode ser invalidada (Mc 7.13), isto é, a Palavra de Deus não pode ser colocada de lado quando seu ensino não convém ou não agrada as pessoas. Não pode ser ressignificada para atender aos ideais e aspirações do humanismo. O que está escrito permanece escrito.

Desse modo, o texto bíblico permanece inalterado e “imexível”. Cristo foi quem assegurou essa certeza ao declarar: “passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13.31). Deus não muda (Ml 3.6), Ele é fiel ao concerto estabelecido, e, por conseguinte, a sua Palavra é imutável. O apóstolo Tiago escreve que em Deus “não há mudança, nem sombra de variação” (Tg 1.17). Ele é plenamente confiável, sua Palavra é absolutamente constante. Deus não mente (Nm 23.19), e nem pode mentir (Hb 6.18). Portanto, os princípios bíblicos e as doutrinas revelados nas Escrituras têm aplicação hoje, assim como tiveram antigamente (Is 55.11).

Em suma, os padrões da ética e da moral cristã não sofrem mudanças (1 Pe 1.20). Os valores cristãos são permanentes, pois a fonte de autoridade é permanente (Mt 5.18). Não cabe ao cristão contradizer e nem ajustar as Escrituras para atender aos interesses das ideologias pós-modernas. Assim sendo, o comportamento e o caráter do cristão se alicerçam nas doutrinas bíblicas (Ef 2.20). Os textos aqui citados, e tantos outros que por falta de espaço não foram mencionados, atestam que a Bíblia Sagrada é exatamente aquilo que ela afirma ser: a inspirada, inerrante e infalível Palavra de Deus.

II – A BÍBLIA NOS TORNA PESSOAS SÁBIAS

1. O conceito de Sabedoria. O substantivo hebraico para sabedoria é “hokmãh”. O Dicionário Vine anota que essa palavra aparece 141 vezes no Antigo Testamento, e, na maior parte das vezes, em Jó, Provérbios e Eclesiastes. O termo significa “o conhecimento e a habilidade de fazer escolhas certas no momento oportuno. A consistência de fazer a escolha certa é indicação de maturidade e desenvolvimento”. A palavra correspondente para sabedoria em grego é “sophia”, e está relacionada e se assemelha com a prática da prudência, isto é, “a capacidade de discernir modos de ação com vistas aos seus resultados”. Em síntese, ambos os termos têm o sentido de “habilidade”, “experiência” e “qualidade de quem é sábio”.

O teólogo Russel Joyner assegura que a Bíblia coloca a sabedoria no âmbito da prática, por isso a verdadeira sabedoria “reúne o conhecimento da verdade com a experiência do cotidiano”. Significa que o conhecimento absorvido pela mente deve ser aplicado em todas as situações da vida. A orientação de provérbios “adquire a sabedoria, adquire a inteligência” (Pv 4.5) sublinha que não é suficiente acumular informações e encher o intelecto de conhecimento. A sabedoria ultrapassa o conhecimento dos fatos, das leis e das ciências. Nesse aspecto, o conhecimento sem a prática adequada do aprendizado não produz sabedoria (Pv 3.7).

2. Deus é a fonte da Sabedoria. A sabedoria é um dos atributos divinos (Dn 2.20). As Escrituras nos exortam a adorar “o único Deus sábio” (Rm 16.27; 1 Tm 1.17; Jd 1.25). Ele é a única fonte da genuína sabedoria (Pv 2.6; Ef 1.16,17). O erudito Louis Berkhof analisa que “pode-se considerar a sabedoria de Deus como um aspecto do seu conhecimento [...] ela indica o fato de que Ele sempre busca os melhores fins possíveis, e escolhe os melhores meios para a consecução dos seus propósitos”. Nesse entendimento, Charles Hodge afirma que “todas as obras de Deus declaram sua sabedoria. Elas mostram, desde as menores até as maiores, a mais prodigiosa adaptação de meios para a concretização do sublime fim do bem-estar de suas criaturas e para a manifestação de sua própria glória”. Mercê dessas verdades, ratifica-se que somente Deus é detentor de tamanha sabedoria. O apóstolo Paulo assevera que a sabedoria divina é inescrutável (Rm 11.33).

A Bíblia ainda ensina que toda a sabedoria dos santos provém da parte de Deus segundo o beneplácito da sua vontade (Ef 1.8,9). Por meio da graça, Deus faz os crentes transbordarem com sabedoria e discernimento (1 Co 1.21, 24; 1 Tm 1.14). Paulo escreve que Deus fez Cristo ser a sabedoria em nós (1 Co 1.30). Nesse aspecto, William Hendriksen ratifica que essa sabedoria “é a capacidade de aplicar o conhecimento para melhor proveito, capacitando uma pessoa a usar os meios mais eficazes para alcançar a meta mais elevada”. Isso implica a compreensão do plano divino da salvação e da aplicação das Escrituras no dia a dia da caminhada cristã. Em resumo, visto que Deus é a verdadeira sabedoria, as suas palavras e seus atos são igualmente sábios (Sl 19.7; Pv 3.19). Portanto, todos que vivem de acordo com os preceitos da Palavra de Deus são considerados pessoas sábias (1 Co 2.6,7).

3. O Temor É o Princípio da Sabedoria. A Bíblia registra que “o temor do Senhor é o princípio do saber” (Pv 1.7, ARA). A expressão “temor do Senhor” aparece doze vezes no livro de Provérbios, e no modo imperativo “Temei ao Senhor” é encontrado outras quatro vezes (Pv 1.7,29; 2.5; 3.7; 8.13; 9.10; 10.27; 14.2,26,27; 15.16,33; 16.6; 22.4; 23.17; 24.21). A reiterada repetição dessa frase denota o princípio fundamental da religião revelada: “o temor a Deus”. O Dicionário Bíblico Wycliffe apresenta o seguinte conceito para a palavra “temor”:


Um temor santo (heb. yir’a, gr. phobos) que significa ter grande temor ou respeito pela majestade e santidade de Deus, uma reverência piedosa (Gn 20.11; Sl 34.11; At 9.31; Rm 3.18). Davi fala desse temor como sendo limpo e puro (Sl 19.9); [...] Este temor é dado por Deus e permite que o homem respeite a autoridade de Deus, obedeça aos seus mandamentos, se desvie do mal (1Sm 12.14,20-25; Sl 2.11; Pv 8.13; 16.6) e busque constantemente a santidade (2Co 7.1; Fp 2.12). Os gentios convertidos ao judaísmo, que criam em Deus, eram chamados de tementes a Deus (At 10.2,22; 13.26).

Diante dessa definição, “temer ao Senhor” não significa ter medo, fobia ou terror de Deus; ao contrário, expressa reverência, gratidão e adoração ao Todo-Poderoso (Dt 10.12). Essa atitude é o preceito pelo qual se inicia a sabedoria. O temor ao Senhor é o primeiro e controlador princípio, não é uma etapa que se abandona, não é apenas um método correto de pensamento, mas, sim, um relacionamento correto de submissão e adoração a Deus. O temor a Deus é o ponto de partida que produz o verdadeiro entendimento, o sábio proceder (Rm 12.1,2).

Aqui importa ressaltar, como já observado, que o conhecimento e a sabedoria não são a mesma coisa, embora os termos estejam relacionados entre si. Uma pessoa iletrada pode ultrapassar em sabedoria quem tem elevado grau de instrução. O conhecimento é adquirido pelo estudo, mas a sabedoria resulta da compreensão de todos os fatos relevantes a respeito da vida, inclusive as coisas espirituais. E, assim, por meio do entendimento e obediência às Escrituras, os cristãos passam a viver como pessoas sábias (Ef 5.15). Em contraste, os que rejeitam o Senhor e a sua Palavra permanecem na ignorância (Sl 14.1).

4. Os Benefícios da Sabedoria. O salmista declara que o ato de meditar na Palavra de Deus o tornara mais sábio que todos a sua volta (Sl 119.97-100). Essa afirmação significa que ele adquiriu sabedoria ao aplicar os preceitos do Senhor na sua vida. Davi expressa seu profundo amor pela Lei do Senhor, e faz dela a sua meditação diária (Sl 119.97). Como resultado, tornou-se mais sábio do que os inimigos (Sl 119.98); mais entendido que os mestres (Sl 119.99); e mais prudente que os anciãos (Sl 119.100). Ao comentar esse texto, Spurgeon assinala que “ele tinha sido ensinado a observar no coração e na vida os preceitos do Senhor [...] Ele tinha a Palavra dentro de si, e assim superou seus adversários; ele meditava nela, e assim ultrapassou seus amigos; ele a praticava, e assim ofuscou os seus antepassados”.

Salomão assegura que a pessoa sábia tem muitos benefícios: “Se fores sábio, para ti sábio serás; e, se fores escarnecedor, tu só o suportarás” (Pv 9.12). Nesse versículo, destaca-se o conceito da responsabilidade individual. Derek Kidner sublinha que as pessoas recebem benefício ou sofrem por causa do caráter que cada um possui (Pv 10.1). O texto bíblico ressalta que, em última análise, quem ganha ou perde é a própria pessoa. Desse modo, aquele que teme ao Senhor desfruta das benesses da sabedoria, dentre elas, acumula conhecimento para usar na ocasião certa (Pv 10.14); conquista outras almas para também serem sábias (Pv 11.30); em virtude do bom senso, torna-se próspero em todos os seus caminhos (Pv 19.8); e não apenas controla seus impulsos, mas exerce o domínio próprio (Pv 29.11). Em vista disso, a Escritura nos adverte com frequência a empregar esforços na busca da sabedoria (Pv 2.2; 3.21; 4.5,7; 16.16; 23.23).

III – A BÍBLIA E A PRUDÊNCIA PARA A VIDA

1. O Conceito de Prudência. O Dicionário Bíblico Wycliffe informa que o termo hebraico “arum” é usado no sentido positivo para identificar uma pessoa sensata: “a sabedoria do prudente é entender o seu caminho” (Pv 14.8); “o prudente atenta para os seus passos” (Pv 14.15); “os prudentes se coroarão de conhecimento” (Pv 14.18); e “o que observa a repreensão prudentemente se haverá” (Pv 15.5). Porém, a expressão ainda pode ser empregada no mau sentido para identificar alguém sagaz ou astuto: “Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo” (Gn 3.1); “Ele aniquila as imaginações dos astutos [...] Ele apanha os sábios na sua própria astúcia” (Jó 5.12,13); “tu escolheste a língua dos astutos” (Jó 15.5); e “tomaram astuto conselho contra o teu povo” (Sl 83.3, ACF). Destaca igualmente que a expressão hebraica “bin” e o adjetivo grego “synetos” apontam para uma decisão inteligente: “o sábio de coração será chamado prudente” (Pv 16.21); “o procônsul Sérgio Paulo, que era um homem inteligente” (At 13.7, NAA). Desse modo, no aspecto positivo, os textos sinalizam uma conduta não precipitada.

O Dicionário Vine enfatiza que o substantivo grego “phronesis” e suas declinações implica “ter entendimento” e denota “sabedoria prática, prudência na administração dos negócios” (Lc 1.17; Ef 1.8). Já o substantivo “synesis” é traduzido por “inteligência” e sugere “rapidez de apreensão”, a “consideração penetrante que precede a ação” (1 Co 1.19). Essa concepção pode ser vista equitativamente nos tratados da filosofia aristotélica:


O ato prudente considera as circunstâncias, prevê as possíveis consequências, analisa os antecedentes, compara a ação com obras semelhantes, pondera os prós e contras, reprime as paixões que escurecem a razão, delimita os interesses próprios da decisão correta. O exame e a reflexão poderão realizar-se com maior ou menor velocidade dependendo do indivíduo e da magnitude e qualidade da ação.

Tomás de Aquino (1225-1274 d.C) define a prudência como razão reta do agir (latim: recta ratio agibilium). Considera como uma virtude própria da razão prática. Em outras palavras, Aquino ensina que é próprio do homem prudente a capacidade de deliberar bem em vista de certo fim. Em vista disso, em termos gerais, a prudência é a virtude própria da boa escolha que evita ações temerárias. Refere-se à faculdade crítica de avaliar situações e encontrar a maneira adequada de abordagem na busca da melhor solução. Nesse aspecto, com cautela e bom senso, uma pessoa prudente é capaz de discernir e fazer a escolha correta. Contudo, convém esclarecer que biblicamente a prudência está unida estreitamente à sabedoria. E, como já visto, a sabedoria procede de Deus (Ef 1.8,9). Por isso, a prudência é sobretudo uma virtude de quem é sábio, e, portanto, habilitado a realizar as escolhas certas (Dt 30.19; Lc 10.42).

2. A Prudência dos Justos. Esse termo é empregado pelo evangelista Lucas quando descreve o ministério de João Batista. A missão do precursor do Messias é converter o coração “dos pais aos filhos” e os rebeldes à “prudência dos justos” (Lc 1.17). Ao discorrer sobre essa última declaração, Matthew Henry observa que “a verdadeira religião é a sabedoria dos homens justos, diferentemente da sabedoria do mundo. Sermos religiosos é, ao mesmo tempo, a nossa sabedoria e o nosso dever; nisto existe tanto equidade quanto prudência”. Significa que o Evangelho tem como desígnio trazer as pessoas de volta para Deus. E, quando isso acontece, os ignorantes, desobedientes e rebeldes de outrora se tornam sábios, justos e prudentes. Essa sabedoria prática que orienta e corrige o viver diário é o resultado da verdadeira conversão a Cristo. Aqueles que experimentam o novo nascimento desenvolvem o caráter e praticam a boa conduta dos justos.

Nesse sentido, a mensagem da salvação em Cristo não apenas restaura o pecador, mas também o faz andar por veredas de retidão. Salomão assegura que “a vereda dos justos é como a luz da aurora” (Pv 4.18). Hernandes Lopes considera que não se trata apenas de um caminho iluminado, “mas um caminho cuja luz vai crescendo como a luz do sol até ser dia perfeito [...] sua história começa na conversão e avança no processo da santificação, mas seu alvo é a glorificação, o dia perfeito”. O apóstolo Paulo declara que a graça de Deus nos alcança o perdão, e ainda a sabedoria e a prudência (Ef 1.7,8). A sabedoria para compreender a verdade revelada, e a prudência para agir corretamente, segundo a vontade de Deus (Ef 1.9). Essas dádivas são aperfeiçoadas pela oração, leitura das Escrituras e comunhão com o Espírito Santo (1 Ts 5.17; 2 Tm 3.14,15; Ef 5.18).

3. Os Benefícios da Prudência. O livro de Provérbios descreve os propósitos e os benefícios da prudência (Pv 1.1-6). Nessa direção, o preâmbulo articula os objetivos do texto (Pv 1.2-6) e o seu destinatário (Pv 1.4,5). Cada versículo começa com a expressão “para”, com exceção do versículo 5, em que o termo não aparece, mas está implícito. Essa série de frases é um sumário das finalidades dos provérbios de Salomão, a saber: “para se conhecer a sabedoria e a instrução” (Pv 1.2a); “para se entenderem as palavras da prudência” (Pv 1.2b); “para aceitar o comportamento prudente” (Pv 1.3a); “para fazer o que é reto, justo e íntegro” (Pv 1.3b); “para dar perspicácia e discrição” (Pv 1.4); “[para] o sábio aumentar o aprendizado” (Pv 1.5a); “[para] o criterioso adquirir orientação” (Pv 1.5b); e “para entender um provérbio e os ditos dos sábios” (Pv 1.6).

Para alcançar essas metas, o livro apresenta instruções éticas no intuito de moldar o caráter que resulta em benesses para os que escutam e praticam as sábias instruções. Dentre elas, destaca-se: o autocontrole para não revidar ofensas (Pv 12.16). Ao contrário, aquele que não tem a capacidade de controlar as emoções é insensato. Bruce Waltke salienta que “os sábios consideravam essa disposição interna de exasperação uma emoção perigosa: ela mata o insensato (Jó 5.2) e deve ser contida; o sábio não a demonstra”. Outro proveito da prudência é a postura de humildade para não exibir conhecimento (Pv 12.23). Hernandes Lopes avalia que o prudente “não enaltece a si mesmo como um fariseu soberbo nem se compara aos demais apenas para se sobressair. A humildade é o caminho da honra, enquanto a altivez é a autopista da vergonha”.

A prudência, inclusive, favorece na correta tomada de decisões (Pv 13.16). Bruce Waltke comenta que a pessoa prudente se protege por meio de “um conhecimento que inclui ver o perigo de antemão e se refugiar, e que fala com cautela e prudência”. A pessoa prudente, ainda, pensa antes de agir para não ser influenciada (Pv 14.15). Derek Kidner sublinha que o tolo ou o ingênuo “aceita de segunda fonte aquilo que deveria ser averiguado por conta própria [...] agindo de acordo com o estado dos sentimentos, e não com os méritos do caso”. O prudente, também, alcança boa reputação e alta posição (Pv 14.35). Hernandes Lopes anota que “se formos prudentes, ceifaremos favor; se formos indignos, colheremos fúria. O empregado prudente que vive de forma irrepreensível, fala de forma irrefutável e realiza obras inegáveis goza do respeito e do favor de seus superiores”. O prudente, igualmente, sujeita-se ao aprendizado e a correção (Pv 15.5). Todo aquele que atende a repreensão e aceita humildemente a disciplina se comporta com prudência. O caminho da vida não é a rebeldia, mas a obediência. Além disso, a pessoa prudente desvia-se do perigo por meio de soluções cautelosas e antecipadas (Pv 22.3).

Nos Evangelhos, Cristo enfatizou que a pessoa prudente tem a Palavra de Deus como alicerce e regra de vida (Mt 7.24). Nesse ponto, Tasker sublinha que “o homem cuja fé em Cristo é real e sincera poderá sobre esta fé, e o fará, construir o edifício do caráter cristão, que resistirá às tempestades de incompreensão e desapontamento, de cinismo e dúvida, de sofrimento e perseguição, quando ameaçarem destruí-lo”. Ademais, o Senhor ensinou que o servo prudente procede com retidão e cumpre seus deveres com fidelidade (Mt 24.45). Mantém-se ocupado, cumprindo fielmente as suas tarefas, e desse modo se conserva preparado para quando o seu Senhor chegar. Na parábola das dez virgens, Jesus ensina que a pessoa prudente cuida com esmero da sua vida espiritual e mantém acesa a chama do Espírito (Mt 25.4). Myer Pearlman considera que “as virgens prudentes representam aqueles crentes que, reconhecendo possível demora do Noivo, não somente o aguardam pacientemente, como conservam-se diligentemente num estado espiritual apropriado a qualquer chamada repentina”. Em vista disso, a Bíblia nos exorta a viver prudentemente, e não como néscios (Ef 5.15).

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2022, p. 69-79.