A governadora
do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), vetou o projeto de lei nº 169/2013,
que havia sido aprovado na Assembleia Legislativa do Estado e previa a
cassação do registro do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) de empresas flagradas com trabalho escravo. Na prática,
isso significa banimento da empresa do Estado. A governadora alegou que o
texto é inconstitucional.
O caso é
curioso pois, em junho, circularam pela internet denúncias de que a
governadora teria vetado uma lei contra o trabalho escravo, também
aprovada pela Assembleia, que dispõe sobre sobre vedações à formalização
de contratos e convênios entre órgãos e entidades da administração
pública e empresas que utilizem essa forma de exploração. Na época,
expliquei que a denúncia era falsa, pois a lei já havia sido sancionada
por Roseana no dia 10 de janeiro (lei 9752/2010). Agora, o caso não é
de boato. A lei é outra e o veto ocorreu.
Um levantamento
de 2007 da Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo do
Maranhão mostrou que o Estado era, então, o principal fornecedor de mão
de obra escrava. Na “lista suja“, cadastro de empregadores flagrados
por esse crime do Ministério do Trabalho e Emprego e da Secretaria de
Diretos Humanos da Presidência da República, o Maranhão aparece ao lado
do Tocantins como a quinta unidade da federação com maior número de
empregadores com escravos. Dos 498 nomes, 34 são de flagrantes no
Estado. Além disso, o Maranhão tem a segunda pior colocação no Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de acordo com o Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil 2013. A matéria é de Stefano Wrobleski,
da Repórter Brasil:
De autoria do
deputado Othelino Neto (PPS), o projeto foi inspirado na lei paulista nº
14.946/2013, de autoria de Carlos Bezerra Jr. (PSDB), que foi
regulamentada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) em maio. Uma
propostas semelhantes já foram aprovadas e sancionadas no Mato Grosso do
Sul ou apresentadas, como no Tocantins e Rio de Janeiro. Além da
cassação do registro de ICMS, ambas as matérias determinam que as
empresas que se beneficiarem de mão de obra escrava serão impedidas de
exercer o mesmo ramo de atividade econômica ou abrir nova empresa por
dez anos. O veto foi publicado na edição de segunda-feira (5) do Diário
Oficial da Assembleia Legislativa e, na sua justificativa.
O projeto de
lei de Othelino Neto é o segundo com o mesmo teor a ser proposto neste
ano na Assembleia Legislativa do Maranhão. Em maio, a Repórter Brasil
noticiou que o deputado Bira do Pindaré (PT) havia apresentado o projeto
de lei nº 078/2013, que também foi inspirado na lei paulista. A
matéria, no entanto, não obteve parecer favorável da Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde teve como relator o
deputado Tatá Milhomem (PSD), que alegou “vício de iniciativa”. No seu
entendimento, esse tipo de lei não poderia partir do Poder Legislativo.
Quando um projeto de lei recebe parecer negativo da CCJ, o deputado que o
propôs pode pedir que o plenário vote por reverter o parecer, o que
permite a votação do projeto. Bira, no entanto, não fez isso: “Para
reverter precisamos de 22 votos, que é a maioria dos deputados da
Assembleia. Como faço parte da minoria que faz oposição ao governo,
nunca consegui reverter um parecer contrário ao meu”, explicou.
Os dois
projetos se diferenciam principalmente no primeiro artigo, que define
quais serão as empresas punidas. Enquanto a proposta de Bira também pune
as que se beneficiaram de trabalho escravo em qualquer etapa da cadeia
produtiva, sendo responsabilizadas também pelo flagrante de funcionários
em empresas terceirizadas, somente as empresas envolvidas diretamente
com escravidão são alvo do projeto de Othelino Neto.
Para Ítalo
Rodrigues, procurador do Ministério Público do Trabalho no Maranhão,
“responsabilizar a empresa por condições indignas em qualquer das etapas
de produção é bem mais condizente com as disposições internacionais
acerca do trabalho”. Ele ressalta que as empresas flagradas fazendo uso
de trabalho escravo colocam, em geral, o seu processo produtivo de uma
forma “pulverizada”, o que resulta na subcontratação de outras empresas,
processo também conhecido como “terceirização”. O deputado paulista
Carlos Bezerra Jr. considera que a alteração do primeiro artigo “suprime
a possibilidade de penalizar a terceirização de fachada e tira a
possibilidade de enfrentar o problema na sua raiz”.
Questionado,
Othelino disse que a proposta de lei “atinge seu objetivo” e que “não
tem a pretensão de atacar todos os aspectos do trabalho escravo”. Ele
afirmou que vai tentar convencer os demais deputados a derrubar o veto
de Roseana. Para isso, é necessário que, ao menos, 22 deputados, a
maioria simples do plenário, votem pela derrubada. O projeto de Othelino
foi apresentado semanas depois do de Bira. Com tramitação em regime de
urgência – para que, segundo o deputado, “fosse aprovada antes do
recesso do Legislativo” –, ele conseguiu as assinaturas necessárias que
garantiram a reapresentação de projeto semelhante ao outro, rejeitado,
no mesmo ano. Tendo o deputado Rubens Júnior (PC do B) como relator na
CCJ, a proposta obteve parecer favorável e foi aprovada pelo plenário em
8 de julho.
Apesar das
diferenças entre as propostas, Bira do Pindaré acha “positivo o fato de
que o que era nossa intenção principal tenha prosperado na Assembleia”.
Ele considera “pouco provável” que o veto de Roseana Sarney seja
derrubado, mas apoia a iniciativa de Othelino Neto de tentar derrubá-lo.
Opção
conservadora - A justificativa de veto da governadora do Maranhão é,
para o deputado paulista Carlos Bezerra Jr., “uma opção conservadora,
que vai na contramão dos avanços da luta contra o trabalho escravo”. Já
Othelino acredita que Roseana Sarney “se demonstra insensível a um tema
importante como esse, que está acima de questões meramente partidárias”.
Para vetar a
proposta de Othelino, a governadora do Maranhão alegou que o texto é
incompatível com o artigo 43 da Constituição do Estado do Maranhão, que
garante ao Poder Executivo exclusividade para propor leis de natureza
tributária, categoria na qual, no seu entendimento, o projeto de lei
estaria incluído.
O próprio
artigo 43 é alvo de questionamento do deputado Hélio Soares (PP), que
elaborou, em 2011, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) visando
alterá-lo para derrubar essa exclusividade do Executivo. Uma proposta já
foi aprovada por todas as comissões da Assembleia Legislativa do Estado
e passou em primeira votação, mas ainda é necessária uma segunda
votação antes que possa ser encaminhada à governadora para sanção.
O Supremo
Tribunal Federal também vem discutindo a questão. De acordo com o
advogado Eduardo Corrêa, presidente da Comissão de Defesa da República e
da Democracia da OAB no Maranhão, “existem reiteradas decisões no STF
sobre as quais os Poderes Legislativos estaduais possuem poder de
iniciativa para legislar sobre matéria tributária”. “Tecnicamente a
Assembleia Legislativa do Maranhão pode derrubar o veto. A questão é se
eles vão ter a disposição política para isso”, disse.
Tal pai, tal filha. Os Sarney são praticamente uma praga bíblica sobre o Brasil...
Nenhum comentário:
Postar um comentário