sábado, 16 de abril de 2016

LIÇÃO 3: JUSTIFICAÇÃO, SOMENTE PELA FÉ EM JESUS CRISTO





SUBSÍDIO I

Justificação, somente pela fé em Jesus Cristo

Para explicar a doutrina da Justificação pela Fé, o apóstolo Paulo usa dois tipos de linguagem na carta: a do judiciário e a do sistema de sacrifício levítico. Como o apóstolo pretende convencer o seu público leitor, os judeus, bem como os gentios, de que mais do que observar o sistema de Lei como requisito para a salvação, Deus havia manifestado a sua graça justificadora lá no tempo da Antiga Aliança por intermédio do pai da fé, Abraão, o apóstolo afirma com todas as letras: “Portanto, é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé de Abraão, o qual é pai de todos nós. [...] Pelo que isso lhe foi também imputado como justiça” (Rm 4.16,22). Dessa forma, o apóstolo argumentava ao judeu de que, mesmo o gentio não tendo a Lei, a condição do gentio em relação a Deus em nada é inferior ao do judeu. Em Jesus, pela fé mediante a Graça de Deus, o gentio é filho de Abraão por intermédio da fé, que é pai tanto do judeu quanto do gentio achado por Deus (Rm 4.9-13).

A linguagem judiciária da Justificação

Ser justificado por Deus é ser inocentado por Ele mesmo da condição de culpado pelos atos. Ou seja, o indivíduo não tem quaisquer condições de se auto- declarar inocente ou de aliviar a sua consciência, pois sabe que nada poderá apagar a sua culpa. Por isso, Deus, em Cristo, na cruz do Calvário, nos reconciliou para sempre (2Co 5.19). De modo que o apóstolo Paulo ratifica esse milagre: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus” (Ef 2.8).

A linguagem sacrifical da Justificação

Trocar o culpado pelo inocente. O sangue de Jesus Cristo foi derramado no lugar do sangue da humanidade. Foi a substituição vicária de Cristo Jesus por nós. Éramos culpados, mas Cristo se tornou culpado por nós; éramos malditos, Cristo se tornou maldito por nós; éramos dignos de morte, Cristo morreu em nosso lugar e por nós (Rm 3.25).
A linguagem judiciária e sacrifical da justificação nos mostra um Deus amoroso e misericordioso, que não faz acepção de pessoas e que deixa clara a real condição do ser humano, seja ele judeu ou gentio: somos todos carentes da graça e da misericórdia do Pai.

Fonte: Revista Ensinador Cristão, Ano 17 - nº 66 – abr/mai/jun de 2016. 

SUBSÍDIO II

INTRODUÇÃO

Na lição de hoje, estudaremos os princípios da justiça de Deus face às atitudes moralistas humanas na tentativa de buscar se justificar diante de Deus. No início trataremos a respeito da questão do moralismo religioso, nos tempos de Jesus, de Paulo e nos dias atuais. Em seguida, abordaremos a justificação divina por meio da fé em Jesus Cristo. Ao final, mostraremos como a justificação, por meio da fé, é ilustrada através de Abraão.

1. OS MORALISTAS

Moralistas são pessoas, geralmente religiosas, que se utilizam de determinados princípios e regras como forma de determinar o que seja certo e/ou errado. No cristianismo, não são os preceitos morais que garantem à aceitação do homem perante Deus, mas o fato de sermos justificados por Cristo. Ao longo da história da humanidade, vemos que os seres humanos sempre quiseram ser aceitos pelos deuses através dos seus méritos próprios, na medida em que, também, impunham, sobre os outros, normas. Em Cl. 2.21-23, Paulo denomina tais atitudes como preceitos e doutrinas de homens que não passam de carnalidade.
Nos dias de Jesus - nos tempos de Jesus os maiores representantes do moralismo eram os fariseus. Os fariseus eram um grupo de leigos dedicados e empenhados na mais rigorosa interpretação e manutenção da lei mosaica e da tradição oral. Jesus os repreende por sua hipocrisia, pois eles, como disse o Mestre: “Pois atam fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens; eles, porém, nem com o dedo querem movê-los” (Mt. 23.4). O Senhor se opôs aos fariseus porque eles vangloriavam-se em sua própria santidade, devoção a Deus e estudo da lei. Em Lc. 18.10, Jesus nos dá uma lição sobre à questão da justificação, dando, como exemplo, um fariseu e um publicano. Na conclusão, o Senhor acentua: “Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado” (v. 14).
Nos dias de Paulo - nos dias de Paulo a igreja teve de enfrentar o problema do moralismo, ou melhor dizendo, do legalismo. No capítulo 15 de Atos, Lucas narra o concílio eclesiástico com o objetivo de responder à seguinte pergunta: “Agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais nem nós pudemos suportar?” (At. 15.10). Os judaizantes tentavam, a todo custo, ir de encontro à doutrina da justiça de Deus, defendendo que os cristãos deveriam seguir uma séries de princípios a fim de realmente ser salvos. Em sua carta aos Romanos e aos Gálatas Paulo se opõem veementemente à esse moralismo mostrando que “que o homem é justificado pela fé sem as obras da lei” (Rm. 3.28), sabendo que “o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Jesus Cristo, para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pelas obras da lei; porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada” (Gl. 2.16).
Nos dias atuais - Nos dias atuais há um movimento moralista, porque não dizer legalista, nas igrejas locais tentando resgatar os princípios farisaicos judaizantes. Essas pessoas defendem que para sermos salvos precisamos guardar uma série de preceitos e de regras as quais nos farão ser aceitos diante de Deus. Essas regras nada têm de respaldo bíblico, ao contrário, invalidam, pela tradição dos homens, a doutrina de Deus (Mt. 15.6). Os defensores dessas tradições humanas são, na verdade, “inimigos da cruz de Cristo” (Fp. 3.18), haja visto que se arvoram na sua própria conduta, por considerarem ter atingindo um estágio de santidade superior aos outros. Deus, porém, se nega a dar crédito à esse moralismo legalista, pois, no Seu evangelho cristalino está escrito que “pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Ef. 2.8,9).


2. PRINCÍPIOS DA JUSTIÇA DE DEUS

Inicialmente destacamos que o juízo de Deus é inevitável - Em Rm. 2.1-4, Paulo mostra a fraqueza humana de tentar criticar todo mundo, à exceção de nós mesmos. Trata-se de uma atitude de autojustificação que visa ocultar nosso pecado e nossa autoestima. O problema é que, como ressalta a Palavra de Deus: “porque te condenas a ti mesmo naquilo em que julgas a outro; pois tu, que julgas, fazes o mesmo” . É, nesse sentido, inútil tentar escapar do juízo inevitável, através de discursos moralistas, o melhor, como bem adverte o apóstolo, é nos fiar nas “riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade”. Por que é a bondade de Deus que nos leva ao arrependimento. Em seguida, que o juízo de Deus é justo - nós, porém, não podemos contar com a bondade e a paciência de Deus para dar vazão à permissividade e não ao arrependimento. Afinal, caso não nos voltemos para Deus, em contrição: “segundo a tua dureza e teu coração impenitente, entesouras ira para ti no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus”. A partir do versículo 7 vemos que o juízo de Deus será baseado naquilo que nós fizemos, ressaltando a existência de dois paralelos: 1) por um lado existem aqueles que buscam glória (a manifestação do próprio Deus), honra (a aprovação de Deus) e imortalidade (a infinita alegria de sua presença) e, além disso, buscam tais bênçãos, cujo foco central é o próprio Deus, persistindo em fazer o bem; 2) por outro lado, existem aqueles que têm orgulho de si mesmos, os egoístas, que rejeitam a verdade e seguem a injustiça e “suprimem a verdade pela injustiça”. Posteriormente, que o  juízo de Deus é imparcial - Judeus e gentios parecem diferir um do outro no fato de que os judeus ouvem a lei, possuindo-a e ouvindo a sua leitura na sinagoga, quanto que os gentios não têm lei. Contudo, vemos, no versículo 12, que tanto um quanto o outro são postos na mesma categoria de pecado e morte. O argumento do apóstolo é que todos os que pecaram perecerão ou serão julgados, isto é, quer tenham a lei mosaica quer não. Todos os que pecarão sem lei (os gentios), sem lei perecerão. Perecerão em virtude do seu pecado, não por ignorarem a lei. Do mesmo modo, todo aquele que pecar sob a lei (os judeus), pela lei será julgado. Deus será absolutamente justo em seu julgamento: se pecou conhecendo a lei, ou se pecou ignorando a lei, o julgamento será de acordo com o pecado de cada um. E por fim, que o juízo de Deus e a lei de Deus - a lei natural não salva pecadores, pois, por mais que tenhamos conhecimento de Deus através da criação ou de sua bondade através da consciência, nós o suprimimos a fim de seguirmos o caminho que nós mesmos escolhemos. Por isso, Deus revelou, nas Escrituras, que existe uma realidade antagônica entre a lei encontrada nas Escrituras e a lei da natureza humana. Paulo vai dizer mais adiante que “a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom” (Rm. 7.12). O problema é que, há, no homem, uma lei carnal que se opõe à lei: “Acho então esta lei em mim, que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo”.

3. A JUSTIÇA DE DEUS

Em Rm. 3.21, Paulo fala de uma justiça que provem de Deus que se dá a conhecer pelo evangelho (1.17) ou independente da lei (3.21). Uma verdade fundamental demonstrada pelo apóstolo é que a justiça de Deus vem mediante a fé em Jesus Cristo para todos haja visto que todos têm necessidade dela, pois todos pecaram. Essa justificação que provem de Deus é uma combinação de três elementos: o caráter justo de Deus, a sua iniciativa salvadora e a sua dádiva que consiste em conferir ao pecador a condição de justo perante ele. A fonte da justificação é Deus e sua graça, a base é Cristo e sua cruz e o meio da justificação é a fé. Paulo responde a alguns questionamentos, por meio do recurso da diatribe:  “Onde está então o motivo de vanglória”? (27-28) - a vanglória não é uma prerrogativa dos judeus, pois os gentios também eram “insolentes, arrogantes e presunçosos (v. 30). Para aqueles que foram justificados, a vanglória – que é presunção do egocentrismo caído – é completamente excluída e isso não se baseia no princípio da obediência à lei, mas no princípio da fé: “Onde está logo a jactância? É excluída. Por qual lei? Das obras? Não; mas pela lei da fé”. “Deus é Deus apenas dos judeus? Ele não é também Deus dos gentios?”(29-30) - Deus não é apenas Deus dos judeus, Ele é também Deus dos gentios, visto que existe somente um Deus, que tem um só caminho de salvação (ver Jo. 14.6). Ele, pela fé, justificará, tanto os circuncisos quanto os incircuncisos. Como disse certo pensador, aos pés da cruz de Cristo, e pela fé nele, todos nós estamos no mesmo nível: somos irmãos e irmãs em Cristo.
“Anulamos então a lei pela fé”? (31) - Paulo nega essa questão, pois todo o Antigo Testamento já ensinava a verdade da justificação pela fé (ver Gn. 3.21; 15.6; Ex. 12.1-23). A lei, nesse sentido, confirma e não anula a lei. A fé confirma a lei ao conferir-lhe o devido lugar no propósito de Deus – no seu plano de salvação, a função da lei é expor e condenar o pecado, mantendo o pecador trancafiado em sua culpa até que Cristo venha liberta-lo através da fé. Por conseguinte, os crentes justiçados que vivem de acordo com o Espírito satisfazem as justas exigências da lei (ver Rm. 8.4; 13.8,10). Em seguida, ilustra por meio de Abraão, a justificação por meio da fé. Isso porque esse patriarca, de todos os justos do Antigo Testamento, é aquele que Deus o chama de amigo (Is. 41.8). O testemunho de Deus a respeito de Abraão se encontra em Gn. 26.5: “Porquanto Abraão obedeceu à minha voz, e guardou o meu mandado, os meus preceitos, os meus estatutos, e as minhas leis”. De fato, Abraão obedeceu a Deus e guardou seus preceitos, mas a sua justificação se deu através da fé, conforme lemos em Gn. 15.6: “E creu ele no Senhor, e imputou-lhe isto por justiça”. Outro princípio da justificação pela fé no Antigo Testamento é o de Davi. Paulo cita as palavras iniciais do Salmo 32: “Bem-aventurado aquele cuja transgressão é perdoada, e cujo pecado é coberto Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não imputa maldade, e em cujo espírito não há engano”. Mas Abraão é o pai de todos os que creem em Deus e levam a sério Sua palavra. É o pai dos crentes incircuncisos, pois ele era incircunciso quando sua fé lhe foi imputada para justiça. É também o pai dos crentes circuncisos, não tanto com base na circuncisão deles, mas em sua fé. A justificação de Abraão e as bênçãos dela decorrente fundamentavam-se em sua fé em Deus. Não foram adquiridas por mérito ou esforço da parte dele, mas, sim, dadas pela graça de Deus. Esse continua sendo o princípio sobre o qual Deus trata os descendentes de Abraão. Nisso se cumpre a palavra de Deus: “porque por pai de muitas nações te tenho posto” (Gn. 17.5). A fé de Abraão teve uma qualidade especial, pois ele não fechou os olhos as circunstâncias desfavoráveis. Antes pôs sua visão no Deus capaz de cumprir Sua promessa. Esse princípio se aplica a todos os crentes, tendo em vista que o Deus que ressuscitou a Jesus dos mortos, o fez para proporcionar a justificação daqueles que nEle creem.

CONCLUSÃO

O juízo de Deus é justo, inevitável e imparcial. A lei de Deus, revelada aos judeus, ou os gentios, que se fizeram lei para si, estão todos debaixo da condenação do pecado. Os moralistas tentam se justificar diante de Deus através dos seus próprios méritos achando que serão salvos por guardarem uma série de princípios religiosos. A saída dada por Deus é que: “Deus propôs para propiciação pela fé no seu [e Jesus] sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus; Para demonstração da sua justiça neste tempo presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus (Rm.3.25,26).

Prof. Ev. José Roberto A. Barbosa
Extraído do Blog subsidioebd

COMENTÁRIO E SUBSÍDIO III

INTRODUÇÃO

Na lição de hoje, estudaremos a doutrina bíblica da justificação pela fé, conforme a Carta aos Romanos nos capítulos 3.1- 4.25. Esses textos contêm uma das mais contundentes defesas de Paulo em favor da justificação pela fé, independente das obras. Para uma melhor compreensão deste tema tão relevante, a argumentação do apóstolo será dividida em três partes: a justificação manifestada, a justificação contestada e a justificação exemplificada. A chamada de Abraão, o grande patriarca de Israel, será a base da argumentação de Paulo para provar a doutrina da justificação somente pela fé. O argumento de Paulo é que todas as bênçãos de Deus e todas as suas promessas são frutos da sua graça para conosco. [Comentário: No Calvário, a justiça de Deus chega ao seu cumprimento histórico, através de Cristo e sua missão redentora. Já vimos na lição anterior que a justificação pela fé foi um dos pilares da Reforma Protestante. Também vimos que a salvação é pela graça mediante a fé e não o resultado das obras nem mesmo da adição de fé mais obras. Assim sendo, a salvação não é uma conquista do homem, mas um presente de Deus. Não é uma medalha de honra ao mérito, mas uma manifestação do favor imerecido de Deus. Martinho Lutero disse: “Esta doutrina é a cabeça e a pedra fundamental. Por si só, ela gera, alimenta, edifica, preserva e defende a igreja de Deus. E sem ela, a igreja de Deus não poderia existir nem por uma única hora”. Martin Lloyd-Jones afirmou que a justificação pela fé “é a grande doutrina central de todo protestantismo, e vocês descobrirão que em cada avivamento ela sempre vem na vanguarda”. A igreja cai ou permanece de pé por causa desta doutrina. Ela é a espinha dorsal de todas as doutrinas bíblicas. John Piper diz: “Pregar e viver a justificação pela fé glorifica a Cristo, resgata pecadores desesperados, encoraja santos imperfeitos e fortalece igrejas frágeis”.]

I. A JUSTIFICAÇÃO MANIFESTADA

1. Um culpado que é inocentado. Em Romanos 3.21, lemos: “Mas, agora, se manifestou, sem a lei, a justiça de Deus, tendo o testemunho da Lei e dos Profetas”. Paulo nos mostra como Deus se revelou para alcançar os gentios e judeus. Os gentios estavam debaixo da ira de Deus, porque falharam em conhecê-lo. Os judeus também estavam debaixo da ira divina, por não conseguirem guardar a Palavra do Senhor. O vocábulo manifestou, no grego, vem de uma raiz cujo significado é tornar manifesto ou visível ou conhecido o que estava escondido ou era desconhecido. Deus, na pessoa de Jesus Cristo, tornou conhecido o seu grande amor para com os pecadores. Encontramos Paulo recorrendo a uma figura extraída do mundo jurídico para esclarecer o seu pensamento. O termo justiça traduz a palavra grega dikaiosyne, muito comum no contexto de um tribunal. A imagem é de alguém que é inocentado por um juiz, mesmo sendo culpado pelos seus atos. Concluímos então que, mesmo culpados, Deus quis nos justificar e perdoar. [Comentário: A justificação é um ato legal, forense e judicial de Deus. É feita no tribunal de Deus e não em nosso coração. É um ato jurídico ou uma sentença divina na qual Ele declara perdoado todo pecador que crer em Jesus. Louis Berkhof define: “A justificação é um ato judicial de Deus no qual Ele declara, baseado na justiça de Jesus Cristo, que todas as exigências da lei estão satisfeitas com respeito ao pecador”. A justificação é o contrário de condenação. Ela é um ato único e legal que remove a culpa do pecado e restaura o pecador à sua condição de filho de Deus, com todos os seus direitos, privilégios e deveres. A justificação não ocorre na vida do pecador, não produz mudanças no seu caráter, mas no Tribunal de Deus. Justificação é uma declaração e santificação é transformação. Mas, é a partir da justificação que o Espírito Santo inicia no pecador todo o processo de santificação até a sua glorificação.]

2. Um prisioneiro que é libertado. Em Romanos 3.24, Paulo usa o verbo grego apolytroseo para se referir à redenção efetuada por Jesus Cristo. Essa palavra, conforme definem os léxicos da língua grega, tem o sentido de redenção, resgate ou libertação. No contexto neotestamentário tem o sentido de libertar mediante o preço de um resgate. No mundo antigo um escravo podia ser resgatado mediante o pagamento de um preço. É exatamente isso que Deus fez. Enviou Jesus Cristo para resgatar o homem que estava preso em seus delitos e pecados (Ef 2.1,2). Tanto judeus como gentios deveriam se conscientizar dessa realidade. Ninguém pode se autolibertar. [Comentário: Como uma pessoa pode se tornar aceitável diante de Deus? A resposta está clara no Novo Testamento, especialmente nos escritos de Paulo, como a passagem clássica de Romanos 3.21-25. Nas Escrituras, a justificação é o contrário da condenação. É a declaração que diz que o pecador que crê é justo, e isso devido à retidão imputada de Cristo, o “dom da justiça”, conforme lemos em 5.17. Agora a justiça de Cristo é legalmente considerada como possessão do pecador crente. Todos os homens são pecadores e necessitam do perdão de Deus. A justiça de Deus é para todos e sobre todos, judeus e gentios, porque todos erraram o alvo, deixando de ser conforme o propósito de Deus. Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus (Rm 3.23). Infelizmente, a palavra portuguesa “justificação”, originária do latim, dá a ideia de “tornar justo”, no sentido de produzir justiça no justificado. Mas o termo grego original dikaiosyne não se refere a uma mudança intrínseca no indivíduo, e sim a uma declaração feita por Deus. Visto que não temos justiça própria e somos culpados diante de Deus, ele nos declara justos com base na expiação de nossos pecados por Cristo e na sua justiça imputada a nós.]

3. Um inocente que é culpado. Se o sistema judicial foi útil para elucidar o pensamento do apóstolo, da mesma forma a figura extraída do sistema de sacrifícios levítico também o auxiliou. Isso pode ser visto no texto: “Ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus” (Rm 3.25). A palavra propiciação (gr. hülasterion), que está relacionada ao termo propiciatório é uma terminologia muito utilizada no Antigo Testamento para se referir aos sacrifícios pelo pecado. No sistema levítico, quando alguém pecava tornava-se culpado de algo, e um animal inocente era sacrificado para que a culpa fosse expiada. Paulo mostra que tanto os gentios como os judeus não podem chegar a Deus pelos seus esforços ou obras, mas única e exclusivamente pelo sangue de Jesus: o inocente Cordeiro de Deus que foi sacrificado por nós. [Comentário: A justificação é um presente que Deus concede ao homem. Paulo diz: sendo justificados gratuitamente, por Sua graça (Rm 3.24). A palavra gratuitamente significa “como um presente”, “sem pagamento”; e a palavra graça significa “por um favor imerecido”. Ela não pode ser comprada por obras humanas ou conquistada por méritos pessoais. Ela é exclusivamente pela graça - gratuita para o pecador, mas ela teve um alto custo para Deus. Para nós a salvação é grátis, mas para Deus custou à vida de Seu Filho. “Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo” (1Pe 1.18-19). É por meio do sacrifício de Jesus, que Deus toma a culpa do pecador e a atribui a Jesus Cristo. E a justiça que há em Jesus Cristo é imputada ao pecador. Jesus pagou a pena em nosso lugar, e por isso nenhuma condenação há para aquele que nEle confia. Cristo “…foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação”. A justificação pela fé é a doutrina que marca o rompimento dos reformadores com a Igreja de Roma. A justificação, de acordo com o ensino de Roma, era pelas obras. Esse ensino escravizava a mente e o coração das pessoas, que nunca podiam descansar em Deus, tendo a necessidade de praticar constantemente as obras recomendadas pela igreja.]

SUBSÍDIO BIBLIOLÓGICO

A Doutrina da Justificação
A estudarmos a Doutrina do Pecado descobrimos que ninguém pode ser justificado pela justiça humana. Entretanto, é na doutrina da justificação, no texto de 3.1 a 5.21, que o pecador encontra o caminho da justificação, através da obra expiatória de Cristo. No primeiro estado, o pecador está perdido e sem possibilidade alguma de se justificar diante de Deus. No segundo estado, o pecador encontra Cristo que o justifica.
É a partir do capítulo 3.21 que o pecador, judeu ou gentio, encontra um novo caminho através dos méritos de Cristo Jesus. É aqui que ele pode ser perdoado e declarado livre da pena do seu pecado, perante Deus.
Justificação significa absolvição da culpa, cuja pena foi satisfeita. Significa ser declarado livre de toda culpa tendo cumprido todos os requisitos da lei.
Justificação é um termo forense que denota um ato judicial da administração da lei. Esse ato judicial legaliza a situação do transgressor perante a lei e o torna justo, isto é, livre de toda a condenação. Cristo assumiu a pena do pecador e foi sentenciado no lugar do pecador. Ele sofreu a pena contra o pecador. Cumprida a pena, o veredicto final da justiça divina é a justificação do pecador. Entende-se então que ser justificado não significa que a justiça tenha sido adiada, ou que ela não tenha sido cumprida” (CABRAL, Elienai. Romanos: O Evangelho da Justiça de Deus. 5ª Edição. RJ: CPAD, 2005, p.52).

II. A JUSTIFICAÇÃO CONTESTADA

1. A justificação se opõe à salvação meritória. Paulo desejava que o seu ensino não fosse mal interpretado, então recorrendo ao método da diatribe, se adiantando em responder as contestações que seus interlocutores poderiam fazer-lhe. “Onde está, logo, a jactância? É excluída. Por qual lei? Das obras? Não! Mas pela lei da fé” (Rm 3.27). A lei dizia faça e o judeu devoto estava convicto de que Deus o justificaria pelo que fazia. No entanto, a graça que Paulo ensinava dizia não faça, mas aceite o que Jesus já fez. O que seria feito então do orgulho judaico que se vangloriava em ser o povo eleito de Deus e das boas obras que praticavam? Não levaria Deus isso em conta nessa nova doutrina de Paulo? Nas palavras do apóstolo, não! É bem fácil imaginar que para um judeu devoto, guardador da lei e praticante de boas obras, que o ensino da justificação “pela fé somente” era bem difícil de digerir. Não é fácil abrirmos mão do nosso orgulho e deixarmos de nos vangloriarmos pelos nossos feitos. Todavia, a doutrina da justificação pela fé diz que não há mérito humano quando a graça de Deus se manifesta. A conclusão de Paulo é que “o homem é justificado pela fé, sem as obras da lei” (Rm 3.28). [Comentário: A fonte da justificação é a graça de Deus, o fundamento da justificação é a obra de Cristo e o meio da justificação é a fé. A fé é o canal através do qual a justificação é concedida ao pecador que crê; é o meio pelo qual ele toma posse das bênçãos obtidas por Cristo (como a paz com Deus, Rm 5.1). Ela não é uma boa obra, mas um dom de Deus, como Paulo ensina em Efésios 2.8-9. É o único meio de receber o que Deus fez por nós (“sola fides”), ficando excluídos todos os outros atos ou obras. A morte expiatória de Cristo assegura uma parte de nossa justificação, ou seja, aquela que diz respeito ao perdão, enquanto sua ressurreição obtém para nós o outro elemento, o da justiça. Como morte e ressurreição permanecem juntas como aspectos gêmeos da realização central de Cristo, o mes­mo acontece com a expiação e a justificação. A morte na cruz não foi o final para Jesus. Sua morte foi o cumprimento de uma importante etapa de sua obra, que teve continuidade em sua ressurreição, ascensão, sessão à destra do Pai e em sua obra permanente como Profeta, Sacerdote e Rei. Por sua vez, foi a ressurreição que deu significado à morte e lançou luz para os discípulos sobre tudo o que havia ocorrido anteriormente. Foi sua ressurreição que deixou claro para os discípulos e para todos aqueles que o viram pregado na cruz que ele realmente era quem dizia ser: o Messias prometido. Além do mais, a própria ideia da ressurreição exige a morte primeiro, ou isso não é ressurreição. Da mesma forma como morte e ressurreição são inseparáveis e mutuamente necessárias, assim também a justificação não pode ocorrer sem a expiação pelos pecados, pois as pessoas não podem ser consideradas justas se elas estão sob a ira de Deus. Por outro lado, a expiação também não pode ser entendida sem seu com­panheiro inseparável, o recebimento da justiça, que nos capacita não apenas a sermos trazidos a um estado de inocência, mas nos faz aptos para entrarmos em comunhão com um Deus justo e santo. Relativo à ‘trapos de imundícia’, os “atos de justiça” que Isaías tinha em mente eram, muito provavelmente, os rituais superficiais oferecidos por Israel, desprovidos de uma fé e de uma obediência sinceras. m Isaías 65.1-7, o Senhor rejeita os sacrifícios pecaminosos de Israel. Eles são um insulto ao Senhor, fumaça para seu nariz, assim como a “obediência” ritualista de Isaías 58 não impressionou ao Senhor porque seu povo continuava oprimindo o pobre. Os “atos de justiça” eram “trapos imundos” porque não eram nem um pouco justos. Tinham aparência boa, mas não passavam de farsa, literalmente uma cortina de fumaça para acobertar a incredulidade e a desobediência deles. Então, não é correto pensar que todo “ato de justiça” do crente são trapos imundos aos olhos de Deus. Aliás, no versículo anterior, Isaías 64.5, Isaías declara: “Vens ajudar aqueles que praticam a justiça com alegria, que se lembram de ti e dos teus caminhos”. Não é impossível o povo de Deus praticar atos de justiça que agradam a Deus. Sobre isso, John Piper explica: “Às vezes as pessoas são descuidadas e falam de forma negligente sobre toda a justiça humana, como se não houvesse nada que agradasse a Deus. Muitas vezes elas citam Isaías 64.6 que diz que nossa justiça é como ‘trapo de imundícia’. É verdadeiro – gloriosamente verdadeiro – que ninguém do povo de Deus, antes ou depois da cruz, seria aceito pelo Deus imaculadamente santo se a justiça perfeita de Cristo não nos fosse imputada (Romanos 5.19; 1 Coríntios 1.30; 2 Coríntios 5.21). Mas isso não quer dizer que Deus não produza nessas pessoas ‘justificadas’ (antes e depois da cruz) uma justiça experiencial que não é ‘trapo de imundícia’. Ao contrário, ele o faz; e essa justiça é preciosa a Deus e é exigida, não como fundamento da justificação (que é a justiça de Cristo somente) mas como evidência de sermos filhos verdadeiramente justificados de Deus”. John Piper, Graça Futura (São Paulo, SP: Shedd Publicações, 2009), pág. 148. Os que geram fruto em cada boa obra e crescem no conhecimento de Deus são totalmente agradáveis a Deus (Cl 1.10). Apresentar nosso corpo como sacrifício vivo agrada a Deus (Rm 12.1). Cuidarmos de nosso irmão mais fraco agrada a Deus (Rm 14.18). Obedecer nossos pais agrada a Deus (Cl 3.20). Ensinar a Palavra de forma autêntica agrada a Deus (1 Ts 2.4). Orar por autoridades de governo agrada a Deus (1 Tm 2.1-3). Sustentar familiares em necessidade agrada a Deus (1 Tm 5.4). Partilhar recursos financeiros com outros agrada a Deus (Hb 13.16). Agrada a Deus quando guardamos os seus mandamentos (1 João 3.22). Em linhas gerais, sempre que você confia em Deus e o obedece, ele se agrada disso.  Wayne Grudem, “Pleasing God by Our Obedience”, em For the Fame of God’s Name: Essays in Honor of John Piper, ed. Sam Storms and Justin Taykir (Wheaton, IL: Crossway, 2010), pág. 277.]

2. A justificação se opõe ao orgulho nacionalista. A segunda indagação que Paulo procura responder é a seguinte: “É, porventura, Deus somente dos judeus? E não o é também dos gentios? Também dos gentios, certamente” (Rm 3.29). Esse é outro ponto que contrastava com a crença do judaísmo do primeiro século — o exclusivismo. A doutrina da justificação pela fé revela que Deus não é somente dos judeus, que se achavam privilegiados pelo legalismo em relação à Torá, mas dos gentios também. Deus não é uma divindade nacionalista, mas Ele é o Deus de toda a Terra. Não há dúvidas de que Paulo tinha em mente o shema judaico quando argumentou sobre esse assunto: “Ouve, Israel, o SENHOR, nosso Deus, é o único SENHOR” (Dt 6.4). Se Deus é o único Deus, como de fato afirma o monoteísmo judaico, então Ele é o Deus dos gentios também. Não podemos cair no erro de achar que Deus é nossa propriedade exclusiva. [Comentário: A parábola do fariseu e do publicano (Lc 18.9-14) sobre dois grandes pecadores foi contada pelo Senhor Jesus. Um dos homens sabia que era pecador e o confessou diante de Deus. O outro não sabia que era pecador e gabava-se de sua justiça. É a história de um homem que pensava ser bom, mas que foi para o inferno e de outro que sabia ser mau e foi para o céu. A aplicação desta parábola é clara: Quando consideramos nossa própria atitude na oração, é ela mais parecida com a do fariseu ou com a do coletor de impostos? Humilhamo-nos na presença de Deus ou achamo-nos agradecendo-lhe porque não somos como outras pessoas pecadoras? Humilhamo-nos ou agradecemo-lhe por nossa força e o fato que não caímos como outros caíram? Sentimos a necessidade de exclamar, como o fez o coletor de impostos: "Ó Deus, sê propício a mim, pecador"?]

3. A justificação se opõe ao antinomismo. “Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma! Antes estabelecemos a lei” (Rm 3.31). Essa é última pergunta a ser respondida por Paulo dentro dessa seção. Os judeus legalistas defendiam a observância dos preceitos da lei e acusavam Paulo de ser antinomista, isto é, ensinar que a lei não tem mais nenhum sentido. Paulo estaria ensinando que a justificação pela fé tornara a lei desprezível? A resposta de Paulo é não! O problema não era com a Lei, que tinha a função de servir de condutora até Cristo, mas com os homens que se mostraram incapazes de cumpri-la. Nem judeu nem tampouco gentio algum foi capaz de cumprir a Lei. Somente Jesus Cristo a cumpriu em nosso lugar. Qualquer tentativa de cumprir a Lei hoje é nula, além de ser uma afronta àquEle que se mostrou o único habilitado a fazê-lo — Jesus Cristo, nosso Senhor. [Comentário: O Antinomismo (gr. Anti=contra; Nomos=lei, literalmente contra a Lei ou contra o sistema da Lei) é uma das heresias mais antigas da História da Igreja. Já aparece no gnosticismo helenizado de Marcião que negava qualquer importância real e espiritual ao Antigo Testamento, e por conseguinte desde a Lei até os profetas, mas especialmente a primeira que era considerada irrelevante e sem mais importância a partir de Cristo, por meio do qual fora estabelecida uma nova relação com os homens. O Antinomismo, portanto, não só rejeita a Lei mas não vê para essa lei qualquer significação nos dias de hoje, seja do ponto de vista da fé ou mesmo da ética. Contra a acusação dos judeus de que Paulo era antinomista, Paulo mostra que nunca houve outro recurso de salvação senão aquele provido por Deus. A esse respeito o Antigo Testamento deu seu testemunho claro e irretorquível. Isso fica evidente da experiência de Abraão e Davi, dois vultos memoráveis da história de Israel, por demais estimados por toda a nação. De fato, desde a entrada do pecado neste mundo, justificação pela fé sempre foi o método de salvação. Paulo encerrou o capítulo 3 com a afirmação que a fé confirma e não anula a lei.]

SUBSÍDIO BIBLIOLÓGICO

Professor, o subtópico três mostra que o antinomismo se opõe a justificação. Antes de discorrer a respeito do assunto faça a seguinte indagação: “O que é antinomismo?”. Ouça os alunos com atenção e explique que “literalmente significa contra a lei. Doutrina que assevera não haver mais necessidade de se pregar nem de se observar as leis morais do Antigo Testamento. Calibrando esta assertiva, alegam os antimonistas que, salvos pela fé em Cristo Jesus, já estamos livres da tutela de Moisés. Ignoram porém, serem as ordenanças morais do Antigo Testamento pertencentes ao elenco do direito natural que o Criador incrustara na alma de Adão. Como podemos desprezar os Dez Mandamentos? Todo crente piedoso os observa, pois o Cristo não veio revogá-los; veio cumpri-los e sublimá-los. Além do mais, as legislações modernas estão alicerçadas justamente no Decálogo” (ANDRADE, Claudionor Corrêa de. Dicionário Teológico. 8ª Edição. RJ: CPAD, 1999, p.44).

III. A JUSTIFICAÇÃO EXEMPLIFICADA

1. Abraão, circuncisão e justificação (Rm 4.1-8). Na seção de Romanos 4.1-8, o apóstolo Paulo toma o exemplo do patriarca Abraão para fazer um contraste entre a justificação pela fé e pelas obras. A antiga tradição judaica afirmava que Abraão já guardava a Torá, mesmo tendo vivido séculos antes dela. Ele a teria guardado por “antecipação”, pois segundo o judaísmo, apoiando-se em Gênesis 17.23, Abraão é circuncidado como sinal da aliança entre ele e Deus. Da mesma forma o sacrifício de Isaque confirmaria tal crença (Gn 22). Em outras palavras, as obras justificaram Abraão. Contra essa argumentação, Paulo mostra que Abraão não poderia ter sido aceito por Deus em virtude da circuncisão, pois ele creu em Deus, tendo sido isso imputado como justiça, antes dele ser circuncidado e pelo menos quatro séculos antes do advento da Lei. O que justificou Abraão não foi o que ele fez, mas o que Deus fez por ele. Esse é o princípio do Evangelho – somos aceitos não pelo que fizemos, mas pelo que Cristo fez por nós. [Comentário: Paulo encerrou o capítulo 3 com a afirmação que a fé confirma e não anula a lei. Ele continua o seu argumento, citando o exemplo do pai do povo da aliança, Abraão. Todos os judeus respeitavam profundamente o pai de sua nação. Mostrando que Abraão foi justificado por fé, e não por obras de lei, Paulo reforça a sua defesa do evangelho entre os judeus. Abraão recebeu a graça de Deus pela fé antes de ser circuncidado (veja Gênesis 12, onde recebeu as promessas, e Gênesis 17, onde recebeu a ordenança da circuncisão 24 anos depois). A circuncisão por si só não serve para nada diante de Deus. É necessária a obediência, andando “nas pisadas da fé que teve Abraão...antes de ser circuncidado” (Rm 4.12).]

2. Abraão, promessa e justificação (Rm 4.9-17). Na Aliança Abraâmica, Deus prometeu fazer dos descendentes de Abraão uma grande nação. Ele também prometeu ao patriarca que lhe daria como herança a terra e faria do seu servo uma bênção para todos os povos (Gn 12.1-3). Fazendo referência a essa promessa divina, Paulo argumenta que a justificação não poderia decorrer da obediência à lei pelo fato de que quando Deus fez a promessa a Abraão, este nem mesmo era circuncidado (Rm 4.10-15). A própria crença judaica dizia que a fé obediente de Abraão nas promessas de Deus lhe foi imputada como justiça (Gn 15.5,6). Para Paulo, se as bênçãos divinas prometidas a Abraão dependessem da obediência ao código mosaico, então as promessas de Deus teriam falhado, visto que ninguém fora capaz de cumprir ou guardar a lei. [Comentário: Os judaizantes do passado pregavam que a justiça provinha das obras (At 15.1; Gl 2.21). apóstolo Paulo diz pela inspiração que somos salvos pela fé e não pelas obras. (Ef 2.8-10). A salvação pela fé, e não pelas obras, isto é, pela guarda da Lei, não é uma doutrina peculiar do Novo Testamento; é, também, característica do Antigo Pacto. Paulo retrocede no tempo, para além de Moisés, e toma Abraão como exemplo de fé. Abraão tinha fé em Deus, isto é, cultivava um dedicado e leal relacionamento com seu Deus, cria nas suas promessas (Rm 4.20,21; Gn 12.1-3; 15.5,6) e vivia em obediência ao Senhor (Gn 12.1-4; 22.1-19; Hb 11.8-19; Tg 2.21,22;). A fé de Abraão foi "imputada" por justiça. "Imputar" significa creditar na conta da pessoa. Isso significa que a fé salvífica do cristão é tida como equivalente à justiça no tocante ao seu efeito. A Escritura nos ensina que somos justificados pela fé (Rm 3.28,30) ou mediante a fé (Rm 5.1; Gl 2.16; Fp 3.9), mostrando, assim, que existe uma estreita relação entre a justificação e a fé.]

3. Abraão, ressurreição e justificação (Rm 4.18-25). Na teologia de Paulo em Romanos 4.18-25 há um paralelismo entre a fé de Abraão e a fé do cristão – ambos creram em um Deus que torna possível as coisas impossíveis. Paulo mostra que Deus tornou possível a concretização das promessas a Abraão, mesmo sendo seu corpo já “amortecido” pelo fato de sua idade avançada, e dessa forma recompensou a sua fé. A sua fé, mesmo contra as evidências externas, garantiu-lhe a concretização das promessas (Rm 4.16-22). Da mesma forma, a fé do cristão na morte e ressureição de Jesus, o Filho de Deus, é a garantia de que as promessas de Deus em sua vida também serão cumpridas (Rm 4.23,25). [Comentário: O Pr Esdras Costa Bentho escreve: “O capítulo 4 é uma apologia contra uma das interpretações rabínicas prevalecente nos dias de Paulo. De acordo com a exegese judaica, Abraão recebera a justiça de Deus (Gn 15.6) por meio de seus méritos e virtudes (Josefo (1); Ec 44.20; 1 Mc 2.52). Para exaltar o patriarca, um partido judeu afirmava que Abraão cumpriu a lei antes de o Senhor a ter entregue a Moisés (2 Baruque 57.1,2). Alguns deles chegaram ao extremo: afirmavam que não foi o Senhor quem escolhera Abraão, mas Abraão quem escolhera o Senhor.(2) Segundo essa escola, Abraão era o modelo dos que são justificados pelas boas obras, ele mereceu conforme a lógica do trabalho e recompensa. Contra essa abordagem é que Paulo desenvolve o texto do capítulo 4”http://www.cpadnews.com.br/blog/esdrasbentho/cultura-crista/76/romanos:-a-epistola-da-justificacao-pela-fe.html. Se no Antigo Testamento a recepção da promessa por parte de Abraão foi possível pelo fato condicional de sua justiça pela fé (Rm 4.13), na nova aliança a pessoa justificada pela fé receberá a vida (Rm 1.17; Gl 3.11).]

SUBSÍDIO BIBLIOLÓGICO

“Paulo diz que, se Abraão, o pai dos judeus segundo a carne, tivesse sido julgado por obras ou justiça própria, teria que gloriar-se diante de Deus. Porém o que aprendemos é que Abraão foi como qualquer outro homem, pecador e sem justiça nenhuma. Ele foi declarado justo por meio da fé (Rm 4.3). Os judeus vangloriavam-se em Abraão e criam que isto lhes garantiria a justificação, apenas por serem ‘filhos de Abraão segundo a carne’. Os versículos 4 e 5, apresentam dois modos de justificação: por méritos e por graça.
A justificação por méritos se baseia nas obras do homem para obter a sua salvação. A justificação por graça baseia-se sobre o princípio da fé. Deus justifica o pecador pela fé. Ele imputa justiça ao que crê, isto é pela graça de Deus” (CABRAL, Elienai. Romanos: O Evangelho da Justiça de Deus. 5ª Edição. RJ: CPAD, 2005, p.59).

CONCLUSÃO

Chegamos ao final de uma importante lição sobre a doutrina da justificação pela fé. Nesta lição aprendemos que Paulo recorreu a experiência do patriarca Abraão para argumentar contra a crença judaica que associava a aceitação das obras como garantia de justificação diante de Deus. Para Paulo isso não poderia ser verdade já que o velho patriarca não possuía mérito algum quando recebeu as promessas de Deus. As bênçãos recebidas por ele, assim como as da Nova Aliança, decorrem exclusivamente da graça de Deus em resposta a fé. [Comentário: Em Romanos ficamos sabendo que justo é, portanto, quem foi declarado livre em processo, não por não ser efetivamente culpado, mas por ser reconhecido como tal. O judaísmo na época de Paulo, a prática de uma ética em conformidade com a lei era conditio sine qua non para o juízo de Deus. Isto é, o cumprimento dos mandamentos da lei e as boas obras condicionam o surgimento da justiça divina. Paulo entra em cena agora e diz que, se Abraão, o pai dos judeus segundo a carne, tivesse sido julgado por obras ou justiça própria, teria que gloriar-se diante de Deus. No entanto, Abraão foi como qualquer outro homem, pecador e sem justiça nenhuma. Ele foi declarado justo por meio da fé (Rm 4.3). A doutrina da justificação pela fé é o cerne da teologia paulina, utilizada especialmente quando em confronto direto com o ensino judaico, que defendia que o homem encontra a graça de Deus quando cumpre a vontade divina por meio da lei. É somente pela fé na eficácia do sacrifício de Cristo na cruz que o homem pode ser considerado justo diante de Deus. Paulo chama a atenção aos gálatas por desprezarem este sacrifício e misturar a justificação com a santificação, confiando nas obras de justiça (Gl 1.6,9), o que Paulo chama de “outro evangelho”. Cuidemos para que não caiamos no mesmo erro. Sola Fide!] “NaquEle que me garante: "Pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto não vem de vós, é dom de Deus" (Ef 2.8)”.

Francisco Barbosa

Disponível no blog: auxilioebd.blogspot.com.br.

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