sábado, 5 de fevereiro de 2022

LIÇÃO 6: A BÍBLIA COMO UM GUIA PARA A VIDA

INTRODUÇÃO

A Bíblia Sagrada, quando crida e obedecida, torna-se um seguro, autêntico e verdadeiro guia para o viver cristão. O texto sagrado aponta para Cristo como o único caminho que conduz à vida abundante (Jo 10.10). O próprio Cristo nos adverte ao exame das Escrituras porque nelas estão reveladas as palavras de vida eterna (Jo 5.39). O apóstolo Tiago assevera que a Palavra de Deus transforma a nossa natureza, e nos conduz pela vereda da salvação (Tg 1.21). Em vista disso, Peter Davids assinala “não ser suficiente que a pessoa esteja convencida a respeito de Jesus; a pessoa deve entregar-se a Cristo, aceitar seu ensino, e essa fidelidade é o estilo de uma nova vida”.

Nessa nobre tarefa, a imutável e inerrante Palavra de Deus alumia o caminho que devemos trilhar com plena segurança. O Senhor Jesus alerta que a porta é estreita, e o caminho é apertado, porém, é o único que leva à vida, e poucos há que o encontram (Mt 7.14). Nesse aspecto, Tasker lembra que “o que torna o caminho estreito difícil de achar é a existência de numerosos mestres falsos que têm as suas próprias fórmulas para o bem-estar do homem”. Assim, por meio da irrestrita obediência às Escrituras e o temor a Deus, recebemos sabedoria e prudência para andar como filhos da luz (Ef 5.8). Neste capítulo, veremos que a Escritura serve como alicerce de sabedoria e prudência.

I – A BÍBLIA É UM ALICERCE PARA A VIDA

1. A Palavra de Deus é alicerce. Importante ressaltar que a Bíblia é a única infalível revelação escrita, divinamente inspirada (2 Tm 3.16; Ap 1.1). Quem ouve e coloca em prática a Palavra de Deus é comparado a uma pessoa prudente cuja casa é alicerçada sobre a rocha (Mt 7.24). Na última seção do sermão do Monte, pouco antes do epílogo, Cristo narra a parábola dos “construtores sábios e os construtores tolos” (Mt 7.24- 27). Os editores do Comentário Bíblico Pentecostal chamam atenção para o paralelismo clássico apresentado na parábola: “o sábio constrói sobre a rocha; o tolo constrói sobre a areia”.

E quem é o sábio? “Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras [de Cristo], e as pratica” (Mt 7.24); consequentemente o tolo é “aquele que ouve estas minhas palavras [de Cristo], e não as cumpre” (Mt 7.26).

Nessa ilustração de Jesus, a casa simboliza a vida. A pessoa prudente constrói a sua casa e estabelece toda a sua vida em submissão genuína à Palavra de Cristo. A pessoa desobediente constrói sobre o fundamento frouxo da confiança própria e de falsas esperanças. Ambas as construções sofrem com as intempéries da vida: a chuva torrencial, a inundação e o temporal (Mt 7.25,27). Esses elementos simbolizam os tempos difíceis da nossa vida: perseguições, traições, doenças, violências e sofrimentos diversos. É importante notar que Cristo já tinha ensinado que o Pai “faz que o seu sol se levante sobre maus e bons e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mt 5.45). Significa que ninguém está imune das adversidades da vida.

Entretanto, existe uma diferença crucial entre os dois construtores, em especial no enfrentamento desses problemas. A casa edificada sobre a rocha, apesar de ter sido ferozmente combatida, nem caiu e nem quebrou (Mt 7.25). Porém, um toque dramático é acrescentado à casa fundada na areia: “caiu, e foi grande a sua queda” (Mt 7.27). A parábola claramente ensina que nossa vida deve estar edificada nos ensinos de Cristo a fim de alcançar a virtude e um destino glorioso (Jo 3.16). O próprio Cristo é a rocha sobre a qual devemos edificar a nossa casa (1 Co 10.4). É somente pela nossa união com Cristo que podemos ter esperança e segurança. Ele tem as palavras de vida eterna (Jo 6.68). A síntese desse grande ensinamento é que nem as crises dessa vida e nem a eternidade poderá abalar quem está firmado em Cristo e na sua Palavra (Mt 7.25).

2. A Palavra de Deus é Luz. Os Salmos declaram que a Palavra de Deus é “lâmpada para os pés” e “luz para o caminho” (Sl 119.105). Ao dissertar acerca desse salmo, Charles Spurgeon escreveu: “um dos benefícios mais práticos dos textos sagrados é a orientação nos atos da vida diária; esta tocha não é enviada para nos assombrar com seu brilho, mas para nos orientar com a sua instrução”. Quer dizer que a Bíblia possui orientações para cada passo do nosso viver e instruções para todo o curso da nossa vida. No salmo em questão, Davi guia os seus passos pelas Escrituras e assume o compromisso de guardar os seus estatutos (Sl 119.106).

O apóstolo Pedro fala da Palavra como “uma luz que alumia em lugar escuro” (2 Pe 1.19). Sobre essa declaração, o Comentário de Aplicação Pessoal discorre que “temos as Escrituras como a nossa luz e o Espírito Santo para esclarecer e nos orientar, à medida que aprendemos mais sobre a verdade”. Implica dizer que aquele que não é guiado pelas Escrituras encontra-se desorientado, cedo ou tarde irá tropeçar, e consequentemente sucumbirá. Somente a luz das Escrituras dissipa a escuridão espiritual e nos conduz em segurança pelo caminho da vida eterna. A respeito disso, Cristo declarou: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas” (Jo 8.12). Essa afirmação do Senhor Jesus lembra a coluna de fogo que orientou os filhos de Israel durante a noite nas suas peregrinações no deserto (Êx 13.21). O Comentário Bíblico Beacon enfatiza que “da mesma maneira como Jeová era o seu guia e Iluminador naquela ocasião, assim também Jesus é o EU SOU, sempre presente, sempre iluminado, dispersando a escuridão”. E, nessa direção, também Paulo ensina que devemos andar como filhos da luz (Ef 5.8), isto é, afastados da prática do pecado (1 Jo 3.6).

3. A Palavra de Deus é imutável. Tendo a inspiração divina como pressuposto, ratificamos que a Palavra de Deus é a nossa autoridade final de fé e prática (2 Pe 1.21). A Bíblia difere de outros livros porque seus ensinos são fidedignos e confiáveis, não erram e nem falham. O Senhor Jesus declarou enfaticamente que “a Escritura não pode ser anulada” (Jo 10.35). Compreende-se a partir dessa sentença que a Escritura não pode ser invalidada (Mc 7.13), isto é, a Palavra de Deus não pode ser colocada de lado quando seu ensino não convém ou não agrada as pessoas. Não pode ser ressignificada para atender aos ideais e aspirações do humanismo. O que está escrito permanece escrito.

Desse modo, o texto bíblico permanece inalterado e “imexível”. Cristo foi quem assegurou essa certeza ao declarar: “passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13.31). Deus não muda (Ml 3.6), Ele é fiel ao concerto estabelecido, e, por conseguinte, a sua Palavra é imutável. O apóstolo Tiago escreve que em Deus “não há mudança, nem sombra de variação” (Tg 1.17). Ele é plenamente confiável, sua Palavra é absolutamente constante. Deus não mente (Nm 23.19), e nem pode mentir (Hb 6.18). Portanto, os princípios bíblicos e as doutrinas revelados nas Escrituras têm aplicação hoje, assim como tiveram antigamente (Is 55.11).

Em suma, os padrões da ética e da moral cristã não sofrem mudanças (1 Pe 1.20). Os valores cristãos são permanentes, pois a fonte de autoridade é permanente (Mt 5.18). Não cabe ao cristão contradizer e nem ajustar as Escrituras para atender aos interesses das ideologias pós-modernas. Assim sendo, o comportamento e o caráter do cristão se alicerçam nas doutrinas bíblicas (Ef 2.20). Os textos aqui citados, e tantos outros que por falta de espaço não foram mencionados, atestam que a Bíblia Sagrada é exatamente aquilo que ela afirma ser: a inspirada, inerrante e infalível Palavra de Deus.

II – A BÍBLIA NOS TORNA PESSOAS SÁBIAS

1. O conceito de Sabedoria. O substantivo hebraico para sabedoria é “hokmãh”. O Dicionário Vine anota que essa palavra aparece 141 vezes no Antigo Testamento, e, na maior parte das vezes, em Jó, Provérbios e Eclesiastes. O termo significa “o conhecimento e a habilidade de fazer escolhas certas no momento oportuno. A consistência de fazer a escolha certa é indicação de maturidade e desenvolvimento”. A palavra correspondente para sabedoria em grego é “sophia”, e está relacionada e se assemelha com a prática da prudência, isto é, “a capacidade de discernir modos de ação com vistas aos seus resultados”. Em síntese, ambos os termos têm o sentido de “habilidade”, “experiência” e “qualidade de quem é sábio”.

O teólogo Russel Joyner assegura que a Bíblia coloca a sabedoria no âmbito da prática, por isso a verdadeira sabedoria “reúne o conhecimento da verdade com a experiência do cotidiano”. Significa que o conhecimento absorvido pela mente deve ser aplicado em todas as situações da vida. A orientação de provérbios “adquire a sabedoria, adquire a inteligência” (Pv 4.5) sublinha que não é suficiente acumular informações e encher o intelecto de conhecimento. A sabedoria ultrapassa o conhecimento dos fatos, das leis e das ciências. Nesse aspecto, o conhecimento sem a prática adequada do aprendizado não produz sabedoria (Pv 3.7).

2. Deus é a fonte da Sabedoria. A sabedoria é um dos atributos divinos (Dn 2.20). As Escrituras nos exortam a adorar “o único Deus sábio” (Rm 16.27; 1 Tm 1.17; Jd 1.25). Ele é a única fonte da genuína sabedoria (Pv 2.6; Ef 1.16,17). O erudito Louis Berkhof analisa que “pode-se considerar a sabedoria de Deus como um aspecto do seu conhecimento [...] ela indica o fato de que Ele sempre busca os melhores fins possíveis, e escolhe os melhores meios para a consecução dos seus propósitos”. Nesse entendimento, Charles Hodge afirma que “todas as obras de Deus declaram sua sabedoria. Elas mostram, desde as menores até as maiores, a mais prodigiosa adaptação de meios para a concretização do sublime fim do bem-estar de suas criaturas e para a manifestação de sua própria glória”. Mercê dessas verdades, ratifica-se que somente Deus é detentor de tamanha sabedoria. O apóstolo Paulo assevera que a sabedoria divina é inescrutável (Rm 11.33).

A Bíblia ainda ensina que toda a sabedoria dos santos provém da parte de Deus segundo o beneplácito da sua vontade (Ef 1.8,9). Por meio da graça, Deus faz os crentes transbordarem com sabedoria e discernimento (1 Co 1.21, 24; 1 Tm 1.14). Paulo escreve que Deus fez Cristo ser a sabedoria em nós (1 Co 1.30). Nesse aspecto, William Hendriksen ratifica que essa sabedoria “é a capacidade de aplicar o conhecimento para melhor proveito, capacitando uma pessoa a usar os meios mais eficazes para alcançar a meta mais elevada”. Isso implica a compreensão do plano divino da salvação e da aplicação das Escrituras no dia a dia da caminhada cristã. Em resumo, visto que Deus é a verdadeira sabedoria, as suas palavras e seus atos são igualmente sábios (Sl 19.7; Pv 3.19). Portanto, todos que vivem de acordo com os preceitos da Palavra de Deus são considerados pessoas sábias (1 Co 2.6,7).

3. O Temor É o Princípio da Sabedoria. A Bíblia registra que “o temor do Senhor é o princípio do saber” (Pv 1.7, ARA). A expressão “temor do Senhor” aparece doze vezes no livro de Provérbios, e no modo imperativo “Temei ao Senhor” é encontrado outras quatro vezes (Pv 1.7,29; 2.5; 3.7; 8.13; 9.10; 10.27; 14.2,26,27; 15.16,33; 16.6; 22.4; 23.17; 24.21). A reiterada repetição dessa frase denota o princípio fundamental da religião revelada: “o temor a Deus”. O Dicionário Bíblico Wycliffe apresenta o seguinte conceito para a palavra “temor”:


Um temor santo (heb. yir’a, gr. phobos) que significa ter grande temor ou respeito pela majestade e santidade de Deus, uma reverência piedosa (Gn 20.11; Sl 34.11; At 9.31; Rm 3.18). Davi fala desse temor como sendo limpo e puro (Sl 19.9); [...] Este temor é dado por Deus e permite que o homem respeite a autoridade de Deus, obedeça aos seus mandamentos, se desvie do mal (1Sm 12.14,20-25; Sl 2.11; Pv 8.13; 16.6) e busque constantemente a santidade (2Co 7.1; Fp 2.12). Os gentios convertidos ao judaísmo, que criam em Deus, eram chamados de tementes a Deus (At 10.2,22; 13.26).

Diante dessa definição, “temer ao Senhor” não significa ter medo, fobia ou terror de Deus; ao contrário, expressa reverência, gratidão e adoração ao Todo-Poderoso (Dt 10.12). Essa atitude é o preceito pelo qual se inicia a sabedoria. O temor ao Senhor é o primeiro e controlador princípio, não é uma etapa que se abandona, não é apenas um método correto de pensamento, mas, sim, um relacionamento correto de submissão e adoração a Deus. O temor a Deus é o ponto de partida que produz o verdadeiro entendimento, o sábio proceder (Rm 12.1,2).

Aqui importa ressaltar, como já observado, que o conhecimento e a sabedoria não são a mesma coisa, embora os termos estejam relacionados entre si. Uma pessoa iletrada pode ultrapassar em sabedoria quem tem elevado grau de instrução. O conhecimento é adquirido pelo estudo, mas a sabedoria resulta da compreensão de todos os fatos relevantes a respeito da vida, inclusive as coisas espirituais. E, assim, por meio do entendimento e obediência às Escrituras, os cristãos passam a viver como pessoas sábias (Ef 5.15). Em contraste, os que rejeitam o Senhor e a sua Palavra permanecem na ignorância (Sl 14.1).

4. Os Benefícios da Sabedoria. O salmista declara que o ato de meditar na Palavra de Deus o tornara mais sábio que todos a sua volta (Sl 119.97-100). Essa afirmação significa que ele adquiriu sabedoria ao aplicar os preceitos do Senhor na sua vida. Davi expressa seu profundo amor pela Lei do Senhor, e faz dela a sua meditação diária (Sl 119.97). Como resultado, tornou-se mais sábio do que os inimigos (Sl 119.98); mais entendido que os mestres (Sl 119.99); e mais prudente que os anciãos (Sl 119.100). Ao comentar esse texto, Spurgeon assinala que “ele tinha sido ensinado a observar no coração e na vida os preceitos do Senhor [...] Ele tinha a Palavra dentro de si, e assim superou seus adversários; ele meditava nela, e assim ultrapassou seus amigos; ele a praticava, e assim ofuscou os seus antepassados”.

Salomão assegura que a pessoa sábia tem muitos benefícios: “Se fores sábio, para ti sábio serás; e, se fores escarnecedor, tu só o suportarás” (Pv 9.12). Nesse versículo, destaca-se o conceito da responsabilidade individual. Derek Kidner sublinha que as pessoas recebem benefício ou sofrem por causa do caráter que cada um possui (Pv 10.1). O texto bíblico ressalta que, em última análise, quem ganha ou perde é a própria pessoa. Desse modo, aquele que teme ao Senhor desfruta das benesses da sabedoria, dentre elas, acumula conhecimento para usar na ocasião certa (Pv 10.14); conquista outras almas para também serem sábias (Pv 11.30); em virtude do bom senso, torna-se próspero em todos os seus caminhos (Pv 19.8); e não apenas controla seus impulsos, mas exerce o domínio próprio (Pv 29.11). Em vista disso, a Escritura nos adverte com frequência a empregar esforços na busca da sabedoria (Pv 2.2; 3.21; 4.5,7; 16.16; 23.23).

III – A BÍBLIA E A PRUDÊNCIA PARA A VIDA

1. O Conceito de Prudência. O Dicionário Bíblico Wycliffe informa que o termo hebraico “arum” é usado no sentido positivo para identificar uma pessoa sensata: “a sabedoria do prudente é entender o seu caminho” (Pv 14.8); “o prudente atenta para os seus passos” (Pv 14.15); “os prudentes se coroarão de conhecimento” (Pv 14.18); e “o que observa a repreensão prudentemente se haverá” (Pv 15.5). Porém, a expressão ainda pode ser empregada no mau sentido para identificar alguém sagaz ou astuto: “Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo” (Gn 3.1); “Ele aniquila as imaginações dos astutos [...] Ele apanha os sábios na sua própria astúcia” (Jó 5.12,13); “tu escolheste a língua dos astutos” (Jó 15.5); e “tomaram astuto conselho contra o teu povo” (Sl 83.3, ACF). Destaca igualmente que a expressão hebraica “bin” e o adjetivo grego “synetos” apontam para uma decisão inteligente: “o sábio de coração será chamado prudente” (Pv 16.21); “o procônsul Sérgio Paulo, que era um homem inteligente” (At 13.7, NAA). Desse modo, no aspecto positivo, os textos sinalizam uma conduta não precipitada.

O Dicionário Vine enfatiza que o substantivo grego “phronesis” e suas declinações implica “ter entendimento” e denota “sabedoria prática, prudência na administração dos negócios” (Lc 1.17; Ef 1.8). Já o substantivo “synesis” é traduzido por “inteligência” e sugere “rapidez de apreensão”, a “consideração penetrante que precede a ação” (1 Co 1.19). Essa concepção pode ser vista equitativamente nos tratados da filosofia aristotélica:


O ato prudente considera as circunstâncias, prevê as possíveis consequências, analisa os antecedentes, compara a ação com obras semelhantes, pondera os prós e contras, reprime as paixões que escurecem a razão, delimita os interesses próprios da decisão correta. O exame e a reflexão poderão realizar-se com maior ou menor velocidade dependendo do indivíduo e da magnitude e qualidade da ação.

Tomás de Aquino (1225-1274 d.C) define a prudência como razão reta do agir (latim: recta ratio agibilium). Considera como uma virtude própria da razão prática. Em outras palavras, Aquino ensina que é próprio do homem prudente a capacidade de deliberar bem em vista de certo fim. Em vista disso, em termos gerais, a prudência é a virtude própria da boa escolha que evita ações temerárias. Refere-se à faculdade crítica de avaliar situações e encontrar a maneira adequada de abordagem na busca da melhor solução. Nesse aspecto, com cautela e bom senso, uma pessoa prudente é capaz de discernir e fazer a escolha correta. Contudo, convém esclarecer que biblicamente a prudência está unida estreitamente à sabedoria. E, como já visto, a sabedoria procede de Deus (Ef 1.8,9). Por isso, a prudência é sobretudo uma virtude de quem é sábio, e, portanto, habilitado a realizar as escolhas certas (Dt 30.19; Lc 10.42).

2. A Prudência dos Justos. Esse termo é empregado pelo evangelista Lucas quando descreve o ministério de João Batista. A missão do precursor do Messias é converter o coração “dos pais aos filhos” e os rebeldes à “prudência dos justos” (Lc 1.17). Ao discorrer sobre essa última declaração, Matthew Henry observa que “a verdadeira religião é a sabedoria dos homens justos, diferentemente da sabedoria do mundo. Sermos religiosos é, ao mesmo tempo, a nossa sabedoria e o nosso dever; nisto existe tanto equidade quanto prudência”. Significa que o Evangelho tem como desígnio trazer as pessoas de volta para Deus. E, quando isso acontece, os ignorantes, desobedientes e rebeldes de outrora se tornam sábios, justos e prudentes. Essa sabedoria prática que orienta e corrige o viver diário é o resultado da verdadeira conversão a Cristo. Aqueles que experimentam o novo nascimento desenvolvem o caráter e praticam a boa conduta dos justos.

Nesse sentido, a mensagem da salvação em Cristo não apenas restaura o pecador, mas também o faz andar por veredas de retidão. Salomão assegura que “a vereda dos justos é como a luz da aurora” (Pv 4.18). Hernandes Lopes considera que não se trata apenas de um caminho iluminado, “mas um caminho cuja luz vai crescendo como a luz do sol até ser dia perfeito [...] sua história começa na conversão e avança no processo da santificação, mas seu alvo é a glorificação, o dia perfeito”. O apóstolo Paulo declara que a graça de Deus nos alcança o perdão, e ainda a sabedoria e a prudência (Ef 1.7,8). A sabedoria para compreender a verdade revelada, e a prudência para agir corretamente, segundo a vontade de Deus (Ef 1.9). Essas dádivas são aperfeiçoadas pela oração, leitura das Escrituras e comunhão com o Espírito Santo (1 Ts 5.17; 2 Tm 3.14,15; Ef 5.18).

3. Os Benefícios da Prudência. O livro de Provérbios descreve os propósitos e os benefícios da prudência (Pv 1.1-6). Nessa direção, o preâmbulo articula os objetivos do texto (Pv 1.2-6) e o seu destinatário (Pv 1.4,5). Cada versículo começa com a expressão “para”, com exceção do versículo 5, em que o termo não aparece, mas está implícito. Essa série de frases é um sumário das finalidades dos provérbios de Salomão, a saber: “para se conhecer a sabedoria e a instrução” (Pv 1.2a); “para se entenderem as palavras da prudência” (Pv 1.2b); “para aceitar o comportamento prudente” (Pv 1.3a); “para fazer o que é reto, justo e íntegro” (Pv 1.3b); “para dar perspicácia e discrição” (Pv 1.4); “[para] o sábio aumentar o aprendizado” (Pv 1.5a); “[para] o criterioso adquirir orientação” (Pv 1.5b); e “para entender um provérbio e os ditos dos sábios” (Pv 1.6).

Para alcançar essas metas, o livro apresenta instruções éticas no intuito de moldar o caráter que resulta em benesses para os que escutam e praticam as sábias instruções. Dentre elas, destaca-se: o autocontrole para não revidar ofensas (Pv 12.16). Ao contrário, aquele que não tem a capacidade de controlar as emoções é insensato. Bruce Waltke salienta que “os sábios consideravam essa disposição interna de exasperação uma emoção perigosa: ela mata o insensato (Jó 5.2) e deve ser contida; o sábio não a demonstra”. Outro proveito da prudência é a postura de humildade para não exibir conhecimento (Pv 12.23). Hernandes Lopes avalia que o prudente “não enaltece a si mesmo como um fariseu soberbo nem se compara aos demais apenas para se sobressair. A humildade é o caminho da honra, enquanto a altivez é a autopista da vergonha”.

A prudência, inclusive, favorece na correta tomada de decisões (Pv 13.16). Bruce Waltke comenta que a pessoa prudente se protege por meio de “um conhecimento que inclui ver o perigo de antemão e se refugiar, e que fala com cautela e prudência”. A pessoa prudente, ainda, pensa antes de agir para não ser influenciada (Pv 14.15). Derek Kidner sublinha que o tolo ou o ingênuo “aceita de segunda fonte aquilo que deveria ser averiguado por conta própria [...] agindo de acordo com o estado dos sentimentos, e não com os méritos do caso”. O prudente, também, alcança boa reputação e alta posição (Pv 14.35). Hernandes Lopes anota que “se formos prudentes, ceifaremos favor; se formos indignos, colheremos fúria. O empregado prudente que vive de forma irrepreensível, fala de forma irrefutável e realiza obras inegáveis goza do respeito e do favor de seus superiores”. O prudente, igualmente, sujeita-se ao aprendizado e a correção (Pv 15.5). Todo aquele que atende a repreensão e aceita humildemente a disciplina se comporta com prudência. O caminho da vida não é a rebeldia, mas a obediência. Além disso, a pessoa prudente desvia-se do perigo por meio de soluções cautelosas e antecipadas (Pv 22.3).

Nos Evangelhos, Cristo enfatizou que a pessoa prudente tem a Palavra de Deus como alicerce e regra de vida (Mt 7.24). Nesse ponto, Tasker sublinha que “o homem cuja fé em Cristo é real e sincera poderá sobre esta fé, e o fará, construir o edifício do caráter cristão, que resistirá às tempestades de incompreensão e desapontamento, de cinismo e dúvida, de sofrimento e perseguição, quando ameaçarem destruí-lo”. Ademais, o Senhor ensinou que o servo prudente procede com retidão e cumpre seus deveres com fidelidade (Mt 24.45). Mantém-se ocupado, cumprindo fielmente as suas tarefas, e desse modo se conserva preparado para quando o seu Senhor chegar. Na parábola das dez virgens, Jesus ensina que a pessoa prudente cuida com esmero da sua vida espiritual e mantém acesa a chama do Espírito (Mt 25.4). Myer Pearlman considera que “as virgens prudentes representam aqueles crentes que, reconhecendo possível demora do Noivo, não somente o aguardam pacientemente, como conservam-se diligentemente num estado espiritual apropriado a qualquer chamada repentina”. Em vista disso, a Bíblia nos exorta a viver prudentemente, e não como néscios (Ef 5.15).

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2022, p. 69-79.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário