domingo, 11 de abril de 2021

REFLEXÕES SOBRE O TRIBUNAL DE CRISTO

Todos os crentes comparecerão perante o Tribunal de Cristo, 2 Co 5.10. Lá, os crentes não entrarão em juízo para condenação, senão apenas para recompensa, Jo 5.24. Já fomos julgados na cruz de Cristo. No Tribunal de Cristo, serão julgadas as nossas obras, 1 Co 3. Como o próprio nome o indica, o Juiz desse Tribunal será o Senhor Jesus, Jo 5.22; Is 33,22. Nada ficará encoberto naquele dia, Hb 4,13. Ao mesmo tempo em que haverá recompensa para os servos fiéis e operosos, deverá haver vergonha para os servos negligentes, Mt 25.21; 1 Co 3.12-14; Rm 2.10; 1 Co 3.15. Ao pensarmos no Tribunal de Cristo, devemos pensar no fato de que somos despenseiros da multiforme graça de Deus, 1 Pe 4.7-10.

Mais de mil anos depois do Tribunal de Cristo é que se dará o Grande Trono Branco, Jo 5.29; Ap 20.12. Neste juízo final, os filhos de Deus não entrarão, porque será para aqueles que não estão inscritos no Livro da vida do Cordeiro. A palavra grega usada para o Tribunal de Cristo pelo apóstolo Paulo é bema. A palavra bema descreve uma plataforma ou pódio onde se colocava um assento para um oficial.

O Tribunal de Cristo será o julgamento dos filhos de Deus. Não será para a vida eterna, mas para a herança. É por isso que o Espírito de Deus tem nos ensinado a ajuntarmos tesouros no céu, a fazermos as obras para Deus e não para serem vistas pelos homens.

Ao pensarmos no O Tribunal de Cristo, pensamos em Mt 6.1 e também em Mt 25.20,21.

Todo o sermão do Monte fala de recompensa. Essa recompensa é o galardão, o prêmio, a coroa que será dada pelo justo Juiz, naquele Dia, aos vencedores.

O Tribunal de Cristo deverá preceder a faustosa cerimônia das bodas do Cordeiro, Ap 19.9. Após as bodas do Cordeiro, a Bíblia fala do Senhor Jesus Cristo saindo do céu e os Seus com Ele, v. 14. Essa será Sua vinda à terra, quando Ele há de derrotar os exércitos do mundo, lançar a besta e o falso profeta no lago de fogo, prender Satanás e estabelecer, aqui na terra, o Seu Reino milenar.

O Tribunal de Cristo deverá ser uma sequência do dia de Cristo, ou a parousia, 1 Co 1.8; 2 Co 1.14; Fp 2.16; 1 Ts 2.19; 3.13. Assim, o tribunal de Cristo tem o seu lugar entre o arrebatamento e a manifestação de Cristo com os Seus. O Tribunal de Cristo será o momento da prestação de contas pessoal sobre como temos tratado nossos irmãos, Rm 14.12,13. Nessa ocasião, seremos recompensados ou reprovados pelo nosso ministério. Ali, serão testados todas as nossas verdadeiras motivações, 1 Co 3.13; 4.5, bem como será avaliado o nosso caráter, 2 Co 5.10.

No Tribunal de Cristo, o que vai contar não será a quantidade de trabalho que realizamos, mas, sobretudo, a qualidade dele. Portanto, nada julgueis antes de tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas e manifestará os desígnios dos corações; e, então, cada um receberá de Deus o louvor, 1 Co 4.5. Os que a muitos ensinam a justiça refulgirão como as estrelas, Dn 12.3. Que Deus nos mantenha preparados para o Dia do Tribunal de Cristo. 


GOMES, Geziel. Bíblia para Pregadores e Líderes. São Paulo: Central Gospel, 2017, p. 1579.


quinta-feira, 8 de abril de 2021

LIÇÃO 2: O PROPÓSITO DOS DONS ESPIRITUAIS

 

COMENTÁRIO E SUBSÍDIO I

 INTRODUÇÃO

Nesta lição estudaremos o verdadeiro propósito dos dons espirituais concedidos por Deus à sua Igreja. Os dons do Espírito Santo são recursos imprescindíveis do Pai para os seus filhos. O seu propósito é edificar-nos e unir-nos, fortalecendo assim a Igreja de Cristo (1 Tm 3.15). – A experiência da vida cristã indica que grande parte das pessoas, nas igrejas pentecostais, não sabe lidar muito bem com os recursos espirituais que Deus coloca à disposição dos crentes. A começar pelo batismo com o Espírito Santo, há uma confusão de ideias sobre sua natureza, a forma de receber, e, mais ainda, quanto à sua finalidade ou propósito. Há quem pense que o cristão é batizado para falar línguas. Quando, na verdade, o falar em línguas, em princípio, é um sinal da experiência do recebimento do batismo com o Espírito Santo, e este, uma bênção distinta da salvação, concedida para que o cristão tenha poder para testemunhar com eficácia a mensagem do evangelho (At 1.8). Os dons espirituais não são distribuídos pela igreja, mas pelo Espírito Santo, conforme sua vontade e seus propósitos soberanos (1Co 12.11). Lembre-se: Você não recebe dons pelos seus próprios méritos, não é recompensa! O apóstolo Paulo usou quatro verbos-chave que ilustram a soberania de Deus na distribuição dos dons espirituais: O Espírito Santo distribui (1Co 12.11), Deus dispõe (1Co 12.18), Deus coordena (1Co 12.24) e Deus estabelece (1Co 12.28). Do começo ao fim Deus é soberano nesse negócio! Portanto, o propósito dos dons não é para a exaltação de quem o exerce, mas para o serviço aos demais membros do corpo e tudo para a glória de Deus.

 I. OS DONS NÃO SÃO PARA ELITIZAR O CRENTE

1. A igreja coríntia. A Igreja em Corinto localizava-se numa cidade comercial e próxima do mar, sendo uma das mais importantes do Império Romano. Corinto era uma cidade economicamente rica, porém marcada pelo culto idolátrico. Durante a segunda viagem missionária de Paulo, a igreja recebeu a visita do apóstolo (At 18.1-18). Por conhecer muito bem a comunidade cristã em Corinto foi que o apóstolo dos gentios tratou, em sua Primeira Epístola dirigida àquela igreja, sobre a abundância da manifestação dos dons do Espírito, chegando a afirmar daquela igreja que "nenhum dom" lhe faltava (1 Co 1.7.)

2. Uma igreja de muitos dons, mas carnal. Os dons do Espírito concedidos por Deus à igreja de Corinto tinham por finalidade prepará-la e santificá-la para o serviço do evangelho: a proclamação da Palavra de Deus naquela cidade. Todavia, além de aquela igreja não usar corretamente os dons que recebera do Pai, tinha em seu meio divisões, inveja, imoralidade sexual, etc. Como pode uma igreja evidentemente cristã ser ao mesmo tempo carnal e imoral? Por isso Paulo a chama de carnal e imatura (1 Co 3.1,3). Com este relato, aprendemos que as manifestações espirituais na igreja local não são propriamente indicadoras de seriedade, espiritualidade e santidade. Uma igreja onde predominam a inveja, contenda e dissensões, nem de longe pode ser chamada de espiritual, e sim de carnal. 

3. Dom não é sinal de superioridade espiritual. Muitos creem erroneamente que os irmãos agraciados com dons da parte de Deus são, por isso, mais espirituais que os outros. Todavia, os dons do Espírito são concedidos pela graça de Deus. Por ser resultado da graça divina, não recebemos tais dons por méritos próprios, mas pela bondade e misericórdia de Deus. Que a mensagem de Jesus possa ressoar em nossa consciência e convencer-nos de uma vez por todas de que os dons não são garantia de espiritualidade genuína: "Muitos me dirão naquele Dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E, em teu nome, não expulsamos demônios? E, em teu nome, não fizemos muitas maravilhas? E, então, lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade" (Mt 7.22,23). 

A igreja de Corinto, na Grécia, possuía praticamente todos os dons espirituais (cf. 1 Co 1.7), mas o apóstolo Paulo, em sua primeira carta àquela igreja, fez uma referência nada desejável àqueles irmãos. “E eu, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a meninos em Cristo” (1 Co 3.1). Um verdadeiro paradoxo à primeira vista. Uma igreja que possuía todos os dons, com crentes batizados com o Espírito Santo; uns falavam línguas, outros profetizavam; outros interpretavam; outros tinham dons de curas e milagres; outros possuíam muito conhecimento espiritual, mas Paulo lhes escreve, demonstrando que, em sua avaliação, eles não eram tão espirituais quanto pareciam ser, pelo fato de terem tantos dons! Foi mais contundente, dizendo que eles eram “carnais” ou “meninos em Cristo”! Seria motivo para perguntarem a Paulo: “Como pode, pastor Paulo, uma coisa dessas? O senhor diz, no início de sua carta (1.7), que nenhum dom falta à igreja, e, poucos parágrafos depois, diz que esta igreja é formada de carnais e meninos em Cristo?”

Talvez, nem tal pergunta foi feita, pois a resposta sobre sua avaliação da igreja de Corinto foi dada logo a seguir, naquele trecho da missiva do apóstolo, para não deixar dúvida quanto à sua afirmação desagradável: “porque ainda sois carnais, pois, havendo entre vós inveja, contendas e dissensões, não sois, porventura, carnais e não andais segundo os homens? Porque, dizendo um: Eu sou de Paulo; e outro: Eu, de Apoio; porventura, não sois carnais?” (1 Co 3.3,4). Não poderia haver uma igreja mais espiritual do que aquela, mas, infelizmente, não poderia haver crentes mais carnais do que aqueles. Se fosse nos dias atuais, algum “apóstolo” ou “bispo” se sentiria muito vaidoso em ser pastor de tal congregação.

Entre eles havia crentes invejosos, outros que promoviam contendas e dissensões, lançando irmãos contra irmãos. Certamente, eles não entendiam bem a natureza e o propósito dos dons espirituais para a igreja. Imaginavam, como acontece hoje, que possuir um dom espiritual é motivo para considerar-se superior aos outros; era razão para ser consagrado ao ministério, para ser presbítero ou ministro; quem sabe, havia irmãs de oração, que viviam profetizando, com a finalidade de dirigir a vida do pastor ou de outras pessoas; quem sabe, ainda, havia quem sapateasse na igreja, ou saísse marchando ou correndo, para lá e para cá, a fim de chamar a atenção para sua espiritualidade.

Havia algo pior. Divisão dentro da própria igreja. Havia grupos, partidos, “igrejinhas”, “panelinhas” e grupinhos de partidários de Apoio, de Pedro, de Paulo e até “de Cristo”. Aliás, este último grupo ou partido era o mais carnal de todos. Eram do tipo de crente que, hoje, diz: “Eu não dou satisfação a ninguém. Eu não obedeço a homem’, mas só a Cristo”. São os que não obedecem aos pastores, ao dirigente da igreja, principalmente quando esses querem corrigir excessos de manifestações ditas espirituais no uso de dons.

Como Paulo não era o pastor titular da igreja, mas seu fundador, e vivia distante por força de seu ministério missionário, deve ter tomado conhecimento através de informações consistentes quanto ao comportamento da igreja. E por carta precisou exortá-los a que não continuassem na prática de comportamentos contrários à sã doutrina e ética no uso dos dons espirituais. Assim, é importantíssimo que os líderes de igrejas promovam o ensino bíblico quanto à origem, a natureza e o propósito dos dons espirituais. Este comentário tem essa finalidade, fornecendo análise e subsídios para o ensino sobre o propósito dos dons espirituais

ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA

Professor, para introduzir o primeiro tópico da lição, divida a classe em dois grupos. Depois, escreva no quadro as seguintes indagações: "0 que precisamos fazer para receber os dons espirituais?" "A santidade é condição para o recebimento dos dons?" Cada grupo deverá ficar com uma questão. Dê alguns minutos para que os alunos discutam as questões. Em seguida reúna a todos formando um único grupo. Peça a um representante de cada grupo fazer suas considerações sobre a sua questão. Ouça os alunos com atenção. Depois, explique que os dons espirituais são habilidades concedidas pelo Espírito Santo para edificação da igreja. Para receber estas habilidades basta crer e pedir com fé. Os dons são presentes divinos e fruto da misericórdia do Pai. É graça de Deus!

  II. EDIFICANDO A SI MESMO E AOS OUTROS  

1. Edificando a si mesmo. Paulo diz que quem "fala língua estranha edifica-se a si mesmo" (1 Co 14.4). O apóstolo estimulava os crentes da igreja de Corinto a cultivarem sua devoção particular a Deus através do falar em línguas concedidas pelo Espírito, com o objetivo de edificarem a si mesmos. Isto não significa que o apóstolo dos gentios proibia o falar em línguas publicamente, mas ao fazê-lo de maneira devocional o crente batizado com o Espírito Santo edifica-se no seu relacionamento com Deus. Falar ou orar em línguas provenientes do Espírito é uma bênção espiritual maravilhosa. 

2. Edificando os outros. Os crentes de Corinto falavam em línguas e exerciam vários dons espirituais, mas parece que eles não se preocupavam muito em ajudar as pessoas. Por isso, o apóstolo lembra que os dons só têm razão de existir quando o portador preocupa-se com a edificação da vida do outro irmão em Cristo (1 Co 14.12). Em lugar de buscarmos prosperidade material, como se pudéssemos barganhar com Deus usando dinheiro em troca de bênçãos, busquemos os dons espirituais. Agindo assim edificaremos a nós mesmos e também aos outros. 

3. Edificando até o não crente. Embora o apóstolo dos gentios estimulasse todos os crentes a falarem em línguas, isto é, a edificarem a si mesmos, seu desejo era que também esses mesmos crentes profetizassem a fim de que a igreja toda fosse edificada. O comentário da Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal diz sobre esse texto: "Embora o próprio Paulo falasse em línguas, enfatizava a profecia, porque esta edificava a Igreja inteira, enquanto falar em línguas beneficiava principalmente o falante". Todos quantos vierem a frequentar nossas reuniões devem ser edificados, sejam crentes ou não. Por isso, não podemos escandalizar aqueles que não comungam a mesma fé que nós (1 Co 14.23). Como eles compreenderão a mensagem do evangelho se em uma reunião não entenderem o que está sendo falado? (1 Co 14.9) 

O membro da igreja, em particular, precisa ser edificado, para que a coletividade, a igreja, também o seja. Não pode haver igreja edificada, se os membros não tiverem edificação espiritual. Quando o crente fala línguas, sem que haja intérprete, não edifica a igreja, porque o que fala fica sem entendimento para os demais. Mas não se deve proibir que o crente fale língua para si próprio (1 Co 14.39). Tão somente, deve ser ensinado que ele se controle e não eleve a voz, numa mensagem ininteligível. Há irmãos que, ao falar línguas, querem chamar a atenção para si, para mostrar que são espirituais. Isso é falta de maturidade.

O apóstolo ensina: “E, agora, irmãos, se eu for ter convosco falando línguas estranhas, que vos aproveitaria, se vos não falasse ou por meio da revelação, ou da ciência, ou da profecia, ou da doutrina?” (1 Co 14.6). Ele quer dizer que, se falar língua sem interpretação, é ótimo para si próprio, pois “edifica a si mesmo”. Mas, se não houver interpretação, não haverá revelação, ciência, profecia ou doutrina. E a igreja fica sem edificação, sem aproveitamento. Daí, porque, no mesmo capítulo, ele exorta: “Pelo que, o que fala língua estranha, ore para que a possa interpretar. Porque, se eu orar em língua estranha, o meu espírito ora bem, mas o meu entendimento fica sem fruto” (1 Co 14.13,14). – Quem fala línguas, sem interpretação, “edifica-se a si mesmo”, mas "... não fala aos homens, senão a Deus; porque ninguém o entende, e em espírito fala de mistérios” (1 Co 14.2). Naturalmente, quando o crente ora em línguas, mesmo que ele não saiba o sentido das palavras, Deus o entende. O crente, batizado com o Espírito Santo, deve procurar desenvolver uma adoração individual, plena da unção do Espírito Santo. Há ocasiões em que as palavras do seu idioma nativo não conseguem expressar o que sua alma deseja dizer a Deus, seja glorificando, intercedendo ou suplicando ao Senhor. – É nessas horas, quando o crente não sabe orar, que o Espírito Santo intercede por ele de maneira especial. “E da mesma maneira também o Espírito ajuda as nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis” (Rm 8.26). Esses “gemidos” do Espírito, pronunciados em línguas estranhas, são incompreensíveis ao que ora, mas perfeitamente entendidos por Deus, pois há línguas estranhas que são linguagem do céu, ou “línguas dos anjos” (1 Co 13.1). – Paulo, continuando suas admoestações, reporta-se mais uma vez ao seu grande salmo em louvor ao amor: Buscai o amor! Esta deve ser a maior preocupação deles, pois, como expressa certo comentarista: O amor é a patroa; os demais dons espirituais são servos, criados. Por isso, enquanto continuam no empenho proposital de ir após o amor, os coríntios deviam lutar com dedicação pelos dons espirituais, sendo o uso de todos eles, em sua dedicação à congregação, regulado pelo padrão estabelecido pelo amor. A causa das divisões daquela igreja era justamente a falta do amor. Todos os dons espirituais são proveitosos, incluindo o dom de línguas; mas nem todos se revestem de igual importância. Ao buscarem os dons espirituais (ver 1Co 12.31 e 14.1), os coríntios deveriam deixar de buscar o dom de línguas e abusar do mesmo, porquanto isso causara efeitos prejudiciais à sua comunidade cristã, como meio que era de autoglorificação, além de interromper a comunicabilidade entre os membros da igreja que assim faziam. Portanto, se os crentes de Corinto estivessem genuinamente interessados em buscar os dons espirituais, a profecia deveria ser o seu grande alvo, e não as línguas. O grande teste da contribuição que os nossos dons espirituais podem fazer à igreja é o teste da edificação. Que temos feito para edificar a igreja onde somos membros? Quantas pessoas têm sido levadas a uma maior aproximação a Cristo, por causa do que temos falado e ensinado? O zelo é bom, mas pode mal orientar inocentemente ou propositadamente, com o propósito de exaltação própria. – Se diversos instrumentos destituídos de vida podem levar os homens a compreender certas atitudes e sentimentos, reagindo conforme os mesmos, ou compreendendo uma ordem emitida por aqueles, em ocasião de batalha, então, quão mais expressivo instrumento precisa ser a voz humana, que conta com o apoio da inteligência, e até mesmo de dons espirituais concedidos por DEUS! Assim equipados, os crentes devem ser capazes de transmitir benefícios espirituais a seus ouvintes. Porém, se algum idioma não for compreendido pelos seus ouvintes, perde-se o desígnio inteiro da comunicação de ideias, e a voz humana se torna muito menos significativa do que o instrumento musical visto não haver transmitido pensamento ou sentimento nenhum (1Co 12.9). Embora o dom de línguas seja uma manifestação genuína da parte de Deus, a sua utilidade se perde se nada consegue comunicar. Pode reter, entretanto, certa utilidade particular, para o próprio crente que as fala; mas não tem uma utilidade coletiva, altruísta. Portanto, as línguas, caso não acompanhadas do dom paralelo da interpretação de línguas, devem ser praticadas em particular, e não publicamente. Não digo que o falar línguas em nossos cultos deva ser desencorajado. Mas precisamos colocar ordem para evitar os escândalos. Ainda lembro da primeira vez que visitei uma igreja “de fogo” e, assustado com aquela “histeria”, me indagava se aquilo “era de Deus”, como no caso hipotético apresentado por Paulo aos coríntios: “O que acontecerá se toda a igreja se congregar num lugar, e todos falarem línguas estranhas?”. Na verdade, este é o pensamento de todo indouto que entra em nossos templos, daí o cuidado que devemos ter com o exercício deste dom e priorizarmos, como enfatiza Paulo, o dom de profetizar, pois este constrangerá o visitante a reconhecer sua pecaminosidade. Meu pensamento não é uma tentativa de ajustar e conformar o culto ao molde da opinião pública. Mas entendo que o papel da igreja é atrair e conquistar os de fora para o Reino. É alarmante o fato de que, em alguns arraiais pentecostais, ao invés de ajudar a converter os pecadores, os cultos desordenados despertam somente o escárnio e o desprezo dos descrentes, todo o seguimento pentecostal sofre e é achincalhado por isso.

SUBSÍDIO TEOLÓGICO

“Dado conforme o Espírito Deseja. A primeira relação dos dons com a repetição do fato que cada um é dado pelo Espírito (1 Co 12.8-10) leva ao clímax no versículo 11, que diz: 'Mas um só e o mesmo Espírito opera todas as coisas, repartindo particularmente [individualmente] como quer'. Aqui temos um paralelo com Hebreus 2.4, que fala dos apóstolos que primeiramente ouviram o Senhor e depois transmitiram a mensagem: 'Testificando também Deus com eles, por sinais [sobrenaturais], e milagres, e várias maravilhas [tipos de obras de grande poder] e dons [distribuições separadas] do Espírito Santo, distribuídos por sua vontade'. É evidente, à luz destes trechos, que o Espírito Santo é soberano ao outorgar os dons. São distribuídos segundo a sua vontade. Buscamos os melhores dons, mas Ele é o único que sabe o que é realmente melhor em qualquer situação. Fica evidente, também, que os dons permanecem debaixo de sua autoridade. Nunca são nossos no sentido de não precisarmos do Espírito Santo, pela fé, para cada expressão desses dons. Nunca se tornam parte da nossa própria natureza, ao ponto de não perdê-los, de serem tirados de nós. A Bíblia diz que os dons e a vocação de Deus são permanentes (Deus não muda de opinião a respeito deles), mas aqui há referência a Israel (Rm 11.28,29)" (HORTON, Stanley M. A Doutrina do Espírito Santo no Antigo e Novo Testamento. 12.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2012, p. 230).

 III. EDIFICAR TODO O CORPO DE CRISTO

1. Os dons na igreja. Na Primeira Carta aos Coríntios, Paulo dedica dois capítulos (12 e 14) para falar a respeito do uso dos dons na igreja. O apóstolo mostra que quando os dons são utilizados com amor, todo o Corpo de Cristo é edificado. Conforme diz Thomas Hoover, parafraseando Paulo em Efésios 4.16, "os membros do corpo, cada qual com sua própria função concedida pelo Espírito, cooperam para o bem de todas. O amor é essencial para os dons espirituais alcançarem seu propósito". Se não houver amor, certamente não haverá edificação (1 Co 13). Sem o amor de Deus nos tornamos egoístas e acabamos por colocar nossos interesses em primeiro lugar. O propósito dos dons, que é edificar o Corpo de Cristo, só pode ser cumprido se tivermos o amor de Deus em nossa vida. 

2. Os sábios arquitetos do Corpo de Cristo. Deus levanta homens para edificarem espiritual, moral e doutrinariamente a igreja local. A Igreja é o "edifício de Deus" (1 Co 3.9). Os ministros, sábios arquitetos (1 Co 3.10). O fundamento já está posto pelos apóstolos: Jesus Cristo (1 Co 3.11). Mas os ministros têm de tomar o cuidado com as pedras assentadas sobre este alicerce, pois eles também tomam parte na edificação espiritual da Igreja de Cristo segundo a mesma graça concedida aos apóstolos. Por isso, Paulo faz uma solene advertência para a liderança hoje: "mas veja cada um como edifica sobre ele. Porque ninguém pode pôr outro fundamento, além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo" (1 Co 3.10,11).  

3. Despenseiros dos dons. O apóstolo Pedro exortou a igreja acerca da administração dos dons de Deus (1 Pe 4.10,11). Ele usou a figura do despenseiro que, antigamente, era o homem que administrava a despensa e tinha total confiança do patrão. O despenseiro adquiria os mantimentos, zelava para que não estragassem e os distribuíam para a alimentação da família. Desta forma, os despenseiros da obra do Senhor devem alimentar a "família de Deus" (1 Co 4.1; Ef 2.19). Eles precisam ter o cuidado no uso dos dons concedidos pelo Senhor para prover a alimentação espiritual, objetivando a edificação do Corpo de Cristo: "Cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus. Se alguém falar, fale segundo as palavras de Deus; se alguém administrar, administre segundo o poder que Deus dá, para que em tudo Deus seja glorificado por Jesus Cristo, a quem pertence a glória e o poder para todo o sempre" (1 Pe 4.10,11). 

Um corpo se caracteriza pela maravilhosa cooperação de muitos elementos, que são perfeitamente unidos um ao outro. É a essa admirável unidade de muitas porções que Paulo se refere, fazendo disso uma ilustração de como tal condição deveria prevalecer na igreja. São usados verbos no particípio presente a fim de salientar como essa unidade, tão intricada e perfeita em sua natureza e atuação, deve existir na forma de uma operação contínua. As ideias de «harmonia», de «adaptação», de «solidariedade» e de «unidade na diversidade», são assim expressas (compare com Cl 2.2,19). Russell Norman Champlin afirma que ao mencionar a harmonia e a participação na vida mútua que o amor cristão propicia, Paulo chega ao final da presente secção, reiterando a ideia de unidade, que inspirou esta passagem, a começar por Ef 4.1, como é necessário nos suportarmos uns aos outros em amor, tendo em vista a preservação da unidade do Espírito no vínculo da paz (Ef 4.3).

Paulo teve coragem de dizer que era um “sábio arquiteto”, na edificação da igreja. Nem todo obreiro pode dizer isso, nos dias presentes. Os terrenos em que a igreja está sendo edificada são tão instáveis, que desafiam a capacidade de todos os engenheiros ou arquitetos. Os ventos fortes de falsas doutrinas e movimentos heréticos, disfarçados de genuínos movimentos cristãos conspiram contra a estabilidade e a unidade da Igreja de Cristo. Os edificadores de hoje têm tantos ou maiores desafios do que os do tempo de Paulo, mesmo que tenham mais recursos humanos e técnicos que o apóstolo dos gentios.

Mas a missão dos obreiros do Senhor é cuidar da evangelização, buscando as almas que se integram à igreja, e o cuidado delas, através do discipulado autêntico, que se fundamenta na sã doutrina, esposada por Jesus Cristo, e interpretada e aplicada pelos seus apóstolos e discípulos, ao longo da História. Os cristãos devem ser edificados para serem templos do Espírito Santo (1 Co 6.19,20). E os dons são indispensáveis nessa edificação espiritual. – Lembre-se: Jesus foi o Servo de Deus, Aquele que “não veio para ser servido, mas para servir” (Mc 10.45). Na Sua vida, tal como nos mostram os Evangelhos, Ele demonstrou esse princípio, servindo ao Seu povo e aos Seus (como ilustrado em Jo 13.1-17). Servir uns aos outros é, assim, um chamado a sair de si mesmo e dos seus problemas, e se dedicar aos outros. É essa exteriorização que está o fundamento da ética cristã, como vida de serviço aos outros “enquanto outros” (ou seja, não uma extensão de mim próprio, ou “outros” a quem eu comando ou manipulo, e coloco dentro do meu esquema). A palavra grega é diakonuntes, de onde vem diaconia, serviço. Aqui, ela tem um significado abrangente, incluindo todo tipo de serviço que se pode prestar a outros (em palavra e ação). Essa diaconia é possível porque todos receberam dons com os quais podem servir aos outros. Charisma é o termo usualmente empregado no N.T. para se referir aos chamados “dons espirituais”. São várias as definições e especificações deles (cf. 1 Co 12; Rm 12; Ef 4); trata-se de capacidades que Deus concede a todos os cristãos (associadas à habitação do Espírito Santo neles, 1 Co 12.7) para o serviço dentro do contexto da comunidade cristã. Podem se tratar de talentos naturais que recebem um novo impulso e uma nova orientação pela ação do Espírito, ou de capacitações originais, concedidas ao crente para que com elas sirva aos outros. Nunca devemos perder de vista que são dados soberanamente pelo Espírito Santo, e que sua função é servir (nada mais que isso; usá-los para autopromoção é absolutamente contrário à sua natureza, sendo uma atitude exemplarmente repreendida em At 8.18-24). Importante é também que cada um dos crentes recebeu um dom, o que, de saída, nivela a todos, e toma todos igualmente importantes uns para os outros. Cada um deve colocar o dom que tem a serviço de todos, porque, ao receberem dons, os cristãos se tomam despenseiros da graça de Deus. A charis (graça) é a fonte dos charisma (dons, carismas). Quem os recebe, recebe graça de Deus, e os recebe por causa da graça de Deus que lhes concedeu o Espírito Santo. Ter um dom espiritual, então, é ter um “depósito de graça”, que deve extravasar (porque graça é para ser doada). Despenseiros é oikonomoi, um termo técnico referente ao mordomo, o administrador da casa (lembrando que “casa” é a oikos do mundo da época, uma instituição social fundamental, a “comunidade doméstica” que incluía família e trabalhadores, bem como os hóspedes). O oikonomos era o encarregado de atender as necessidades de todos, administrando os bens nessa direção.

SUBSÍDIO BIBLIOLÓGICO

“O amor é essencial

Os dons têm um lugar especial na igreja e são muito úteis. Mas o amor representa a essência da vida cristã, e é absolutamente necessário. Ele encontra um lugar mesmo entre os dons carismáticos, porém os dons sem a presença do amor são como um corpo sem alma.

Sem amor, o dom de falar se torna vazio e imprudente — ele é como o metal que soa ou como o sino que tine. O metal que soa ('gongo barulhento') significa que um pedaço de metal não lavrado ou gongo usado para chamar a atenção. Tinir (alalazon) significa 'colidir', ou um som alto e áspero. 0 sino (ou símbolo) consistia de duas meias circunferências que eram golpeadas causando um estrondo. A ideia aqui é de um inexpressivo som de metal em lugar de música.

O objetivo do apóstolo é mostrar que o homem que professa o dom da glossolalia, da forma como era praticada em Corinto, mas que não tem amor, na realidade não é mais que um instrumento metálico impessoal" (Comentário Bíblico Beacon. 1. ed. Vol. 8. Rio de Janeiro: CPAD, 2006, pp.343,44).

   CONCLUSÃO

A Igreja de Jesus Cristo tem uma missão a cumprir: proclamar o evangelho em um mundo hostil às verdades de Cristo e descrente de Deus. Diante desta tão sublime tarefa, a igreja necessita do poder divino. Os dons espirituais são um "arsenal" à disposição do corpo de Cristo para o cumprimento eficaz de sua missão na terra. Como já foi dito, o propósito dos dons é edificar toda a igreja, todo Corpo de Cristo para ser abençoado, exortado e consolado. Por isso, nunca devemos usar os santos dons de Deus em benefício particular, como se fosse algo exclusivo de certas pessoas. Somos chamados a servir a Igreja do Senhor, e não a utilizar os dons de Deus para nós mesmos. – A Igreja de Jesus Cristo é a representante dos céus na terra. Ela tem uma missão que transcende a esfera humana, pois recebeu a incumbência de fazer com que a "... multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus” (Ef 3.10). Sua missão, na terra, é a proclamação do evangelho, num mundo hostil às verdades de Cristo; um mundo que rejeita a Palavra de Deus. Diante dessa realidade, a igreja precisa de poder sobrenatural. Os dons espirituais são um arsenal à disposição da igreja para o cumprimento eficaz de sua missão na terra.

REFERÊNCIAS

CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Candeias. V. 4, p. 605.

LIÇÕES BÍBLICAS. 2º Trimestre 2021 - Lição 2. Rio de Janeiro: CPAD, 11, abr. 2021.

LIMA, Elinaldo Renovado de. Dons Espirituais e Ministeriais: servindo a Deus e aos homens com poder extraordinário. Rio de Janeiro: CPAD, 2021.

STAMPS, Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 1997.


segunda-feira, 5 de abril de 2021

APOLOGÉTICA CRISTÃ NA PÓS-MODERNIDADE

 

Quais são os maiores desafios do pregador do evangelho na atualidade? Um dos seus maiores desafios, sem dúvida, é o de defender a verdade. Vivemos na pós-modernidade, termo cujo prefixo “pós” não indica somente substituição da era moderna ou sublevação contra ela. Além de opor-se à modernidade, a pós-modernidade é uma era pós-cristã em que não apenas ocorre uma insurgência contra o Iluminismo, que deu origem a era moderna, mas principalmente uma ferrenha oposição ao cristianismo.

Na Renascença ainda na pré-modernidade, não houve a entronização da razão, porém a autoridade da Igreja foi enfraquecida. E os iluministas, bebendo da fonte da filosofia renascentista, elevaram o ser humano ao centro do mundo, substituindo Deus pela humanidade e colocando-a no palco da História.

O Iluminismo rompeu a comosvisão teísta, que fora apurada pela Reforma Protestante, de maneira permanente e radical, transformando a razão em fonte primária de autoridade, acima das “superstições” proclamadas pelos cristãos. Já na modernidade – que teve seu ápice na Revolução Industrial –, os apologistas de então tinham o desafio de opor-se ao pensamento de John Locke (1632-1704), Voltaire (1694-1778), Jean-Jacques Rousseau (1712-78), Montesquieu (1689-1755), Denis Diderot (1713-84), David Hume (1711-76), Immanuel Kant (1724-1804), etc., os quais associavam a verdade à racionalidade, fazendo da razão o único árbitro da crença correta.

Com a publicação de Assim Falou Zaratustra, de Friedrich Nietzsche (1844-1900), em 1883, assinalou-se o começo do fim da era moderna e o início da gestação da pós-modernidade. Na década de 1970, o ataque da pós-modernidade às Escrituras começou a ter maior intensidade com o surgimento do movimento pós-modernista, cujos ideólogos principais, além de Nietzsche, são: Foucault, Marx, Gramsci, Darwin, etc. Estes substituem o otimismo e o positivismo do século XIX por um pessimismo corrosivo, visando a desconstruir dialeticamente o discurso filosófico ocidental.

Embora rejeitem o Iluminismo, os pós-modernistas adotam o naturalismo como cosmovisão dominante, uma excrescência iluminista que abarca materialismo, ateísmo, antropocentrismo e evolucionismo. O principal argumento pós-moderno contrário ao cristianismo é o de que não existe verdade absoluta nem lugar para conceitos absolutos de dignidade, moral, ética e fé em Deus.

Nietzsche notabilizou-se por atacar a moralidade e dizer que ela é simplesmente um costume local ou uma expressão de sentimentos duvidosos. Foucault, por sua vez, afirma que verdade é uma fabricação ou ficção. Um filme que mostra a importância de opormo-nos a essas influências filosóficas anticristãs é Deus não está Morto (em três partes), que conta com a participação de apologistas renomados como Rice Brooks e Gary R. Habermas.

Uma das influências filosóficas da pós-modernidade é o pluralismo, que se manifesta principalmente como a diversidade que há numa sociedade multicultural e relativista. Cada grupo tem a “sua verdade”; a mentalidade pós-moderna é eclética e compreende mais do que simplesmente a tolerância a outros pontos de vista.

Como todas as culturas são consideradas moralmente equivalentes e como são muitas as comunidades humanas, são também inúmeras as diferentes “verdades”, que podem existir umas ao lado das outras. A verdade tem sido substituída pela imparcialidade e é definida como “a minha opinião”, não havendo, pois, espaço para o primado das Escrituras.  

As famílias nunca mais foram as mesmas depois da Revolução Industrial, que alienou a maioria das suas funções. Na pós-modernidade, entretanto, em razão do aumento desenfreado do consumismo, do hedonismo, bem como das mutações e convulsões sociais (cf. Rm 1.18-32), têm surgido novos estilos de “família”. O conceito bíblico de união familiar vem sendo substituído pela diversidade, e a “família” pode ser nuclear, expandida, multigeracional, formada por recasados, por pessoas do mesmo sexo e até poligâmicas.

Questões de gênero têm sido usadas contra o evangelho, e já há setores do evangelicalismo cedendo à pressão de perniciosos movimentos como, por exemplo, o feminismo e o elegebetismo, que é formado por ativistas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros. Cabe ao apologista, ao discorrer sobre o papel de homem e mulher na família, atacar o pecado da homossexualidade, e não a pessoa do homossexual (Rm 1.27; 1 Co 6.10). Ele deve ensinar sem medo “que, no princípio, o Criador os fez macho e fêmea” (Mt 19.4).

Na pós-modernidade, vigora a ideia pragmática de que tudo o que é cultural pode fazer parte do culto evangélico. Os apologistas devem ser firmes na defesa da proeminência do Reino de Deus sobre a cultura humana. Lembremo-nos de que a porta e o caminho para a salvação são estreitos (Mt 7.13,14) e de que a Igreja foi estabelecida por Jesus para pregar o evangelho, e não para contextualizá-lo, a fim de agradar o ser humano. Atentemos para as palavras do nosso Mestre em Mateus 28.19,20: “ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-as a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado”.

Outras verdades que o apologista deve defender são: a encarnação sobrenatural do Verbo e sua morte como nosso substituto penal, a realidade do Inferno e o reconhecimento de que Satanás e os demônios

são reais e estão ativos no mundo. O apologista deve reafirmar que “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1.14; 1 Tm 3.16) e que, graças a isso, o Deus-Homem provou a morte por toda a humanidade para livrar-nos da condenação e das garras do Inimigo (At 20.28; 2 Co 5.14; Cl 2.14,15).

Evocando o pensamento dos reformadores, devemos afirmar a ideia da substituição penal para declarar que o Senhor Jesus suportou em lugar da humanidade a penalidade que ela deveria pagar (Hb 2.9-15). As filosofias pós-modernas contrárias à Palavra de Deus são muitas e têm influenciado o evangelicalismo de tal modo que, a cada dia cresce o número de “cristãos não salvos” em busca de autoajuda, ignorando que, por causa da sua natureza pecadora (Rm 3.23; 5.12), todos precisam ser envolvidos pela graça de Deus e entrar pelo único caminho para a salvação (Tt 2.11; Jo 10.9; 14.6).

Extraído do Livro: ZIBORDI, Ciro Sanches. Estevão, o primeiro apologista do Evangelho. Rio de Janeiro: CPAD, 2018, pp. 112-115.

sábado, 3 de abril de 2021

LIÇÃO 1: E DEU DONS AOS HOMENS

COMENTÁRIO E SUBSÍDIO I

 INTRODUÇÃO

A Bíblia de Estudo Pentecostal define "dons” como “manifestações sobrenaturais concedidas da parte do Espírito Santo, e que operam através dos crentes, para o seu bem comum". Neste trimestre analisaremos os dons de Deus dispensados à Igreja para que, com graça e poder, ela proclame o Evangelho de Jesus a toda criatura. Além de auxiliar o Corpo de Cristo no exercício da grande Comissão, os dons divinos subsidiam os santos para que cheguem à unidade da fé (Ef 4.12,13). Deus se compraz em dar presentes. É da natureza divina a generosidade para com sua criação, e o mesmo pode ser dito no que concerne ao relacionamento de Deus para com sua Igreja. Nesse caso específico, a Bíblia nos apresenta a expressão “dom” como uma capacitação dada pelo próprio Deus para que seus servos possam atuar de forma adequada nas esferas da igreja local. – Ao criar o ser humano, homem e mulher, deu-lhes o sopro divino, o primeiro dom, o dom da vida. Não apenas a vida biológica, mas a vida espiritual, a vida eterna, com a qual o homem poderia desfrutar para sempre da gloriosa presença do Criador, sem sofrer os males decorrentes do pecado. - A Queda foi a tragédia de dimensão espiritual, humana e cósmica. O homem não soube aproveitar a grande dádiva da existência e da vida, propiciada pelo Ser Supremo. E desperdiçou a grande oportunidade de viver com Deus, no paraíso, que se estenderia por todo o planeta, num ambiente plenamente adequado para uma vida especial. Perdeu a vida eterna, restando-lhe o dom da vida na dimensão biológica, sujeito às fraquezas e desordens naturais. - Mas Deus provou que tem um plano especial para o homem, na face da Terra. E propiciou a redenção da humanidade, com a promessa da “semente da mulher” (Gn 3.15), que haveria de ferir a cabeça da serpente, o Diabo e seus seguidores. Jesus, a maior dádiva de Deus à humanidade, nasceria de uma mulher (cf. Is 7.14), para ser morto, em sacrifício pelo homem perdido, e tornar-se o vencedor do pecado, da morte e do Diabo. A salvação foi o maior dom de Deus ao mundo (Jo 3.16). O dom da vida eterna, em Cristo Jesus.

 I. OS DONS NA BÍBLIA

1. No Antigo Testamento. O Dicionário Bíblico Wycliffe mostra que há várias palavras hebraicas que significam "dádiva". A origem dessas palavras está na raiz hebraica nathan, que significa "dar". Por isso, podemos afirmar que no Antigo Testamento há vislumbres dos dons divinos concedidos a pessoas peculiares como reis, sacerdotes, profetas e outros. Todavia, os dons divinos não estavam acessíveis ao povo de Deus da Antiga Aliança como observamos no regime da Nova Aliança.

2. No Novo Testamento. O mesmo dicionário informa ainda que ao longo do Novo Testamento a palavra "dom" aparece com diferentes significados, que se relacionam ao verbo grego didomi. Este verbo representa o sentido ativo da palavra "dar" em Filipenses 4.15. Na Nova Aliança, os dons de Deus estão disponíveis para que a Igreja, em nome de Jesus, promova a libertação dos cativos, ministre a cura aos doentes e proclame a salvação do homem para a glória de Deus. O Novo Testamento também deixa claro que todos os crentes têm acesso direto a Deus através de Cristo Jesus e, por isso, podem receber os dons do Espirito.

3. Uma dádiva para a Igreja. A fim de sermos mais didáticos e eficientes no estudo a respeito dos dons. dividiremos este assunto em três categorias principais: Dons de Serviço, Dons Espirituais e Dons Ministeriais. Esta divisão acompanha a classificação dos dons conforme se encontra nas epístolas paulinas aos Romanos, 1 Coríntios e Efésios, respectivamente. Insistimos, porém, que esta classificação é apenas um recurso didático, pois quando o apóstolo expõe o assunto em suas cartas, ele não parece querer exaurir os dons em uma lista, antes, preocupa-se em exortar os irmãos a buscá-los e usá-los para encorajar, confortar e edificar a Igreja de Cristo, bem como glorificar a Deus e evangelizar o mundo.

A palavra “dom” tem vários significados no texto bíblico. No Antigo Testamento, escrito em hebraico, há várias palavras que traduzem o sentido de “dom”. Dentre elas, destacamos os termos mattan, com o sentido de alguma coisa oferecida gratuitamente, ou “um presente”, como em Provérbios 19.6; 21.14; ou como dote, dádiva (Gn 34.12). Há o termo maseth, que também significa “presente”, “dádiva” (Et 2.18; Jr 40.5); a mais usada, no entanto, é minchach, que ocorre duzentas e nove vezes, com o significado de “oferta”, “presente” (SI 45.12; 72.10). Em todas as ocorrências, o sentido é sempre o de algo que é dado ou oferecido gratuitamente. No Antigo Testamento, os dons eram concedidos a pessoas específicas, chamadas por Deus para cumprir determinadas missões. Os dons não estavam à disposição de todo o povo de Deus.

No Novo Testamento, escrito em grego, a palavra “dom” assume de igual modo significados diversos. O termo “doma” indica a oferta de um “presente”, “boa coisa” (Mt 7.11); o “pão nosso” é uma dádiva de Deus (Lc 11.13); “dons”, concedidos por Deus aos homens (Ef 4.8), com base no Salmo 68.19. A palavra cháris indica “dom gratuito”, ou “graça” (2 Co 8.4). O termo charisma é muito utilizado em estudos bíblicos, pois tem o significado de “dons do Espírito”, concedidos pela graça de Deus, com propósitos muito elevados; é relacionado ao termo ta charismata, utilizado em 1 Coríntios 12.4,9,28,30,31, que tem o sentido de “dons da graça”. Há o termo grego ta pneumática, usado por Paulo, em 1 Coríntios 12.1; 14.1, que se refere a “dons espirituais”. Em o Novo Testamento, os dons de Deus estão à disposição de todos os que creem, com a finalidade de promover graça, poder e unção à Igreja no exercício de sua missão, de forma que Cristo seja glorificado.

 DONS NATURAIS - O objetivo deste capítulo é enfatizar os dons no sentido espiritual. No entanto, incluímos rápida referência aos “dons naturais”, visto que eles são também dádivas ou concessões de Deus a todos os homens. Eles podem ser dados através de dois meios, e não devem ser confundidos com dons espirituais.

1) Através da natureza – Em sua infinita bondade, Deus “...é quem dá a todos a vida, a respiração e todas as coisas” (At 17.25). Além da vida humana, infundida no ato da criação, e na geração de cada novo ser vivo, Deus concede, através da natureza, o ar, a água, o sol, a chuva, a germinação das plantas, os frutos, os alimentos e tudo o que é necessário à sobrevivência no planeta. São “dons” ou dádivas naturais. E fruto da graça de Deus.

Para o naturalista, tudo isso é resultado de um processo ecológico, fruto do acaso cego. É a suprema ignorância sobre a verdadeira origem da Terra e do universo em geral. Mas os cristãos verdadeiros, que conhecem a Palavra de Deus, como revelação divina, sabem que todo o funcionamento dos ecossistemas são fruto da criação de Deus e de sua bondade para com o homem, face o seu plano glorioso para o planeta Terra, que é propriedade de Deus (SI 24.1).

2) Através das aptidões humanas – De modo geral, cada pessoa tem algum tipo de habilidade para realizar determinadas coisas. A psicometria, que usa o Quociente de Inteligência (QI) como parâmetro, indica que há pessoas com nível de inteligência maior ou menor que outra. Numa outra linha de entendimento, o psicólogo Howard Gardner (1980) entende que existem 7 tipos de inteligência:

Inteligência linguística. As pessoas que possuem este tipo de inteligência têm grande facilidade de se expressar tanto oralmente quanto na forma escrita. Elas além de terem uma grande expressividade, também têm um alto grau de atenção e uma alta sensibilidade para entender pontos de vista alheios. É uma inteligência fortemente relacionada ao lado esquerdo do cérebro é uma das inteligências mais comuns.

Inteligência lógica: Pessoas com esse perfil de inteligência têm uma alta capacidade de memória e um grande talento para lidar com matemática e lógica em geral. Elas têm facilidade para encontrar solução de problemas complexos, tendo a capacidade de dividir estes problemas em problemas menores e ir resolvendo até chegar à resposta final. São pessoas organizadas e disciplinadas. É uma inteligência fortemente relacionada ao lado direito do cérebro.

Inteligência Motora: Talento para os esportes e para a dança. Pessoas com este tipo de inteligência possuem um grande talento em expressão corporal e tem uma noção espantosa de espaço, distância e profundidade. Tem um controle sobre o corpo maior que o normal, sendo capazes de realizar movimentos complexos, graciosos ou então fortes com enorme precisão e facilidade. E uma inteligência relacionada ao cerebelo que é a porção do cérebro que controla os movimentos voluntários do corpo. Presente em esportistas olímpicos e de alta performance. E um dos tipos de inteligência diretamente relacionado à coordenação e à capacidade motora.

Inteligência Espacial. Pessoas com este perfil de inteligência têm uma enorme facilidade para criar, imaginar e desenhar imagens 2D e 3D. Elas têm uma grande capacidade de criação em geral, mas principalmente tem um enorme talento para a arte gráfica. Pessoas com este perfil de inteligência têm como principais características a criatividade e a sensibilidade, sendo capazes de imaginar, criar e enxergar coisas que quem não tem este tipo de inteligência desenvolvido, em geral, não consegue dominar esses assuntos.

Inteligência Musical: É um dos tipos raros de inteligência. Pessoas com este perfil têm uma grande facilidade para escutar músicas ou sons em geral e identificar diferentes padrões e notas musicais. Eles conseguem ouvir e processar sons além do que a maioria das pessoas consegue, sendo capazes também dei criar novas músicas e harmonias inéditas. Pessoas com este perfil é como se conseguissem “enxergar” através dos sons. Algumas pessoas têm esta inteligência tão evoluída que são capazes de aprender a tocar instrumentos musicais sozinhas. Assim como a inteligência espacial, este é um dos tipos de inteligência fortemente relacionados à criatividade.

Inteligência Interpessoal: É um tipo de inteligência ligada à capacidade natural de liderança. Pessoas com este perfil de inteligência são extremamente ativas e em geral causam uma grande admiração nas outras pessoas. São os líderes práticos, aqueles que chamam a responsabilidade para si. Eles são calmos, diretos e tem uma enorme capacidade para convencer as pessoas a fazer tudo o que ele achar conveniente. São capazes também de identificar as qualidades das pessoas e extrair o melhor delas organizando equipes e coordenando trabalho em conjunto.

Inteligência Intrapessoal: Liderança indireta para influenciar as pessoas. É um tipo raro de inteligência, também relacionado à liderança. Quem desenvolve a inteligência intrapessoal tem uma enorme facilidade em entender o que as pessoas pensam, sentem e desejam. Ao contrário dos líderes interpessoais que são ativos, os líderes intrapessoais são mais reservados, exercendo a liderança de um modo mais indireto, através do carisma e influenciando as pessoas através de ideias e não de ações. Entre os tipos de inteligência, este é considerado o mais raro. – Numa análise teológica, podemos dizer que esse ou aquele tipo de inteligência ou habilidade humana é dom natural de Deus, manifestado através de talentos, virtudes, capacidades inatas, ou vocações para determinadas tarefas.

Inteligência Espiritual. O apóstolo Paulo, em sua visão ampla acerca da vida espiritual, incluiu, em seus ensinos o conceito de “Inteligência Espiritual” (Cl 1.9). Sem dúvida alguma, é a inteligência concedida por Deus para os crentes compreenderem, discernirem e praticarem a vontade de Deus, em todas as áreas e situações de sua vida. A inteligência espiritual transcende os dons naturais e situa-se na esfera da ação do Espírito Santo na vida do crente. Certamente, podemos dizer que também é um dom de Deus.

ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA

Professor, para introduzir a primeira lição, reproduza o esquema abaixo. Divida a classe em três grupos e peça que, em grupo, os alunos leiam e relacionem os dons apresentados em cada uma das listas elaboradas pelo apóstolo Paulo. Peça que os alunos também digam o total de dons relacionados em cada lista.

1ª Lista – 1 Coríntios 12.8-10. (Um total de nove dons)

2ª Lista – 1 Coríntios 12.28. (Um total de oito dons)

3ª Lista – 1 Coríntios 12.29,30. (Um total de sete dons)

Reúna os alunos formando um único grupo. Ouça os grupos e conclua enfatizando que todos estes dons estão disponíveis para a igreja atual. Os dons não cessaram. Que venhamos a buscá-los com fé para a edificação do Corpo de Cristo.

  II. OS DONS DE SERVIÇO, ESPIRITUAIS E MINISTERIAIS  

1. Dons relacionados ao serviço cristão. Em Romanos 12 o apóstolo Paulo admoesta a igreja, lembrando-a de que o membro do Corpo de Cristo não pode se achar autossuficiente. Assim como um membro do corpo humano depende dos outros para exercer a sua função, na igreja necessitamos uns dos outros para o fortalecimento da nossa vida espiritual e comunhão em Cristo. Por isso, a categoria de dons apresentada em Romanos 12 traz a ideia da manutenção dessa comunhão dos santos, pois ao falarmos de serviços, subentende-se que quem serve está prestando um serviço para alguém. Observe os dons de serviço listados por Paulo em Romanos: Ministério (oficio diaconal), exortação (encorajamento), repartir, presidir e exercer misericórdia. Note que esses dons estão relacionados com uma ação em prol do outro, do próximo. Portanto, se você tem um dom, deve usá-lo em benefício da Igreja de Cristo na Terra.

2. Conhecendo os dons espirituais. "Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes" (1 Co 12.1). Os dons listados em I Coríntios 12 são: Palavra da sabedoria; palavra da ciência; fé; curas; operação de maravilhas; profecia; discernimento de espíritos; variedades de línguas; interpretação de línguas.

Apesar de as manifestações sobrenaturais pertencerem ao mundo espiritual, isto é, a uma categoria particular da experiência religiosa do crente, o apóstolo Paulo desejava que as igrejas, e em especial a de Corinto, conhecessem algumas considerações importantes sobre os dons espirituais. Uma característica predominante em Corinto, segundo o Comentário Bíblico Beacon (CPAD), era a vida pregressa dos membros envolvidos com idolatria. Muitas manifestações espirituais na igreja lembravam a experiência mística das religiões de mistérios. Os coríntios precisavam ser ensinados de forma correta sobre a existência dos dons e de sua utilização dentro do culto e fora dele. Por isso, à luz da Palavra de Deus, devemos ensinar a respeito dos dons espirituais para que a igreja seja edificada. A Bíblia traz os ensinos corretos sobre o uso dos dons, e se há distorções nessa esfera, estas acontecem por algumas igrejas não ensinarem de forma correta o que a Bíblia diz, e isso contribui para o surgimento do fanatismo religioso, da corrupção doutrinária dos movimentos estranhos e de muitas heresias. Portanto, o ensino correto das Escrituras nos orienta sobre a forma adequada da utilização dos dons e previne o surgimento de práticas condenáveis no culto. 

3. Acerca dos dons ministeriais. A Epístola de Paulo aos Efésios classifica os dons ministeriais assim: Apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e doutores (4.11). Os propósitos de o Senhor concedê-los à Igreja, segundo a Bíblia de Estudo Pentecostal, são, em primeiro lugar, capacitar o povo de Deus para o serviço cristão; em segundo, promover o (crescimento da igreja local; terceiro, desenvolver a vida espiritual dos discípulos de Jesus (4.12-16). O Senhor deu a sua Igreja ministros para servi-la com zelo e amor (1 Pe 5.2,3). O ensino do Novo Testamento acerca do exercício ministerial está ligado a concepção evangélica de serviço (Mt 20.20-28; Jo 13.1-11), jamais à perspectiva centralizadora e sacerdotal do Antigo Testamento.

Os dons espirituais ou carismáticos são manifestações espirituais ou poderes, concedidos pelo Espírito Santo com o propósito maior de glorificar a Cristo. O Novo Testamento faz uso da expressão pneumática (gr. derivada de pneuma, “espírito”), indicando que a expressão “dons espirituais” refere-se às manifestações sobrenaturais concedidas como dons da parte do Espírito Santo, e que operam através dos crentes, para o seu bem comum (w. 1,7; 14.1). A expressão pneumatikon, usada por Paulo (1 Co 12.1), refere-se a “coisas espirituais”, entendidas como os dons espirituais. Após a ressurreição de Cristo, Ele se credenciou, diante de Deus, dos anjos e dos poderes do mal, para dar “dons aos homens” (Ef 4.8). Indo além dos “dons naturais”, Jesus resolveu capacitar seus servos, integrantes de sua Igreja, dando-lhes dons (carismas), que são postos à disposição de todos os salvos, no seio da comunidade cristã. Esses dons não são privilégio ou exclusividade dos líderes, dos pastores, evangelistas, presbíteros, ou dos ensinadores da igreja. Eles estão à disposição dos santos, para que, por eles, o Senhor realize seus propósitos especiais. Ele os reparte “particularmente a cada um como ele quer” (1 Co 12.11).

A Igreja de Jesus é “...a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para” anunciar “as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2.9). Esse povo é “o seu Corpo”, do qual Ele é a cabeça (Cl 1.18). A Igreja é a “...universal assembleia e igreja dos primogênitos, que estão inscritos nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados” (Hb 12.23). E não pode ser confundida com “igrejas e igrejas”, que existem, cuja origem não é divina, mas humana e criadas com propósitos humanos. Os dons espirituais contribuem para estabelecer e demonstrar a diferença entre “igrejas” e a Igreja de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.

O CONHECIMENTO DOS DONS ESPIRITUAIS - Os salvos em Cristo Jesus não podem ser ignorantes acerca dos dons espirituais (1 Co 12.1-3). É interessante, ainda que no aspecto negativo, como há falta de ensino, em muitas igrejas, acerca do batismo com o Espírito Santo e mais ainda sobre os dons espirituais. Essa omissão contribui para a ignorância acerca dos dons, e dá lugar a comportamentos estranhos, de origem carnal e emocional, como expressões falsas de espiritualidade. É o caso do “cair no espírito”, quando certos pastores ou pregadores, sem base bíblica, dão palavras de ordem a pessoas incautas e carentes de ensino, e elas caem desmaiadas. E isso é visto como “elevado sinal de espiritualidade”. Quanto mais pessoas o pregador “derrubar”, é visto como muito espiritual. Se não derrubar crentes não é espiritual!

A NECESSIDADE DOS DONS ESPIRITUAIS - A Igreja, como “Corpo de Cristo”, precisa de poder, de unção e de manifestações espirituais, que se expressam genuinamente através dos dons espirituais. Esses dons são indispensáveis à unidade e à ação da Igreja, por diversas razões.

1) Na espera pela vinda de Jesus. Em toda a sua história, desde sua fundação por Jesus Cristo, a Igreja tem sido a instituição mais atacada pelas forças do mal. Ela nasceu debaixo da perseguição. Impérios humanos tentaram destruí-la, apagando seu nome da face da terra. Filosofias humanistas e materialistas tentaram sufocá-la, abafando sua mensagem; sistemas políticos totalitários e ateístas, a serviço do Diabo, tentaram eliminar sua influência no mundo. Os ataques contra a integridade espiritual da Igreja continuam, ao longo dos séculos. Como Noiva do Cordeiro, Ela precisa de poder para vencer às mais diferentes investidas malignas, na longa espera pelo Noivo. Ainda que, no século XXI, haja, no meio das igrejas locais, recursos que os primeiros cristãos não possuíam, em termos teológicos, educacionais ou tecnológicos, o único recurso que lhe dá condições de suplantar o império do mal é o Poder do Espírito Santo. E este poder se manifesta na operação sobrenatural dos dons espirituais.

2) Os dons espirituais fazem a diferença. Na parábola das Dez Virgens (Mt 25.1-13), Jesus demonstrou a seus discípulos que a chegada do Noivo poderia demorar. As cinco virgens loucas representam a parte da Igreja que não estará preparada para esperar a Volta de Jesus. As virgens prudentes representam os crentes salvos, que, além de terem o “azeite” nas lâmpadas, ou em suas vidas e testemunho, têm “azeite” nas vasilhas de reserva. O “azeite” representa a presença e o poder do Espírito Santo na vida dos crentes que vão subir ao encontro do Senhor Jesus Cristo (cf. 1 Ts 4.16,17). Os dons espirituais é que fazem a diferença, atuando no meio da igreja, nesses “tempos trabalhosos” (2 Tm 3.1), em que a pecaminosidade e a rebeldia contra Deus estão aumentando. Há milhares e milhares de “igrejas”, mas só vão subir ao encontro do Noivo os crentes salvos, santos e irrepreensíveis para a vinda de Jesus (1 Ts 5.23).

3) Os dons podem ser abundantes. A igreja de Corinto é um exemplo eloquente de que uma igreja cristã pode experimentar a ocorrência de uma variedade enorme de dons espirituais. Na introdução à sua primeira Carta aos Coríntios, Paulo tece considerações elogiosas àqueles crentes, acentuando que nenhum dom (espiritual) lhes faltava, “esperando a manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Co 1.7), que os haveria de confirmar até o fim para serem” irrepreensíveis no Dia de Nosso Senhor Jesus Cristo (1 Co 1.8).

4) Os dons são indispensáveis à evangelização. A missão da Igreja, levada a efeito através das igrejas locais, é de proclamar o evangelho. Nos tempos pós-modernos, a incredulidade, a frieza e a indiferença pelo evangelho de Cristo é tão grande e tão latente, que, sem a manifestação espiritual de forma evidente, as pessoas não vão saber discernir entre os falsos evangelhos e o verdadeiro evangelho de Jesus. Sempre houve essa necessidade. Nos primórdios da evangelização, através de Jesus Cristo, as pessoas criam nEle, a ponto de multidões segui-lo, hão só pela sua mensagem que tinha autoridade, e fazia diferença (Jo 7.46), mas, principalmente, por causa dos sinais e prodígios que Ele fazia.

DONS MINISTERIAIS (Ef 4.11) – Ministérios são serviços ou funções exercidos na igreja local, como parte do Corpo de Cristo, que é a sua Igreja. No âmbito cristão, ministérios são serviços que devem ser exercidos por pessoas que tenham a mentalidade de servas de Cristo. Quem não pode ser servo não pode ser ministro na Igreja de Cristo. Ele disse que não veio para ser servido, mas para ser servo (Mt 20.28). 1

O LADO ESPIRITUAL DA IGREJA – A Igreja de Jesus Cristo é espiritual e humana. No lado espiritual, precisa de poder espiritual, de sabedoria espiritual, de capacitação espiritual. Daí, a necessidade dos dons espirituais, como foi visto no item anterior. O lado espiritual reflete a natureza da Igreja como organismo, ou o Corpo de Cristo, Paulo discerniu bem o aspecto espiritual da Igreja, como organismo espiritual ao dizer: “Antes, seguindo a verdade em caridade, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor” (Ef 4.15,16).

O LADO HUMANO DA IGREJA – No lado humano, a Igreja precisa de liderança. E esta não pode ser exercida apenas pela capacidade humana, intelectual, teológica, por mais que tais capacitações sejam importantes. A liderança eclesiástica deve ser espiritual, ministerial e administrativa. Os ministérios ou serviços (gr. diakonion), indispensáveis ao ordenamento e o funcionamento da igreja dependem da graça de Deus. Os dons ministeriais fortalecem a unidade da Igreja, atuando de modo equilibrado ao lado dos espirituais. Os líderes cristãos podem ter formação secular ou teológica, mas não podem prescindir da legitimação através dos dons que os capacitam para liderar o Corpo de Cristo na Terra. Antes de tudo, precisam ter convicção da chamada de Deus para serem servos-líderes. Jesus, o Dono e Senhor da Igreja, só dá dons a homens que têm esse perfil de homens-servos. Os dons espirituais estão à disposição de todos os crentes, de todos os salvos. Mas os dons ministeriais são específicos para homens que têm a chamada de Deus para o ministério de servir à Igreja.

SUBSÍDIO TEOLÓGICO

"Os dons são dados, de fato, com a intenção divina de que todos recebam proveito deles (1 Co 12.7). Isso não significa que todos têm um dom específico, mas há dons (manifestações, revelações, meios pelos quais o Espírito se torna conhecido) que são dados (continuamente) para o que for útil (proveitoso, para crescimento). 'Útil' significa algo que ajuda, especialmente na edificação da Igreja, tanto espiritualmente como em número de membros. (O Livro de Atos tem um tema de crescimento numérico e geográfico. Deus quer que o Evangelho seja divulgado em todo o mundo). Pode ser ilustrado pelo mandamento do Senhor: 'Negociai até que eu venha' (Lc 19.13). Ao partirmos para o ministério dos seus dons, Ele nos ajuda a crescer na eficiência e na eficácia, assim como fizeram os que usaram devidamente o que o Senhor lhes deu, na Parábola das Dez Minas (Lc 19.15-19)" (HORTON, Stanley M. A Doutrina do Espirito Santo no Antigo e Novo Testamento. 12. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2012, pp. 229,30).

 III. CORINTO: UMA IGREJA PROBLEMÁTICA NA ADMINISTRAÇÃO DOS DONS ESPIRITUAIS (1 Co 12.1-11)

1. Os dons são importantes. Um argumento utilizado pelos cessacionistas (pessoas que defendem a errônea ideia de que os dons espirituais cessaram no primeiro século), é que os crentes pentecostais tendem a se achar superiores uns aos outros por terem algum dom. Lamentavelmente, isto é verdade em muitos lugares. Entretanto, o apóstolo Paulo faz questão de tratar desse assunto com os crentes de Corinto que estavam supervalorizando alguns dons em detrimento de outros. Precisamos resgatar a noção de serviço que Jesus Cristo ensinou nos Evangelhos, pois todos os dons vêm diretamente de Deus para melhor servirmos à igreja de Cristo.

2. Diversidade dos dons. O que mais nos chama a atenção na lista de dons apresentada por Paulo em 1 Coríntios 12 não são os nove dons, mas a diversidade deles. Isto denota a unidade da Igreja de Cristo, mas simultaneamente a sua multiplicidade. O Comentário Bíblico PentecostaI Novo Testamento tem razão quando fala que "talvez Paulo tenha selecionado estes noves dons por serem adequados à situação que havia em Corinto", pois se compararmos a lista de 1 Coríntios com Romanos e também Efésios, veremos que outros dons são relacionados de acordo com as necessidades de cada igreja local.

3. Autossuficiência e humildade. Os dons espirituais são concedidos aos crentes pela graça de Deus, e não por méritos pessoais (Rm 12.6; 1 Pe 4.10). Não podemos orgulhar-nos e portar-nos de modo arrogante e autoritário no exercício dos dons, mas com humildade e temor a Deus. Portanto, não use o dom que Deus lhe deu com orgulho, visando à exaltação pessoal. Isto é pecado contra o Senhor e contra a Igreja! Use-o com um coração sincero e transbordante de amor pelo próximo (1 Co 13). Não foi por acaso que o capitulo 13 (Amor) de 1 Coríntios foi colocada entre o 12 (dons) e o do 14 (língua e profecia)

Os dons espirituais devem ser utilizados na igreja, respeitados os requisitos e condições estabelecidos na palavra de Deus. Fora disso, há o risco de haver manifestações espúrias ou falsas em relação ao verdadeiro caráter dos dons.

OS DONS DEVEM SER EXERCIDOS COM AMOR – A divisão da Bíblia em capítulos só ocorreu em 1227 e, em versículos, em 1551. Quando se lê o capítulo 12 de 1 Coríntios, sobre os dons espirituais e se passa para o capítulo seguinte, sobre o amor cristão, tem-se a impressão de que são temas distintos. Na verdade, originalmente, antes da divisão da Bíblia em capítulos, o texto dos capítulos 12 a 14 trata do mesmo tema dos dons.

Paulo termina o capítulo 12, com sua belíssima dissertação sobre os dons espirituais, com uma exortação por demais relevante, dizendo: “Portanto, procurai com zelo os melhores dons; e eu vos mostrarei um caminho ainda mais excelente” (1 Co 12.31 — grifo nosso). Que “caminho ainda mais excelente” é esse? A resposta vem de imediato, na ligação entre o último versículo do capítulo 12 e o primeiro versículo do capítulo 13, quando o apóstolo dá sequência ao seu precioso ensino sobre os dons espirituais. E afirma de modo peremptório: “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos e não tivesse caridade, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse caridade, nada seria” (1 Co 13.1,2).

Fica bem claro que, se os crentes tiverem dons espirituais em abundância, mas não tiverem amor, o exercício desses carismas de nada adianta diante de Deus. Nesses dois versículos Paulo mostra a síntese da inutilidade dos dons, quando usados sem amor.

OS DONS DEVEM SER USADOS DE ACORDO COM A PALAVRA – A Palavra de Deus deve ser a referência número um para qualquer atividade ou manifestação na igreja? “Lâmpada para os meus pés é tua palavra e luz, para o meu caminho” (SI 119.105). E o Espírito Santo quem inspira a Palavra de Deus e a seus escritores. Logo, não há nenhuma justificativa para que um dom seja exercido em desacordo com os preceitos da Palavra de Deus.

OS DONS NÃO DÃO ORIGEM A DOUTRINAS – A fonte primordial e única de qualquer doutrina, na igreja cristã, é a Palavra de Deus. É altamente danoso para a integridade espiritual de qualquer igreja, quando um líder, ou um outro membro da igreja, apresenta como doutrina aquilo que não tem fundamento na Bíblia. Determinado obreiro ensinou que os crentes que possuem internet estão em pecado. Para se dizer que algo é pecado é necessário fundamentar na Palavra de Deus. Na realidade, tal ensino é fruto de opinião pessoal do líder. Do contrário, é imposição autoritária, que só traz prejuízo à obra do Senhor. Ensinar que quem usa a internet de maneira ilícita, para visualizar coisas que não agradam a Deus, está pecando, é correto, mas afirmar que possuir internet é pecado é abuso de autoridade ministerial. Não há necessidade de outra fonte de doutrina além da Palavra de Deus (G1 1.8,9).

QUEM TEM UM DOM DEVE SER MAIS HUMILDE – Os dons espirituais são parte das riquezas sobrenaturais, concedidas pelo Espírito Santo aos servos do Senhor, com o objetivo de servir à igreja. Jamais o portador de um dom deve orgulhar-se e portar-se de modo arrogante ou autoritário. Deve agir, sabendo que “Temos, porém, esse tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós” (2 Co 4.7). Nunca devemos esquecer de que o Espírito Santo glorifica a Cristo e não ao homem (Jo 16.14). Se o que tem o dom não tiver essa consciência de humildade, poderá perder a graça para usá-lo. Deus não admite que o seu louvor seja transferido para ninguém.

SUBSÍDIO TEOLÓGICO

 "[Dons espirituais]

Os dons espirituais, que são pela graça, mediante a fé, encontra-se na palavra grega mais usada para descrevê-los: charismata, 'dons livre e graciosamente concedidos', palavra esta que se deriva de charis, graça, o imerecido favor divino. Os carismas são dons que merecemos sem os merecermos. Dão testemunho da bondade de Deus, e não da virtude de quem os receberam.

Uma das falácias que frequentemente engana as pessoas é a ideia de como Deus abençoa ou usa alguém; isso significa que Ele aprova tudo o que a pessoa faz ou ensina. Mesmo quando parece haver uma 'unção', não há garantia disso. Quando Apolo chegou a Éfeso pela primeira vez, não somente era eloquente em sua pregação; era também 'fervoroso de espírito'. Tinha o fogo. Mas Priscila e Áquila perceberam que faltava algo. Logo, o levaram (provavelmente, para casa, a fim de participar de uma refeição), e lhe explicaram com mais exatidão o caminho de Deus (At 18.25,26).

Era, pois o caminho de Deus a respeito dos dons espirituais, que Paulo, como um pai, desejava explicar com mais exatidão aos coríntios. A esses dons ele dá o nome de 'espirituais' em 1 Coríntios 12.1 (a palavra dom não se encontra no grego). A palavra, por si mesma, inclui algo dirigido pelo Espírito Santo [...] " (HORTON, Stanley M. A Doutrina do Espirito Santo no Antigo e Novo Testamento. 12. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2012, p. 225).

   CONCLUSÃO

O estudo dos dons de Deus aos homens é amplo e nos apresenta recursos pelos quais podemos servir ao Senhor e a sua Igreja. Esses dons são para os nossos dias, pois não há na Bíblia nenhum versículo que diga que os dons espirituais deixaram de existir com a morte do último apóstolo. Portanto, busquemos os dons do Espírito Santo, pois estão à nossa disposição. Eles são um exemplo da multiforme graça de Deus em dispensar instrumentos espirituais para a Igreja na história. – A Igreja de Cristo Jesus, nestes tempos que antecedem à sua Vinda, precisa mais do que nunca do exercício e da experiência concreta dos dons espirituais e ministeriais. Espiritualidade sem organização ministerial pode levar a práticas fanáticas de falsos exemplos de espiritualidade. O exercício dos ministérios, sem a demonstração do poder de Deus, atuando pelos dons espirituais, seguramente leva à frieza institucional, transformando igrejas em meras instituições religiosas.

REFERÊNCIAS

LIÇÕES BÍBLICAS. 2º Trimestre 2021 - Lição 1. Rio de Janeiro: CPAD, 04, abr. 2021.

LIMA, Elinaldo Renovado de. Dons Espirituais e Ministeriais: servindo a Deus e aos homens com poder extraordinário. Rio de Janeiro: CPAD, 2021.

STAMPS, Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 1997.