INTRODUÇÃO
Ler e estudar as Escrituras são um dever e um privilégio. Por isso,
como servos de Deus, temos o compromisso de zelar pelo conhecimento bíblico e
estar conscientes da necessidade de aplicar o texto sagrado em nossas vidas. O
apóstolo Tiago alerta que devemos ser cumpridores da Palavra e não apenas
ouvintes (Tg 1.22). Nesse propósito, a Bíblia Sagrada deve ser lida e
interpretada. No cumprimento dessa tarefa, somos auxiliados pela exegese e pela
hermenêutica. Contudo, nenhuma das técnicas de interpretação está acima da
autoridade da Palavra de Deus. O que a igreja crê e professa deve ser
interpretado à luz da própria Escritura. Neste capítulo, veremos a importância
dos princípios basilares da interpretação bíblica.
I – A BÍBLIA PRECISA SER INTERPRETADA
1. A Importância da Exegese. O termo “exegese” vem do grego
“ex”, traduzido como “fora”, e “agein”, com o sentido de “guiar”. Literalmente,
significa “guiar para fora”, isto é, extrair a intenção das palavras de um
texto. Quando se fala de exegese bíblica, entende-se o termo como explicação e
interpretação de um ou mais textos bíblicos. O exegeta reformado Uwe Wegner
defende que “a exegese quer ajudar a compreender os textos bíblicos, apesar da
distância de tempo e espaço e das diferenças culturais”. Os teólogos pentecostais concordam com essa
assertiva, e acrescentam que o alvo da exegese é deixar que as Escrituras digam
o que o Espírito Santo pretendia no seu contexto original.
Para sustentar o alicerce da interpretação, usa-se a
hermenêutica como metodologia da exegese bíblica. A palavra “hermenêutica”
origina-se do verbo grego “hermeneuein”, cujo significado é igual ao da
exegese, ou seja, “interpretar”. Contudo, deve-se deixar clara a diferenciação
entre um termo e outro. A hermenêutica bíblica designa os princípios que regem
a interpretação dos textos; a exegese descreve as etapas ou os passos que cabe
dar em sua interpretação. Em síntese, a hermenêutica apresenta as regras e a
exegese é a prática dessas regras.
Diante dessas conceituações e com o propósito de
evitar as falácias, interpretação superficial ou equivocada da Bíblia, a
hermenêutica e a exegese apresentam ferramentas que auxiliam na correta
interpretação e aplicação dos textos sagrados. Nesse objetivo, para não fazer o
texto significar aquilo que Deus não pretendeu, é necessário um minucioso exame
das Escrituras (2 Tm 2.15). Por exemplo, o estudo das línguas bíblicas, dos
fatos da história, das questões sociopolíticas, das particularidades da cultura
e dos recursos literários usados no texto sagrado coopera para a compreensão do
real significado das palavras inspiradas (Ef 3.10- 18). Portanto, a exegese não
deve e não pode ser menosprezada durante a leitura e o estudo da Bíblia.
2. As Limitações dos Leitores. Nesse aspecto
é preciso reconhecer que toda a vez que lemos a Bíblia estamos interpretando.
Isso porque todos os leitores são também intérpretes (Dn 9.2). O problema dessa
constatação reside nas ideias que trazemos conosco antes mesmo de começarmos a
leitura da Bíblia (Ef 4.22). O erudito D. A. Carson adverte que “é fácil demais
aplicarmos ao texto bíblico as interpretações tradicionais que recebemos de
terceiros. Então, podemos involuntariamente transferir a autoridade das
Escrituras para as nossas interpretações tradicionais”. Em vista disso, nem
sempre o “entendimento” daquilo que lemos reproduz a verdadeira “intenção” do
Espírito Santo (2 Pe 3.16).
Acerca dessa realidade, Walter Henrichsen anota que
“nas questões de religião o cristão se submete, consciente ou
inconscientemente, a uma das seguintes autoridades, acatando-a como autoridade
última: a tradição, a razão, ou as Escrituras”. Nossa avaliação é que a
tradição não é totalmente um erro, uma vez que muitas práticas da Igreja são
essencialmente bíblicas, porém, o que se deve combater é “a elevação da
tradição a um status igual ou até mesmo superior das Escrituras”. Cristo
advertiu que se tornar prisioneiro da tradição invalida a Palavra de Deus (Mc
7.13).
Quanto ao uso exclusivo da razão na interpretação
bíblica, tal prática constitui-se em verdadeira tragédia para a fé.
Liberalismo, cientismo e modernismo são os termos comumente utilizados para
descrever esse tipo de conduta. Nossa teologia pentecostal afirma que
defensores dessas teorias causam inevitáveis consequências ao Evangelho, tais
como: “incredulidade, leniência para com o pecado; relativismo moral e ético;
relaxo para com a evangelização, etc.”. Desse modo, contrapondo a posição que
coloca a autoridade final de interpretação na “tradição” ou na “razão”, o
pentecostalismo se apresenta como ortodoxo e coloca a Escritura “no lugar em que
ela tem de estar como a nossa suprema e inquestionável árbitra em matéria de fé
e prática. Se a Escritura diz, é a nossa obrigação ser[1]lhe
obediente sem quaisquer questionamentos”.
Com essa percepção, reafirma-se que a Bíblia é o
supremo tribunal de recursos, isto é, a Escritura é a autoridade última em
questões de fé, normas, conduta, percepção e visão de mundo para o autêntico
cristão. No entanto, em virtude de nossa inclinação pecaminosa que nos induz ao
erro (Rm 8.7), precisamos usar métodos sadios que nos auxiliem na interpretação
das Escrituras (Rm 12.2). O teólogo D. A. Carson insiste que “estamos lidando
com os pensamentos de Deus; somos obrigados a nos esforçar o máximo para
entendê-los verdadeiramente e explicá-los com clareza”. 9 Essa é uma nobre
tarefa atribuída a todo salvo em Cristo Jesus (1 Tm 4.13; Ap 1.3).
3. A Natureza das Escrituras. Nesse ponto,
ratificamos que a necessidade de a Bíblia ser interpretada acha-se na natureza
da própria Palavra de Deus. Como já estudado, o texto bíblico foi escrito
majoritariamente em duas línguas distintas (hebraico e grego), no período
aproximado de 1600 anos, por cerca de 40 autores que viveram em épocas e
culturas diferentes. Portanto, os textos canônicos possuem particularidades que
não podem ser ignoradas. Dentre tantas, podemos citar as narrativas, as
poesias, as crônicas, as profecias e as parábolas que precisam ser
interpretadas, sob a orientação do Espírito Santo, observando as regras
gramaticais e o contexto histórico e literário de quando foram redigidas (Mt
5.18).
Em virtude dessas características, no período dos
Pais da Igreja, o desenvolvimento dos princípios da hermenêutica e da exegese
deu-se basicamente em três grandes centros: (a) A Escola de Alexandria,
que era dotada de um espírito conciliatório e tentava harmonizar a doutrina
cristã com a filosofia da época por meio de uma abordagem alegórica; (b) A
Escola de Antioquia, que era caracterizada pela abordagem literal das
Escrituras, na busca pelo sentido primário pretendido pelo autor; e (c) A
Escola Ocidental, que ficou marcada pelo acréscimo de outro elemento, a
saber, a autoridade da tradição e da Igreja na interpretação da Bíblia.
Essa última escola adentrou a Idade Média, e, nessa
época, a interpretação bíblica ficou refém da tradição e dos concílios da
Igreja. Quanto a essa deplorável situação, Hugo de São Vitor (1096- 1141 d.C.)
escreveu o seguinte: “aprende-se primeiro o que deves crer e então vai à Bíblia
para encontrar confirmação”. Nesse contexto, na Alemanha foi deflagrada a
Reforma Protestante (1517 d.C.). E, com a influência da Renascença, se passou a
dar atenção ao conhecimento das línguas originais a fim de entender a Bíblia. A
compreensão histórico-gramatical começou a ser valorizada. Os dois grandes
expoentes são Martinho Lutero e João Calvino. É de Calvino a célebre frase: “O
intérprete deve permitir que o autor diga o que realmente diz, invés de lhe
atribuir o que pensamos que devia dizer”.
II – PRESSUPOSTOS PENTECOSTAIS PARA LER A BÍBLIA
1. Autoridade da Bíblia. Uma das marcas do
Pentecostalismo é o seu compromisso inegociável com as Escrituras. Cremos na
inspiração divina, verbal e plenária da Palavra de Deus, nossa autoridade final
em questões de fé e prática (2 Tm 3.16). Portanto, ao ler o livro sagrado,
temos como pressuposto sua inerrância e infalibilidade. Tudo o que está escrito
é verdadeiro e serve para o nosso ensino (Rm 15.4). Nessa compreensão,
refutamos a relativização, ressignificação e desobediência dos preceitos
bíblicos (Ap 22.19). Acatamos suas doutrinas, reconhecemos a realidade do
sobrenatural, a literalidade dos milagres e a atualidade do batismo no Espírito
Santo e os dons espirituais (At 2.39). Esse entendimento é chancelado pelos
proeminentes teólogos pentecostais William Menzies e Stanley Horton na obra
Doutrinas Bíblicas, na qual lemos:
A origem divina e a autoridade das Escrituras
asseguram-nos ser a Bíblia também infalível, ou seja: incapaz de erro, ou de
orientar de maneira enganosa, ludibriadora ou desapontadora a seus leitores
[...] Tal inerrância e infalibilidade aplicam-se a toda a Palavra de Deus, e
inclui tanto a inerrância das revelações quanto a dos fatos narrados. As
Escrituras revelam-nos a verdade.
Essa percepção pentecostal sinaliza que a autoridade
da Bíblia Sagrada é suprema. O que está escrito deve ser crido e obedecido,
jamais questionado ou relativizado. Com essa premissa, repudiamos o liberalismo
teológico, tais como a teoria de demitização do texto bíblico proposta por
Rudolf Bultmann, para quem “a Bíblia só é crível se dela extirparmos os mitos —
milagres, sinais, teofanias e outras revelações sobrenaturais”. Contestamos o
método hermenêutico proposto por Bultmann de redescobrir o significado oculto
atrás de supostas concepções mitológicas. Nesse diapasão, a teologia
pentecostal ratifica o seu compromisso com a autoridade bíblica. Essa postura
identifica os pentecostais como o povo cuja regra áurea de fé e prática repousa
na autoridade da Bíblia Sagrada.
2. A Iluminação do Espírito Santo. A doutrina
da Iluminação se refere à atuação do Espírito Santo na vida do crente, que o
capacita a discernir as verdades da Palavra de Deus (Ef 1.17,18; 1 Jo 5.20).
Portanto, a iluminação se faz necessária para a compreensão da Bíblia. O ser
humano toma conhecimento da salvação por meio das Escrituras, mas somente o
estudo racional não é suficiente para o entendimento da revelação escrita de
Deus. É imprescindível que haja iluminação do coração e da mente. William
Menzies atesta que o Espírito Santo “nos ilumina a mente para que compreendamos
a Sua Palavra conforme no-la transmitiram os autores sagrados (1Co 2.12; Ef
1.17,18)”.
Entre as operações do Espírito Santo está o ensino e
a iluminação da verdade: “o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos
ensinará todas as coisas” (Jo 14.26); “Ele vos guiará em toda a verdade” (Jo
16.13). Nesse quesito, Lewis Chafer argumenta que esse despertamento pode ser
retardado pelo pecado ou pela imaturidade do crente. Essa realidade explica a
diferença entre o cristão espiritual, que “discerne todas as coisas”, e o
cristão carnal, que não pode receber as verdades mais profundas e vitais (1 Co
2.14-16). Nesse entendimento, Chafer assinala uma tríplice divisão da
humanidade em sua atitude em relação à Palavra de Deus:
(1) O homem natural ou não-regenerado não pode receber
as Escrituras, visto que elas são discernidas pelo Espírito, e o homem natural,
conquanto educado com tudo o que o olho, o ouvido e o poder de raciocínio
possam comunicar, não recebeu o Espírito; portanto, toda a revelação é
“loucura” para ele (1Co 2.14); (2) O homem espiritual está numa posição de
receber toda verdade (não há sugestão de que ele já a alcançou). Ele é habitado
pelo Espírito Santo e todos os ajustes a respeito da sua vida diária são feitos
com a finalidade de que o Espírito Santo não possa ser obstruído em seu
ministério de ensino dentro do seu próprio coração (1Co 2.15); (3) O cristão
carnal demonstra sua carnalidade por sua incapacidade de receber as verdades
mais profundas que são comparados a uma comida sólida em contraste com o leite
(1Co 3.1-3).
Nessa perspectiva, os cristãos na Ásia Menor foram
exortados a ter “iluminados os olhos do entendimento” (Ef 1.18a). Trata-se de
uma operação do Espírito que resulta em “iluminação interior”. Implica ter um
conhecimento mais claro, e, certamente, inclui uma compreensão plena, não
somente clareza intelectual, mas também a clareza espiritual e experimental da
Palavra de Deus. Contudo, a iluminação não é uma fonte paralela de revelação e
nem substitui o exame das Escrituras, ao contrário, pois, à medida que
estudamos, o Espírito nos concede a compreensão. A iluminação não aumenta e nem
altera a Bíblia; apenas elucida o que já foi revelado pelo Espírito. Assim, o
conhecimento da Palavra produz comunhão com Deus, vida de oração, obediência e
santificação (2 Pe 1.3-10).
3. O Valor da Experiência. O valor da
experiência é, por vezes, mal interpretado em alguns círculos evangélicos. Com
frequência, os pentecostais são injustamente acusados de colocar a experiência
acima da autoridade da Palavra de Deus. Porém um dos princípios hermenêuticos
ensina o crente a “interpretar a experiência pessoal à luz da Escritura, e não
a Escritura à luz da experiência pessoal”. Significa que, por mais importante
que seja a experiência pessoal, ela não é a autoridade final de nossa fé. As
experiências precisam do aval das Escrituras para ser validadas. Toda e
qualquer experiência que contraria os preceitos bíblicos deve ser
desconsiderada. Paulo asseverou que, se até um anjo do céu vos anunciar outro
evangelho, tal experiência deve ser rejeitada (Gl 1.8).
De outro lado, a experiência também não pode ser
negligenciada. As doutrinas bíblicas devem ser experimentadas e vividas pelos
crentes em Jesus. Nossa Declaração de Fé faz várias assertivas acerca dessa
necessidade, dentre elas estão: (a) O aceitar Jesus como a experiência da
salvação, quando o Espírito Santo passa a habitar no novo crente (1 Co 3.16);
(b) O batismo nas águas como um testemunho público da experiência anterior, o novo
nascimento, mediante a qual o crente participa espiritualmente da morte e da
ressurreição de Cristo (Cl 2.12); (c) O batismo no Espírito Santo como uma
experiência espiritual que ocorre após ou junto à regeneração, sendo
acompanhada da evidência física inicial do falar em outras línguas (At 2.4).
Nessa compreensão, o texto sagrado é útil para o
ensino, repreensão e correção a fim de tornar o salvo perfeito (2 Tm 3.16,17).
Essas declarações demonstram que a Bíblia deve ser aplicada ao nosso viver
diário. As verdades bíblicas são confirmadas quando experimentadas pela Igreja
do Senhor (Mc 16.20). Nesse aspecto, por exemplo, cremos que o livro de Atos
não apenas descreve a experiência pentecostal da Igreja Primitiva, como também
a torna válida para os nossos dias (At 2.1-4, 38, 39). Ressalta-se, porém, que
a experiência ou a tradição da Igreja não podem estar acima da autoridade
bíblica. Somente a Escritura é que pode autenticar e até mesmo corrigir a
experiência ou a prática da Igreja, caso seja necessário (2 Tm 4.2).
III – REGRAS BÁSICAS DE INTERPRETAÇÃO
1. A Escritura é sua própria Intérprete.
Como já visto, a “hermenêutica” designa os princípios que regem a interpretação
dos textos sagrados. E, conforme observa Gordon Fee, “embora a palavra abranja
o campo inteiro da interpretação, inclusive a exegese, também é usada no
sentido mais estreito de procurar a relevância contemporânea dos textos
antigos”. Nesse propósito, Martinho Lutero (1483-1546 d.C.) desenvolveu a
máxima que a Escritura tem de ser interpretada e entendida por si própria (Is
8.20). Durante a Reforma Protestante, em 15 de junho de 1520, por meio da bula
Exsurge Domine, Lutero foi acusado de interpretar as Escrituras pelo espírito
humano, em oposição à tradição e a interpretação oficial da Igreja Católica.
Em sua defesa, Lutero insistiu que a Bíblia deve ser
interpretada por ela mesma: “Eu não quero ser elogiado por ser mais culto do
que todos, mas por ter somente a Escritura por regra. Também não quero que ela
seja interpretada pelo meu próprio espírito ou por qualquer espírito humano,
mas entendida por si própria e por seu próprio espírito”. Essa afirmação
culminou na máxima “a Escritura é a sua própria intérprete”. No sentido
passivo, a frase indica que as passagens obscuras da Bíblia devem ser lidas à
luz das mais claras. Porém, esse não é o único sentido possível. Em seus
escritos, Lutero falou da Escritura como sujeito ativo, isto é, no engajamento
com a Palavra de Deus, é tarefa do exegeta permitir que o Espírito da Escritura
o ilumine (Sl 119.105).
Desse modo, apesar de a Bíblia possuir uma
heterogênea estrutura literária, dezenas de autores distintos, e aspectos
culturais e históricos diversos, Lutero ensinou que o seu significado “era
claro para quem presta atenção à gramática do texto e à liderança do Espírito”.
Essa propositura, valida o estudo das Escrituras seguindo o método pelo qual
uma parte do texto auxilia na compreensão de outro texto, e assim ilumina o
entendimento do intérprete. Tal afirmação é verdadeira porque a coesão da
Escritura é o resultado de um único autor divino (Pv 30.5,6). Contudo, embora
esse método seja legítimo, o estudante das Escrituras precisa do auxílio de
regras básicas para uma correta interpretação. Esse cuidado é importante para
não incorrer no erro de fazer um texto significar aquilo que Deus nunca
pretendeu.
2. Princípios de Interpretação Bíblica. Nossa
Declaração de Fé assegura que os pentecostais interpretam as Escrituras “sob a
orientação do Espírito Santo, observando as regras gramaticais e o contexto
histórico e literário”. O historiador Isael de Araujo enfatiza que o método
histórico-gramatical vem sendo reafirmado como uma reação ou alternativa em
relação ao método histórico-crítico, que foi intensamente difundido no século
XX:
A interpretação histórica se refere ao contexto em que
os livros da Bíblia foram escritos e às circunstâncias em jogo. A interpretação
gramatical se refere à apuração do sentido dos textos bíblicos mediante estudo
das palavras e das frases em seu sentido normal e claro. Em termos simples e
objetivos, há três estágios para o método: observação (o que diz o texto),
interpretação (o que quer dizer o texto) e aplicação (o que o texto quer dizer
para nós).
Nessa concepção, o artigo em comento destaca que “os
defensores desse método na hermenêutica pentecostal argumentam que a intenção
autoral propagada pelo método histórico-gramatical é testada pelo tempo (desde
os primórdios da igreja com a escola de Antioquia) e ideal para um sadio método
de interpretação bíblica pentecostal”. Em contrapartida, debate-se a construção
da “hermenêutica pentecostal” em solo brasileiro. Essa discussão resultou na
publicação de um manifesto do Conselho de Doutrina e Comissão de Apologética da
CGADB, com os seguintes esclarecimentos:
A Hermenêutica Pentecostal sadia não é uma negação do
método histórico-gramatical. Por outro lado, não é um apego rigoroso e absoluto
a esse método, cujo emprego não conduziu a fé reformada à compreensão e crença
na atualidade da obra do Espírito Santo, tal qual prometida por Jesus e
vivenciada pelos apóstolos e pelas igrejas do Novo Testamento. Conquanto se
valha de ferramentas da erudição bíblica, a Hermenêutica Pentecostal não flerta
com quaisquer das aplicações do método histórico-crítico ou da atual crítica
literária e histórica que negam a plena inspiração das Escrituras e a
literalidade dos milagres.
Concordes com esse posicionamento, dentre os
princípios gramaticais, históricos e literários, enfatizamos que o texto
bíblico tem sentido único e sempre que possível deve ser interpretado
literalmente. Nesse aspecto, é preciso tomar cuidado com as expressões de uso
simbólico/alegórico. Por exemplo, Cristo disse: “Tomai, comei, isto é o meu
corpo” (Mt 26.26). Esse texto mostra que corpo aqui não é no sentido literal,
mas no figurado. Outro princípio refere-se ao contexto, isto é, analisar os
versículos que precedem e seguem o texto que se estuda. Diz a máxima que “texto
fora do contexto é pretexto”. Desse modo, observados esses princípios, a Bíblia
precisa ser interpretada no todo, nenhuma doutrina pode basear-se em único
texto ou em hipóteses particulares (2 Pe 1.20).
3. Os perigos da hermenêutica Pós-Moderna. A denominada hermenêutica pós-moderna nega que existe um sentido absoluto para a verdade bíblica, e, portanto, busca rever ou ressignificar a verdade revelada na Palavra de Deus. Nesse debate, a hermenêutica na perspectiva pentecostal também foi acusada de promover interpretações exclusivamente baseadas na experiência do leitor. Diante disso, as Assembleias de Deus no Brasil se manifestaram nos seguintes termos:
É preciso estabelecer com firmeza com o que não
comungam os pentecostais clássicos em termos de técnicas de interpretação. Isso
é imperativo especialmente diante de métodos hermenêuticos pós-modernos,
focados no leitor e não no autor e no texto, e que emprestam à experiência um
lugar que a ela não cabe no processo interpretativo. Isso não é Hermenêutica
Pentecostal.
Em suma, nossa ortodoxia refuta todo e qualquer
método que nega a inspiração verbal e plenária da Bíblia e sua consequente
autoridade (2 Pe 1.21). Assim sendo, o intérprete não pode criar outro cânon
dentro do cânon bíblico, ou seja, não cabe ao estudante fragmentar ou
relativizar os textos inspirados. Não se pode empregar métodos subjetivos
focados nos anseios do leitor em prejuízo do texto e do autor bíblico.
Ratifica-se que as experiências devem ser submetidas ao crivo das Escrituras
Sagradas (At 17.11). Por fim, as Assembleias de Deus reconhecem que as técnicas
hermenêuticas não são infalíveis. Durante o processo de aplicação dos métodos
interpretativos, o crente necessita da iluminação do Espírito Santo (1 Co
2.12).
Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das
Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de
Janeiro: CPAD, 2022, p. 57-64.
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