sábado, 29 de janeiro de 2022

LIÇÃO 5: COMO LER AS ESCRITURAS

INTRODUÇÃO 

Ler e estudar as Escrituras são um dever e um privilégio. Por isso, como servos de Deus, temos o compromisso de zelar pelo conhecimento bíblico e estar conscientes da necessidade de aplicar o texto sagrado em nossas vidas. O apóstolo Tiago alerta que devemos ser cumpridores da Palavra e não apenas ouvintes (Tg 1.22). Nesse propósito, a Bíblia Sagrada deve ser lida e interpretada. No cumprimento dessa tarefa, somos auxiliados pela exegese e pela hermenêutica. Contudo, nenhuma das técnicas de interpretação está acima da autoridade da Palavra de Deus. O que a igreja crê e professa deve ser interpretado à luz da própria Escritura. Neste capítulo, veremos a importância dos princípios basilares da interpretação bíblica.

I – A BÍBLIA PRECISA SER INTERPRETADA

1. A Importância da Exegese. O termo “exegese” vem do grego “ex”, traduzido como “fora”, e “agein”, com o sentido de “guiar”. Literalmente, significa “guiar para fora”, isto é, extrair a intenção das palavras de um texto. Quando se fala de exegese bíblica, entende-se o termo como explicação e interpretação de um ou mais textos bíblicos. O exegeta reformado Uwe Wegner defende que “a exegese quer ajudar a compreender os textos bíblicos, apesar da distância de tempo e espaço e das diferenças culturais”.  Os teólogos pentecostais concordam com essa assertiva, e acrescentam que o alvo da exegese é deixar que as Escrituras digam o que o Espírito Santo pretendia no seu contexto original.

Para sustentar o alicerce da interpretação, usa-se a hermenêutica como metodologia da exegese bíblica. A palavra “hermenêutica” origina-se do verbo grego “hermeneuein”, cujo significado é igual ao da exegese, ou seja, “interpretar”. Contudo, deve-se deixar clara a diferenciação entre um termo e outro. A hermenêutica bíblica designa os princípios que regem a interpretação dos textos; a exegese descreve as etapas ou os passos que cabe dar em sua interpretação. Em síntese, a hermenêutica apresenta as regras e a exegese é a prática dessas regras.

Diante dessas conceituações e com o propósito de evitar as falácias, interpretação superficial ou equivocada da Bíblia, a hermenêutica e a exegese apresentam ferramentas que auxiliam na correta interpretação e aplicação dos textos sagrados. Nesse objetivo, para não fazer o texto significar aquilo que Deus não pretendeu, é necessário um minucioso exame das Escrituras (2 Tm 2.15). Por exemplo, o estudo das línguas bíblicas, dos fatos da história, das questões sociopolíticas, das particularidades da cultura e dos recursos literários usados no texto sagrado coopera para a compreensão do real significado das palavras inspiradas (Ef 3.10- 18). Portanto, a exegese não deve e não pode ser menosprezada durante a leitura e o estudo da Bíblia.

2. As Limitações dos Leitores. Nesse aspecto é preciso reconhecer que toda a vez que lemos a Bíblia estamos interpretando. Isso porque todos os leitores são também intérpretes (Dn 9.2). O problema dessa constatação reside nas ideias que trazemos conosco antes mesmo de começarmos a leitura da Bíblia (Ef 4.22). O erudito D. A. Carson adverte que “é fácil demais aplicarmos ao texto bíblico as interpretações tradicionais que recebemos de terceiros. Então, podemos involuntariamente transferir a autoridade das Escrituras para as nossas interpretações tradicionais”. Em vista disso, nem sempre o “entendimento” daquilo que lemos reproduz a verdadeira “intenção” do Espírito Santo (2 Pe 3.16).

Acerca dessa realidade, Walter Henrichsen anota que “nas questões de religião o cristão se submete, consciente ou inconscientemente, a uma das seguintes autoridades, acatando-a como autoridade última: a tradição, a razão, ou as Escrituras”. Nossa avaliação é que a tradição não é totalmente um erro, uma vez que muitas práticas da Igreja são essencialmente bíblicas, porém, o que se deve combater é “a elevação da tradição a um status igual ou até mesmo superior das Escrituras”. Cristo advertiu que se tornar prisioneiro da tradição invalida a Palavra de Deus (Mc 7.13).

Quanto ao uso exclusivo da razão na interpretação bíblica, tal prática constitui-se em verdadeira tragédia para a fé. Liberalismo, cientismo e modernismo são os termos comumente utilizados para descrever esse tipo de conduta. Nossa teologia pentecostal afirma que defensores dessas teorias causam inevitáveis consequências ao Evangelho, tais como: “incredulidade, leniência para com o pecado; relativismo moral e ético; relaxo para com a evangelização, etc.”. Desse modo, contrapondo a posição que coloca a autoridade final de interpretação na “tradição” ou na “razão”, o pentecostalismo se apresenta como ortodoxo e coloca a Escritura “no lugar em que ela tem de estar como a nossa suprema e inquestionável árbitra em matéria de fé e prática. Se a Escritura diz, é a nossa obrigação ser[1]lhe obediente sem quaisquer questionamentos”.  

Com essa percepção, reafirma-se que a Bíblia é o supremo tribunal de recursos, isto é, a Escritura é a autoridade última em questões de fé, normas, conduta, percepção e visão de mundo para o autêntico cristão. No entanto, em virtude de nossa inclinação pecaminosa que nos induz ao erro (Rm 8.7), precisamos usar métodos sadios que nos auxiliem na interpretação das Escrituras (Rm 12.2). O teólogo D. A. Carson insiste que “estamos lidando com os pensamentos de Deus; somos obrigados a nos esforçar o máximo para entendê-los verdadeiramente e explicá-los com clareza”. 9 Essa é uma nobre tarefa atribuída a todo salvo em Cristo Jesus (1 Tm 4.13; Ap 1.3).

3. A Natureza das Escrituras. Nesse ponto, ratificamos que a necessidade de a Bíblia ser interpretada acha-se na natureza da própria Palavra de Deus. Como já estudado, o texto bíblico foi escrito majoritariamente em duas línguas distintas (hebraico e grego), no período aproximado de 1600 anos, por cerca de 40 autores que viveram em épocas e culturas diferentes. Portanto, os textos canônicos possuem particularidades que não podem ser ignoradas. Dentre tantas, podemos citar as narrativas, as poesias, as crônicas, as profecias e as parábolas que precisam ser interpretadas, sob a orientação do Espírito Santo, observando as regras gramaticais e o contexto histórico e literário de quando foram redigidas (Mt 5.18).

Em virtude dessas características, no período dos Pais da Igreja, o desenvolvimento dos princípios da hermenêutica e da exegese deu-se basicamente em três grandes centros: (a) A Escola de Alexandria, que era dotada de um espírito conciliatório e tentava harmonizar a doutrina cristã com a filosofia da época por meio de uma abordagem alegórica; (b) A Escola de Antioquia, que era caracterizada pela abordagem literal das Escrituras, na busca pelo sentido primário pretendido pelo autor; e (c) A Escola Ocidental, que ficou marcada pelo acréscimo de outro elemento, a saber, a autoridade da tradição e da Igreja na interpretação da Bíblia.

Essa última escola adentrou a Idade Média, e, nessa época, a interpretação bíblica ficou refém da tradição e dos concílios da Igreja. Quanto a essa deplorável situação, Hugo de São Vitor (1096- 1141 d.C.) escreveu o seguinte: “aprende-se primeiro o que deves crer e então vai à Bíblia para encontrar confirmação”. Nesse contexto, na Alemanha foi deflagrada a Reforma Protestante (1517 d.C.). E, com a influência da Renascença, se passou a dar atenção ao conhecimento das línguas originais a fim de entender a Bíblia. A compreensão histórico-gramatical começou a ser valorizada. Os dois grandes expoentes são Martinho Lutero e João Calvino. É de Calvino a célebre frase: “O intérprete deve permitir que o autor diga o que realmente diz, invés de lhe atribuir o que pensamos que devia dizer”.

II – PRESSUPOSTOS PENTECOSTAIS PARA LER A BÍBLIA

1. Autoridade da Bíblia. Uma das marcas do Pentecostalismo é o seu compromisso inegociável com as Escrituras. Cremos na inspiração divina, verbal e plenária da Palavra de Deus, nossa autoridade final em questões de fé e prática (2 Tm 3.16). Portanto, ao ler o livro sagrado, temos como pressuposto sua inerrância e infalibilidade. Tudo o que está escrito é verdadeiro e serve para o nosso ensino (Rm 15.4). Nessa compreensão, refutamos a relativização, ressignificação e desobediência dos preceitos bíblicos (Ap 22.19). Acatamos suas doutrinas, reconhecemos a realidade do sobrenatural, a literalidade dos milagres e a atualidade do batismo no Espírito Santo e os dons espirituais (At 2.39). Esse entendimento é chancelado pelos proeminentes teólogos pentecostais William Menzies e Stanley Horton na obra Doutrinas Bíblicas, na qual lemos:

A origem divina e a autoridade das Escrituras asseguram-nos ser a Bíblia também infalível, ou seja: incapaz de erro, ou de orientar de maneira enganosa, ludibriadora ou desapontadora a seus leitores [...] Tal inerrância e infalibilidade aplicam-se a toda a Palavra de Deus, e inclui tanto a inerrância das revelações quanto a dos fatos narrados. As Escrituras revelam-nos a verdade.

Essa percepção pentecostal sinaliza que a autoridade da Bíblia Sagrada é suprema. O que está escrito deve ser crido e obedecido, jamais questionado ou relativizado. Com essa premissa, repudiamos o liberalismo teológico, tais como a teoria de demitização do texto bíblico proposta por Rudolf Bultmann, para quem “a Bíblia só é crível se dela extirparmos os mitos — milagres, sinais, teofanias e outras revelações sobrenaturais”. Contestamos o método hermenêutico proposto por Bultmann de redescobrir o significado oculto atrás de supostas concepções mitológicas. Nesse diapasão, a teologia pentecostal ratifica o seu compromisso com a autoridade bíblica. Essa postura identifica os pentecostais como o povo cuja regra áurea de fé e prática repousa na autoridade da Bíblia Sagrada.

2. A Iluminação do Espírito Santo. A doutrina da Iluminação se refere à atuação do Espírito Santo na vida do crente, que o capacita a discernir as verdades da Palavra de Deus (Ef 1.17,18; 1 Jo 5.20). Portanto, a iluminação se faz necessária para a compreensão da Bíblia. O ser humano toma conhecimento da salvação por meio das Escrituras, mas somente o estudo racional não é suficiente para o entendimento da revelação escrita de Deus. É imprescindível que haja iluminação do coração e da mente. William Menzies atesta que o Espírito Santo “nos ilumina a mente para que compreendamos a Sua Palavra conforme no-la transmitiram os autores sagrados (1Co 2.12; Ef 1.17,18)”.

Entre as operações do Espírito Santo está o ensino e a iluminação da verdade: “o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas” (Jo 14.26); “Ele vos guiará em toda a verdade” (Jo 16.13). Nesse quesito, Lewis Chafer argumenta que esse despertamento pode ser retardado pelo pecado ou pela imaturidade do crente. Essa realidade explica a diferença entre o cristão espiritual, que “discerne todas as coisas”, e o cristão carnal, que não pode receber as verdades mais profundas e vitais (1 Co 2.14-16). Nesse entendimento, Chafer assinala uma tríplice divisão da humanidade em sua atitude em relação à Palavra de Deus:

(1) O homem natural ou não-regenerado não pode receber as Escrituras, visto que elas são discernidas pelo Espírito, e o homem natural, conquanto educado com tudo o que o olho, o ouvido e o poder de raciocínio possam comunicar, não recebeu o Espírito; portanto, toda a revelação é “loucura” para ele (1Co 2.14); (2) O homem espiritual está numa posição de receber toda verdade (não há sugestão de que ele já a alcançou). Ele é habitado pelo Espírito Santo e todos os ajustes a respeito da sua vida diária são feitos com a finalidade de que o Espírito Santo não possa ser obstruído em seu ministério de ensino dentro do seu próprio coração (1Co 2.15); (3) O cristão carnal demonstra sua carnalidade por sua incapacidade de receber as verdades mais profundas que são comparados a uma comida sólida em contraste com o leite (1Co 3.1-3).

Nessa perspectiva, os cristãos na Ásia Menor foram exortados a ter “iluminados os olhos do entendimento” (Ef 1.18a). Trata-se de uma operação do Espírito que resulta em “iluminação interior”. Implica ter um conhecimento mais claro, e, certamente, inclui uma compreensão plena, não somente clareza intelectual, mas também a clareza espiritual e experimental da Palavra de Deus. Contudo, a iluminação não é uma fonte paralela de revelação e nem substitui o exame das Escrituras, ao contrário, pois, à medida que estudamos, o Espírito nos concede a compreensão. A iluminação não aumenta e nem altera a Bíblia; apenas elucida o que já foi revelado pelo Espírito. Assim, o conhecimento da Palavra produz comunhão com Deus, vida de oração, obediência e santificação (2 Pe 1.3-10).

3. O Valor da Experiência. O valor da experiência é, por vezes, mal interpretado em alguns círculos evangélicos. Com frequência, os pentecostais são injustamente acusados de colocar a experiência acima da autoridade da Palavra de Deus. Porém um dos princípios hermenêuticos ensina o crente a “interpretar a experiência pessoal à luz da Escritura, e não a Escritura à luz da experiência pessoal”. Significa que, por mais importante que seja a experiência pessoal, ela não é a autoridade final de nossa fé. As experiências precisam do aval das Escrituras para ser validadas. Toda e qualquer experiência que contraria os preceitos bíblicos deve ser desconsiderada. Paulo asseverou que, se até um anjo do céu vos anunciar outro evangelho, tal experiência deve ser rejeitada (Gl 1.8).

De outro lado, a experiência também não pode ser negligenciada. As doutrinas bíblicas devem ser experimentadas e vividas pelos crentes em Jesus. Nossa Declaração de Fé faz várias assertivas acerca dessa necessidade, dentre elas estão: (a) O aceitar Jesus como a experiência da salvação, quando o Espírito Santo passa a habitar no novo crente (1 Co 3.16); (b) O batismo nas águas como um testemunho público da experiência anterior, o novo nascimento, mediante a qual o crente participa espiritualmente da morte e da ressurreição de Cristo (Cl 2.12); (c) O batismo no Espírito Santo como uma experiência espiritual que ocorre após ou junto à regeneração, sendo acompanhada da evidência física inicial do falar em outras línguas (At 2.4).

Nessa compreensão, o texto sagrado é útil para o ensino, repreensão e correção a fim de tornar o salvo perfeito (2 Tm 3.16,17). Essas declarações demonstram que a Bíblia deve ser aplicada ao nosso viver diário. As verdades bíblicas são confirmadas quando experimentadas pela Igreja do Senhor (Mc 16.20). Nesse aspecto, por exemplo, cremos que o livro de Atos não apenas descreve a experiência pentecostal da Igreja Primitiva, como também a torna válida para os nossos dias (At 2.1-4, 38, 39). Ressalta-se, porém, que a experiência ou a tradição da Igreja não podem estar acima da autoridade bíblica. Somente a Escritura é que pode autenticar e até mesmo corrigir a experiência ou a prática da Igreja, caso seja necessário (2 Tm 4.2).

III – REGRAS BÁSICAS DE INTERPRETAÇÃO

1. A Escritura é sua própria Intérprete. Como já visto, a “hermenêutica” designa os princípios que regem a interpretação dos textos sagrados. E, conforme observa Gordon Fee, “embora a palavra abranja o campo inteiro da interpretação, inclusive a exegese, também é usada no sentido mais estreito de procurar a relevância contemporânea dos textos antigos”. Nesse propósito, Martinho Lutero (1483-1546 d.C.) desenvolveu a máxima que a Escritura tem de ser interpretada e entendida por si própria (Is 8.20). Durante a Reforma Protestante, em 15 de junho de 1520, por meio da bula Exsurge Domine, Lutero foi acusado de interpretar as Escrituras pelo espírito humano, em oposição à tradição e a interpretação oficial da Igreja Católica.

Em sua defesa, Lutero insistiu que a Bíblia deve ser interpretada por ela mesma: “Eu não quero ser elogiado por ser mais culto do que todos, mas por ter somente a Escritura por regra. Também não quero que ela seja interpretada pelo meu próprio espírito ou por qualquer espírito humano, mas entendida por si própria e por seu próprio espírito”. Essa afirmação culminou na máxima “a Escritura é a sua própria intérprete”. No sentido passivo, a frase indica que as passagens obscuras da Bíblia devem ser lidas à luz das mais claras. Porém, esse não é o único sentido possível. Em seus escritos, Lutero falou da Escritura como sujeito ativo, isto é, no engajamento com a Palavra de Deus, é tarefa do exegeta permitir que o Espírito da Escritura o ilumine (Sl 119.105).

Desse modo, apesar de a Bíblia possuir uma heterogênea estrutura literária, dezenas de autores distintos, e aspectos culturais e históricos diversos, Lutero ensinou que o seu significado “era claro para quem presta atenção à gramática do texto e à liderança do Espírito”. Essa propositura, valida o estudo das Escrituras seguindo o método pelo qual uma parte do texto auxilia na compreensão de outro texto, e assim ilumina o entendimento do intérprete. Tal afirmação é verdadeira porque a coesão da Escritura é o resultado de um único autor divino (Pv 30.5,6). Contudo, embora esse método seja legítimo, o estudante das Escrituras precisa do auxílio de regras básicas para uma correta interpretação. Esse cuidado é importante para não incorrer no erro de fazer um texto significar aquilo que Deus nunca pretendeu.

2. Princípios de Interpretação Bíblica. Nossa Declaração de Fé assegura que os pentecostais interpretam as Escrituras “sob a orientação do Espírito Santo, observando as regras gramaticais e o contexto histórico e literário”. O historiador Isael de Araujo enfatiza que o método histórico-gramatical vem sendo reafirmado como uma reação ou alternativa em relação ao método histórico-crítico, que foi intensamente difundido no século XX:

A interpretação histórica se refere ao contexto em que os livros da Bíblia foram escritos e às circunstâncias em jogo. A interpretação gramatical se refere à apuração do sentido dos textos bíblicos mediante estudo das palavras e das frases em seu sentido normal e claro. Em termos simples e objetivos, há três estágios para o método: observação (o que diz o texto), interpretação (o que quer dizer o texto) e aplicação (o que o texto quer dizer para nós).

Nessa concepção, o artigo em comento destaca que “os defensores desse método na hermenêutica pentecostal argumentam que a intenção autoral propagada pelo método histórico-gramatical é testada pelo tempo (desde os primórdios da igreja com a escola de Antioquia) e ideal para um sadio método de interpretação bíblica pentecostal”. Em contrapartida, debate-se a construção da “hermenêutica pentecostal” em solo brasileiro. Essa discussão resultou na publicação de um manifesto do Conselho de Doutrina e Comissão de Apologética da CGADB, com os seguintes esclarecimentos:

A Hermenêutica Pentecostal sadia não é uma negação do método histórico-gramatical. Por outro lado, não é um apego rigoroso e absoluto a esse método, cujo emprego não conduziu a fé reformada à compreensão e crença na atualidade da obra do Espírito Santo, tal qual prometida por Jesus e vivenciada pelos apóstolos e pelas igrejas do Novo Testamento. Conquanto se valha de ferramentas da erudição bíblica, a Hermenêutica Pentecostal não flerta com quaisquer das aplicações do método histórico-crítico ou da atual crítica literária e histórica que negam a plena inspiração das Escrituras e a literalidade dos milagres.

Concordes com esse posicionamento, dentre os princípios gramaticais, históricos e literários, enfatizamos que o texto bíblico tem sentido único e sempre que possível deve ser interpretado literalmente. Nesse aspecto, é preciso tomar cuidado com as expressões de uso simbólico/alegórico. Por exemplo, Cristo disse: “Tomai, comei, isto é o meu corpo” (Mt 26.26). Esse texto mostra que corpo aqui não é no sentido literal, mas no figurado. Outro princípio refere-se ao contexto, isto é, analisar os versículos que precedem e seguem o texto que se estuda. Diz a máxima que “texto fora do contexto é pretexto”. Desse modo, observados esses princípios, a Bíblia precisa ser interpretada no todo, nenhuma doutrina pode basear-se em único texto ou em hipóteses particulares (2 Pe 1.20).

3. Os perigos da hermenêutica Pós-Moderna. A denominada hermenêutica pós-moderna nega que existe um sentido absoluto para a verdade bíblica, e, portanto, busca rever ou ressignificar a verdade revelada na Palavra de Deus. Nesse debate, a hermenêutica na perspectiva pentecostal também foi acusada de promover interpretações exclusivamente baseadas na experiência do leitor. Diante disso, as Assembleias de Deus no Brasil se manifestaram nos seguintes termos:

É preciso estabelecer com firmeza com o que não comungam os pentecostais clássicos em termos de técnicas de interpretação. Isso é imperativo especialmente diante de métodos hermenêuticos pós-modernos, focados no leitor e não no autor e no texto, e que emprestam à experiência um lugar que a ela não cabe no processo interpretativo. Isso não é Hermenêutica Pentecostal.

Em suma, nossa ortodoxia refuta todo e qualquer método que nega a inspiração verbal e plenária da Bíblia e sua consequente autoridade (2 Pe 1.21). Assim sendo, o intérprete não pode criar outro cânon dentro do cânon bíblico, ou seja, não cabe ao estudante fragmentar ou relativizar os textos inspirados. Não se pode empregar métodos subjetivos focados nos anseios do leitor em prejuízo do texto e do autor bíblico. Ratifica-se que as experiências devem ser submetidas ao crivo das Escrituras Sagradas (At 17.11). Por fim, as Assembleias de Deus reconhecem que as técnicas hermenêuticas não são infalíveis. Durante o processo de aplicação dos métodos interpretativos, o crente necessita da iluminação do Espírito Santo (1 Co 2.12).

Fonte: BAPTISTA, Douglas. A supremacia das Escrituras: a inspirada, inerrante e infalível palavra de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2022, p. 57-64.

 




 

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