Vivemos tempos de uma prolongada
crise, um momento em que os valores tradicionais têm sido diluídos em meio a um
emaranhado cultural cada vez mais cético, humanista e pragmático. A sede e fome
de Deus tem sido ludibriada por um empanturramento de futilidades (as igrejas
arquitetonicamente parecem cada vez mais shoppings, e os shoppings ganham um ar
de pureza e paz religiosa), um assoberbamento de tarefas a cumprir (a adoração
genuína e generosa é trocada pelo ativismo religioso que se caracteriza pela
competitividade doentia e arrogância vazia), e uma falsa sensação de companhia
em virtude das múltiplas conexões digitais (são inúmeros aplicativos de
relacionamentos, alto desenvolvimento tecnológico associado às empresas de
comunicação, porém, nunca as pessoas estiveram tanto tempo solitárias e
isoladas, mesmo quando estão na mesma mesa para refeições).
Estabelece-se assim, uma
perigosa ilusão, desenvolve-se um Cristianismo difuso.
Para algumas pessoas a simples
identificação com uma determinada comunidade religiosa já lhes concederia o
direito de se autodefinirem como cristãs. Esses indivíduos não conseguem
discernir a diferença entre seguidor (aquele que empreende longas jornadas em
busca de interesses pessoais) e discípulo (aquele que está disposto a moldar-se
de acordo com o caráter de Jesus); essa multidão não é capaz de diferenciar o
frequentador (aquele que se declara "evangélico nominal", cuja
participação semanal nos cultos tem muito mais uma finalidade de
"desencargo de consciência" do que de serviço e adoração) e a
testemunha (aquele que se identifica tão radicalmente com Cristo que é capaz,
se necessário, de morrer por seu Mestre).
Fabrica-se uma subcultura
pseudoevangélica com o intuito de produzir nos cristãos nominais uma ilusória
sensação de pertença. Daí nasce um dialeto próprio - o "evangeliquês"
- com gírias e expressões inteligíveis apenas para os participantes do gueto
social; patrocina-se uma moda gospel que, aliada a uma produção artística
gospel, gera mais rendimentos financeiros do que qualquer bem-estar espiritual.
O resumo deste estado-de-coisas
é que as pessoas vêm às igrejas, mas não tem comunhão (encontramos
igrejas-shoppings lotadas de pessoas, no entanto cada uma destas está solitária
em seu próprio mundo de ambições, desejos e ganância); os frequentadores de
cultos cantam e tocam músicas religiosas, porém estão bem distantes de qualquer
adoração (As igrejas-shoppings investem muito em uma sofisticada engenharia
sonora, porém o interesse parece mais em manipular as emoções das pessoas do
que levá-las a uma comunhão genuína com o salvador); os carros e roupas dessas
pessoas trazem slogans ou frases religiosas, todavia, seus corações e caráteres
manifestam a decadência de quem nem sabe de fato quem Jesus é.
Nasce assim um perigoso e
monstruoso construto social deste tempo: um Cristianismo sem Cristo.
Por fim, um dado extremamente
preocupante que caracteriza de modo emblemático toda essa celeuma religiosa de
nosso tempo, é que entre os jovens tanto cresce o número de ateus como o de
participantes de igrejas-shoppings que anunciam um evangelho-fake. Desta
maneira, se nada for feito para mudar essa situação alarmante, em poucas
gerações enfrentaremos no Brasil um colapso sem precedentes, com um
esvaziamento das igrejas que se comprometem em apresentar o Evangelho com
seriedade, bem como um efeito social danoso - em virtude do esfacelamento de
princípios ético-morais diretamente associados à vida cristã autêntica.
Pensar sobre Jesus, aprender sobre a vida do Mestre, e de modo especial
refletir sobre a maravilhosa obra da salvação que ele estabeleceu em nosso
favor, é uma exigência de nosso tempo, assim como um exercício de
comprometimento com o futuro saudável da Igreja.
O Evangelho necessita retornar às suas raízes no Brasil, e não há nada
mais fundamental no Cristianismo que a compreensão plena de quem é nosso Salvador,
pois é através dele que temos acesso ao máximo daquilo que se pode compreender
da divindade. Dito de outra forma, Jesus - através de sua vida e ensinamentos -
é o próprio mapa do céu; conhecer o Mestre - em virtude de seu amor com que
muito nos ama - é a única razão pela qual faz sentido enfrentar todos os
desafios da jornada terrena para chegar no céu.
O próprio Redentor
preocupou-se em fazer conhecido e compreendido enquanto viveu conosco; o
nascimento humilde, a vida comum em Cafarnaum, a participação em inúmeros
eventos sociais (como almoços, jantares, casamentos etc.) são algumas provas
inquestionáveis de que Jesus queria que as pessoas compreendessem quem ele era.
Já o uso de metáforas e parábolas para transmissão de sua mensagem eterna são manifestações
não só da sabedoria divina, mas também da compaixão celestial para conosco seus
filhos.
Enquanto rodeado
de pessoas humildes e simples socialmente, Jesus anunciava o Reino de Deus
falando de sementes, pescarias, fermento para bolos; já quando estava na
presença de fariseus, sacerdotes ou autoridades civis, o Cristo discursava com
a oratória de quem transbordava sabedoria.
O problema
relativo ao entendimento de quem era Jesus foi uma questão tão cara ao Mestre
que ele próprio em determinado momento questionou os seus amigos - aqueles que
ele escolheu separadamente para uma obra específica - sobre o que a população
em geral e eles mesmos entendiam sobre a pessoa do Salvador. A sinceridade da
resposta de Pedro, tanto para
apresentar a ignorância popular quanto para ressaltar o nível da revelação que
já tinha alcança dos apóstolos, é algo marcante nas páginas do Evangelho.
Jesus não pode ser
confundido com nada ou ninguém; o Redentor não é um mero agitador de multidões,
muito menos um simples sábio do Oriente, ele é o ungido de Deus para promoção
da salvação das multidões que morreram na expectativa das promessas e daqueles
que, ainda não tendo o visto, creem em suas palavras de vida eterna.
De que modo o
destino da Juventude brasileira poderá ser transformado? Dados recentes de
pesquisas sobre crimes violentos no Brasil apontam que mais de 50% das pessoas
que são assassinadas em nosso país tem entre 15 e 29 anos - isto significa um
verdadeiro genocídio da população jovem. Se refletirmos bem, a estratégia do
império das trevas aplicada no Brasil hoje assemelha-se aquela adotada pelas
nações que dominavam o povo de Deus no passado - opressão dos mais frágeis,
escravização dos sobreviventes e massacre dos mais jovens.
É urgente que a
Igreja brasileira volte seu olhar para a população jovem, evangelização,
discipulado, formação e capacitação ministeriais são deveres que a comunidade
dos que servem ao Cristo ressuscitado precisa ter com todos; e em tempos de
crise, a prioridade precisa ser concedida àqueles que estão mais vulneráveis e
frágeis.
Nenhuma igreja local não precisa ser um shopping, uma boate ou um circo
para que a juventude interesse-se em estar lá, basta que cada comunidade cumpra
sua natureza missional e comprometa-se em alcançar os carentes de salvação.
Thiago BraziL, Líder da AD em Parque Buenos Aires, Ministério Templo Centrai, em Fortaleza (CE), comentarista das Lições Bíblicas de Jovens, doutor em Filosofia, professor efetivo da UECE In: Ensinador Cristão. Rio de Janeiro: CPAD, ano 21, n. 81 p. 15-16, jan-mar. 2020.
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