A tragédia atacou sem avisar. Durante
a noite, a minha irmãzinha de 7 anos ficou doente e teve de ser levada às
pressas ao Hospital Geral de Massachusetts. Eu tinha 9 anos e essa emergência
me fez ficar sozinho em nosso apartamento, na cidade de Boston. Quando meus
pais retornaram, pela manhã, Mary não estava com eles.
Depois do funeral, as coisas
ficaram piores em nosso lar. Durante meses, minha mãe continuou a chorar e a chamar
sua filha morta. Parentes, amigos e vizinhos se revezavam para confortá-la.
Anos depois, nós descobrimos que,
durante esse período, minha mãe havia tentado encontrar com a filha falecida.
Certa vez, quando a temperatura estava abaixo de zero, ela encheu suas botas de
cano longo com água e caminhou durante horas pelas ruas de Boston, torcendo
para contrair pneumonia e morrer. Mas ela não pegou nem mesmo um resfriado.
Outra vez, ela pegou a navalha de
papai e subiu até a laje do edifício em que morávamos. Na hora em que estava
prestes a cortar os pulsos, um vizinho subiu para estender suas roupas lavadas
no varal. Quando o viu, minha mãe entrou em pânico, lançou a navalha por cima
da amurada e voou de volta ao apartamento.
A vida tornou-se muito difícil
para mim e meu pai nesse período. Minha mãe não preparava mais as refeições,
não limpava mais a casa e se recusava a sair do apartamento a não ser para
visitar a sepultura de Mary. Ela sempre se vestia de preto e definhava
continuamente.
Na vitrine
Kazimir Trojan era nosso hóspede
polonês. Ele também sentiu o peso de nossa aflição e tentou ajudar. Aos
sábados, quando não estava trabalhando, frequentemente me levava para passear.
Eu gostava dessas ocasiões, pois ele sempre me comprava doce ou um sorvete de
casquinha.
Um dia caminhamos até a praça
Scollay e visitamos a Loja Woolworth’s. Meus olhos se concentraram numa vitrine
que tinha uma pulha de livros pretos. Eu percebi que cada livro tinha uma cruz
dourada impressa na capa. Ainda jovem, eu fui ensinado a venerar a cruz. Ao
vê-la nos livros, pensei que eram manuais de oração ou publicações santas.
Ao ver aqueles livrinhos pretos me
fez pensar que poderia haver algo em algum deles que
servisse para ajudar minha
mãe. As pessoas não podiam ajudá-la. Talvez Deus pudesse. Eu implorei a Kazimir
que comprasse um dos livros para mamãe. Para me agradar, ele comprou um que
custava dez centavos de dólar. Nós não percebêramos que tínhamos comprado uma
edição de bolso do Novo Testamento.
Eu dei o livro a mamãe. Por algum
tempo, ele permaneceu sobre sua penteadeira, mas um dia ela começou a lê-lo.
Quando chegou a Mateus 10.37 e leu “Quem ama o pai ou mãe mais do que a mim não
é digno de mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que a mim não é digno de
mim”, o Espírito de Deus levou aquela mensagem ao seu coração com um forte
impacto.
Durante seus momentos de tristeza,
mamãe ficava com raiva de Deus por ter levado a pequena Mary. Agora, minha mãe
percebia que ela tinha amado Mary mais do que o Criador. Ficou claro para ela
que o suicídio não teria solucionado o problema; pelo contrário, teria selado
sua miséria total. Ela estava segura de que sua menininha estava com o Senhor,
mas ela, cheia de raiva, não era digna do Senhor e se encontraria em trevas
exteriores.
Minha mãe caiu sobre os joelhos e
clamou a Deus por perdão. Ela sentiu um alívio. Pela primeira vez em muitos
meses sentiu paz em seu coração e começou a ler mais e mais aquele livrinho
preto e a apreciar o que lia. Ela desejava, entretanto, ler aquele livro em sua
língua natal, o ucraniano, para que pudesse compreendê-lo melhor.
Papai sugeriu que a biblioteca
pública com sua seção de livros estrangeiros poderia ter aquele livro em
ucraniano. Lá, ele descobriu que o Novo Testamento ucraniano estava disponível,
mas vinha com o Velho Testamento, como a Bíblia Sagrada. Papai trouxe o livro
para casa. Com deleite, mamãe começou a ler as Escrituras em sua própria
língua.
Rejeição à Palavra
Um dia, enquanto estava lendo, ela
se lembrou de algo que tinha acontecido dois anos antes a tragédia. A amiga de
infância de mamãe, Josephine Iwasko, que se tornara uma crente regenerada,
visitou nossa casa com Agafia Turchinetz para nos falar da salvação através de
Jesus Cristo.
Josephine nunca tinha aprendido a
ler ou escrever, mas ela e sua amiga trouxeram uma Bíblia e sugeriram com
ênfase que meus pais a lessem. Esteve emprestada conosco durante três meses.
Infelizmente, nem papai nem mamãe se interessaram pelo livro ou pelo testemunho
de Josephine. Depois foi dito a eles que apenas pessoas treinadas poderiam
compreendê-los. Homens que tentassem decifrar seus mistérios poderiam perder a
razão ou acabar em algum tipo de seita. Por isso, meus pais pediram a Josephine
e sua amiga que deixassem a nossa casa e nunca mais se aproximassem de nós com
essa “nova religião”.
Dois anos depois, ficara claro
para mamãe que o livrinho preto, a Bíblia ucraniana da biblioteca pública e a
Bíblia que Josephine havia trazido eram um mesmo livro. Ela sabia que tinha de
localizar Josephine. Embora não tivesse seu endereço, conseguiu encontrá-la e
naquela noite foi a uma pequena igreja pentecostal em Chelsea, onde crentes
ucranianos, poloneses e russos iam para adorar ao Senhor. Mamãe retornou para
casa como uma cristã regenerada, cheia de gozo e radiante com o amor de Deus.
Em princípio, a mudança assustou
papai, ele não conseguia entender o que tinha acontecido. Não foi muito depois
disso, no entanto, que Deus salvou meu pai, Kazimir e eu. Nosso lar mudou.
Tornou-se um lugar alegre com Cristo sendo o centro de nossas conversas e
atividades. Hábitos como o fumo, a bebida e o jogo desapareceram e foram
estabelecidas novas práticas que glorificavam o nome de Deus.
Que poder tremendo há nesse Livro!
Ele mudou nossas vidas, mudou nossa família. Mamãe se tornou uma testemunha de
Cristo, levando muitos à salvação. Papai se tornou um ministro. Meu filho, Fred
Junior, é um pastor e agora seu filho, Randal, está se preparando para o
ministério.
Tudo isso e muito mais por causa
do livrinho preto: a Palavra de Deus. Oh, sim não podemos esquecer o testemunho
fiel de uma jovem iletrada que, quando levou pela primeira vez a Bíblia a nossa
casa, foi escorraçada. Mas a semente que ela deixou brotou abundantemente mais
tarde.
O apóstolo Paulo escreveu: “Porque não me envergonho do
evangelho de Cristo, pois é o poder de Deus para salvação de todo aquele que
crê” (Rm 1.16). Confie no poder da Palavra de Deus. Fale sobre ela. Espalhe-a. As
pessoas precisam dela. Este livro tem as respostas para os problemas de todos.
Fred Smolchuck
(Artigo
publicado na revista Pentecostal Evangel, publicação das Assembleias de Deus no
EUA. Tradução de Maurício Zágari. (Mensageiro de Paz setembro de 1999)
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