SUBSÍDIO I
INTERPRETAÇÃO DA PARÁBOLA
A Parábola do Bom Samaritano tem
sido alvo das mais diversas interpretações. São conhecidas na história diversas
exposições sobre esta parábola, inclusive a realizada por Agostinho de Hipona,
que procurava ver nesta uma representação da caminhada humana ao sair do Éden (Jerusalém), e tomar o
caminho do Mundo (Jericó).
Muitas destas interpretações servem-se do método alegórico para atribuir ao
texto objetivos que o mesmo não tinha.
Tudo se inicia quando um jovem
bem-sucedido, doutor da lei, procura Jesus para pô-lo à prova (ARA) ou tentá-lo
(ARC), e o termo utilizado é ekpeirazo,
que dá a ideia de colocar à prova o “caráter” de Cristo. Aquele jovem usando de
ardil busca colocar o Mestre dos mestres em situação difícil, e quem sabe
imaginando receber algum elogio o interroga dizendo: - como farei para herdar a vida
eterna?
Jesus não questiona aquele jovem
sobre o conteúdo do primeiro mandamento, mas o questiona sobre sua exegese
particular a respeito do mesmo. Jesus lhe pergunta: - como lês? Qual tua
interpretação? De que forma você olha para este mandamento?
O jovem não entendendo apenas
limita-se a responder recitando o mandamento tal qual escrito. Jesus então o
chama à prática daquilo que bem conhecia e bem sabia recitar. Não bastaria para
Jesus que aquele jovem soubesse o conteúdo do mandamento, importava para Jesus
que ele soubesse interpretar corretamente e colocar o mandamento em ação em sua
vida. O Senhor Jesus então vaticina: Faze
isto e viverás. Coloque em prática, ame a Deus sobre todas as
coisas, ame ao teu próximo como ame a ti mesmo, e então assim fazendo estarás
apto à vida eterna.
A passagem de Lc 10.28 indica
que o cumprimento da vontade de Deus produz vida: “E disse-lhe: Respondeste
bem; faze isso e viverás”. Keener destaca que “alguns textos da lei prometiam a
vida para aquele que a mantivesse, e, essa ‘vida’ significava vida longa na
terra que o Senhor dera, porém, mais tarde, os intérpretes judeus a leram como
uma promessa de vida eterna”. Jesus aplicou o termo “viverás” em
referência à vida eterna.
“Faze isto e viverás” encontra-se no
“imperativo presente (continue fazendo isto, para sempre) e o futuro do
indicativo ativo como resultado natural”. Robertson destaca que “havia
apenas um problema com a resposta do doutor da lei, ou seja, ninguém nunca fez,
nem poderá sempre fazer o que a lei estabelece, para com Deus e os homens,
porque escorregar uma única vez é falhar. Assim, Jesus explica o problema
honestamente para o doutor da lei que queria saber o que deveria fazer.
Naturalmente, se ele observasse perfeitamente a lei, sempre, ele herdaria a
vida eterna”.
Parece-nos que nos tempos de
Jesus a hipocrisia humana, que faz com que homens conhecedores não sejam
praticantes do próprio conhecimento, já estava bem presente na sociedade
judaica. Diversos foram os embates de Cristo com fariseus e saduceus exatamente
por tal comportamento.
Não satisfeito, o jovem doutor
interroga Jesus sobre quem seria o seu próximo. Quem sabe imaginasse que dos
lábios de Jesus sairiam palavras que remeteriam a um próximo muito amado,
às pessoas queridas, às pessoas amadas e amáveis. Quem sabe imaginasse o moço
que Jesus diria que o próximo é
quem nos faz bem. É então que a parábola vem a lume. Robertson destaca que o
jovem doutor “querendo justificar-se a si mesmo, viu imediatamente que tinha se
condenado, ao fazer uma pergunta cuja resposta já conhecia, assim, no seu
embaraço, ele faz outra pergunta, para mostrar que ele tinha alguma razão, no
início”.
Jesus responde ao jovem que as
tradições e a religiosidade não podem nos dizer quem é o nosso próximo. O jovem que sai
de Jerusalém para Jericó está caído e ferido e o levita não viu nele seu próximo, o sacerdote
também não, mas o samaritano surpreendentemente assim o vê. Surpreendentemente
porque jamais um Judeu praticante da lei como aquele jovem enxergaria nos
“impuros”, nos “misturados”, nos “híbridos” samaritanos, alguém próximo seu.
Jesus, no entanto, assim o vê e aquele jovem doutor faz ver também.
Lockyer destaca que “os
samaritanos não eram puros em termos raciais, mas uma mistura de judeu e
gentio; por isso, eram odiados pelos que tinham o sangue integral do grupo
étnico judaico, e, embora os dois grupos morassem próximos uns dos outros, não
se consideravam e nem se tratavam como próximos no sentido moral da palavra”.5 Este
autor destaca também que “o doutor da lei deve ter ficado bastante surpreso,
quando Jesus apresentou o samaritano como
a única pessoa que se dispôs a ajudar aquele judeu indefeso, na estrada solitária e
perigosa. O homem que ajudou o pobre necessitado foi exatamente o que ele menos
esperava que o faria”.
Champlin destaca que a parábola
do bom samaritano foi dada a fim de ilustrar o importantíssimo mandamento da
lei: ‘Amarás ao teu próximo como a ti mesmo’, e assim, ensina quatro lições:
“(a) Jesus ensina aqui um importante princípio da ética humanitária. O próximo
pode ser uma pessoa inteiramente desconhecida. (b) O “próximo” pode ser de uma
raça diferente, e até mesmo desprezada. (c) O “próximo” pode ser pessoa de
outra religião, até mesmo conhecida como herética. (d) Contudo, os cuidados de
Deus por toda a humanidade devem manifestar-se na vida de todos quantos são
chamados pelo nome”.
Texto extraído da
obra: As Parábolas
de Jesus: As
verdades e princípios divinos para uma vida abundante. 1. ed. Rio de
Janeiro: CPAD, 2018
COMENTÁRIO E
SUBSÍDIO II
INTRODUÇÃO
Em diversos momentos,
Cristo aplicou-se a fazer com que as pessoas compreendessem que seu Reino não
era deste mundo (Jo 18.36), ou seja, que as lógicas, o modo de pensar e de agir
deste mundo não se coadunam com o Reino celestial. A conhecida parábola do “bom
samaritano”, sem sombra de dúvidas, é um destes momentos preciosos, no qual o
Mestre serviu-se deste método didático para trazer aos seus discípulos, e a
todos quanto o ouviam e, por extensão, a nós, um novo conceito sobre “quem” é o
nosso próximo e como devemos proceder em relação a ele.
“Os rabis judeus, como alguns teólogos e
estudiosos da Bíblia de hoje, gostavam de debater pontos importantes e
delicados da doutrina, e esse intérprete (estudiosos da lei do Antigo
Testamento) queria ouvir o que Jesus tinha a dizer a respeito do assunto.
Ficamos com a impressão de que o homem não buscava a verdade, mas apenas queria
envolver Jesus em um debate que ele esperava vencer. O intérprete mostrou-se
evasivo quando o assunto se voltou para o enfrentamento honesto da verdade e a
obediência a ela. Nossa maior responsabilidade é obedecer ao mandamento mais
importante, o qual o intérprete cita com exatidão a partir de Levítico 19.18 e
Deuteronômio 6.5. Todavia, não podemos amar a Deus e ao nosso próximo com
perfeição até termos o amor do Senhor em nosso coração (Rm 5.5; 1Jo 4.19). Como
podemos sequer esperar agradar a Deus se não conseguirmos guardar o principal
mandamento (Mc 12.28-34)? É muito importante saber que somos salvos pela fé,
não por guardar a Lei, mas, uma vez que a pessoa seja salva, pode depender do
Espírito para ajudá-la a encher seu coração de amor. Jesus apresenta a parábola
do bom samaritano em resposta à pergunta evasiva do intérprete. A expressão
“Defina seus termos” é uma velha cilada dos intérpretes e debatedores. Jesus,
em vez de envolver-se com termos abstratos, apresenta um caso concreto, e o
intérprete entendeu o ponto. Não devemos “espiritualizar” essa parábola e
transformá-la em uma alegoria da salvação. O ponto é apenas que seu próximo é
qualquer pessoa que precise de ajuda, qualquer pessoa que você possa ajudar. O
“herói” da história é o samaritano que cuidou do judeu, mas o sacerdote e o
levita — trabalhadores religiosos profissionais — não são heróis de forma
alguma. A pergunta a que devemos responder não é: “Quem é nosso próximo?”, mas:
“De quem eu posso ser o próximo?””
I. A INTERPRETAÇÃO
DA PARÁBOLA DO BOM SAMARITANO
1.
Uma parábola com diversas interpretações. A parábola do bom samaritano, ao
longo da história, tem sido alvo das mais diversas interpretações. Muitas e
conhecidas são as exposições sobre esta parábola, inclusive algumas famosas e
realizadas por grandes vultos da história cristã, que procuravam ver, por
exemplo, nesta narrativa uma representação da caminhada humana ao sair do Éden
(Jerusalém), e tomar o caminho do mundo (Jericó). Muitas destas interpretações
servem-se do método alegórico para atribuir ao texto alguns objetivos que ele
não tem.
“Quem possui um conhecimento mínimo dos
princípios hermenêuticos básicos, logo perceberá que essa é uma interpretação
extremamente alegórica da parábola em foco. Porém, importa destacar que esse
tipo de interpretação é, ainda hoje, a adotada por muitos cristãos. Mas, será
que tal passagem bíblica quer dizer isso mesmo? O que se segue é uma análise da
parábola, tendo como pano de fundo o contexto histórico – cultural sob o qual
ela foi escrita. Inicialmente, é preciso notar que, apesar da parábola
propriamente dita começa no v. 30 da referência acima indicada, a sua análise
deverá ser feita a partir do v. 25, que é de onde extraímos o contexto mais
geral para a sua interpretação. Nesse verso, nos é dito que numa dada ocasião
se levantou um doutor da lei (provavelmente um fariseu), chamou Jesus de
mestre, e lhe fez uma pergunta um tanto maliciosa. A pergunta foi: “que farei
para herdar a vida eterna?”. No v. 26, Jesus responde essa questão com outra
pergunta: “que está escrito na lei? Como lês? Como interpretas?”. No v. 27, o
referido doutor da lei responde a pergunta de Jesus da seguinte maneira: “amar
a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Jesus imediatamente
o elogia e determina que, se ele quisesse obter a vida, deveria fazer
exatamente isso (v. 28). Entretanto, como nos diz o v. 29, o doutor, querendo
justificar-se, propõe outra questão ao mestre: “e quem é o meu próximo?”. É
exatamente a partir dessa pergunta que Jesus conta a conhecida “ parábola do
bom samaritano””. (Texto de Gerson Júnior, doutorando em
filosofia na Universidade de Lisboa, e professor nos cursos de administração e
teologia da Faculdade de Teologia Integrada – FATIN).
2.
Pondo Jesus à prova ou “tentando-o”. O Mestre conta essa parábola porque um doutor
da Lei, bem-sucedido, procura-o para “pô-lo à prova” (ARA) ou “tentá-lo” (ARC),
conforme consta no versículo 25.0 termo grego utilizado oferece a ideia de
colocar à prova o “caráter” de Cristo. Isso mostra que aquele homem, de maneira
ardilosa, busca colocar o Mestre dos mestres em situação difícil e, quem sabe
imaginando receber algum elogio, o interroga dizendo: “Mestre, que farei para
herdar a vida eterna?” (v.25).
A parábola do Bom
Samaritano inicia-se exatamente a partir do versículo 30, mas sua análise deve
iniciar a partir do versículo 25 para chegarmos a uma perfeita interpretação.
Nesse verso, nos é dito que numa dada ocasião se levantou um doutor da lei
(provavelmente um fariseu), dirigindo-se a Jesus o chamou de mestre e lhe fez
uma pergunta maliciosa: “que farei para herdar a vida eterna?”. A
parábola então é a resposta à uma segunda pergunta maliciosa: “e quem é o
meu próximo?”. É exatamente a partir dessa pergunta que Jesus conta a
parábola do bom samaritano e critica a falsa religiosidade tão evidente na
seita dos Fariseus. A falsa religiosidade é o ato de apenas ter uma religião,
praticar rituais ou aparentar ser um crente. É a hipocrisia, a falsidade. O
sacerdote e o levita deveriam exercitar seu amor por alguém que precisava, já
que tinham o conhecimento da vontade de Deus.
3.
“Como lês?” Jesus, como é de costume, “responde” com outra pergunta (v.26). Ao
perguntar sobre o conteúdo do mandamento, Jesus não questiona aquele doutor
para ver se ele o conhecia, isto é, sua pergunta demonstra interesse na forma
particular de interpretação do mandamento por parte daquele homem. Jesus quer
saber como o doutor lê, como o interpreta e de que forma olha para o
mandamento. O homem não compreendendo limita-se a responder recitando o
mandamento tal como está escrito (v.27). Percebendo Jesus que o homem conhecia
muito bem o texto a ponto de recitá-lo, o Mestre então o chama à prática
(v.28). Para Jesus não bastava que aquele doutor soubesse o conteúdo do
mandamento, antes, ao Mestre importava que o homem soubesse interpretar
corretamente e, muito mais importante, colocar o mandamento em ação em sua
vida. Por isso, o Senhor Jesus diz: “faze isso e viverás” (v.28).
No versículo 27, o doutor da Lei responde a pergunta
de Jesus da seguinte maneira: “amar a Deus sobre todas as coisas e ao
próximo como a si mesmo”. Jesus imediatamente o elogia e determina que, se
ele quisesse obter a vida, deveria fazer exatamente isso (v 28). O doutor da
Lei respondeu à pergunta de Jesus citando Deuteronômio 6.5, um texto que era
recitado duas vezes ao dia por todo judeu fiel. Este texto resumia o padrão
ético central da Lei. O doutor também aludiu a Levítico 19.18. O fundamento da
resposta do homem é uma expressão de lealdade e devoção que também pode ser
vista como a demonstração natural de fé, visto que a pessoa por completo — o
coração, a alma, as forças e o entendimento — está envolvida. O tema do amor a
Deus é desenvolvido nos versículos 38 a 42, com sua ênfase na devoção a Jesus,
e em Lucas 11.1-13, onde os discípulos são instruídos a serem devotos a Deus em
oração. Entenda que ao elogiar o doutor da Lei e exortá-lo a fazer o que
conhecia, Jesus não estava dizendo que a retidão é o resultado das obras. Ele
dizia que o amor e a obediência a Deus são as consequências naturais quando se
coloca a fé no Senhor. Aqueles que acreditam em Jesus e seguem-no receberão
recompensas eternas. Jesus estabeleceu este princípio a Pedro em Mateus
19.27-30.
4. Questão
principal. Não satisfeito, o doutor da Lei quer saber de Jesus “quem” seria o seu
próximo (v.29). Pode ser que ele até tenha imaginado que Jesus revelaria o nome
de um ente querido ou um amigo muito amado. Quem sabe imaginou que Jesus diria
que o próximo é apenas quem nos faz bem. É neste contexto então que a Parábola
é contada pelo Senhor. Jesus, ao contar a parábola, deixa claro que as
tradições e a religiosidade não podem ensinar-nos acerca de quem é o nosso
próximo. O homem que desceu de Jerusalém para Jericó estava caído e ferido
(v.30), porém, o sacerdote não o viu como seu próximo e o levita também não
(vv.31,32), mas o samaritano, surpreendentemente, assim o enxergou (v.33).
Surpreendentemente porque jamais um judeu praticante da Lei, como aquele
doutor, enxergaria nos “impuros” e “mestiços” samaritanos, alguém próximo seu.
Jesus, no entanto, assim o vê e quer que aquele doutor da Lei veja também.
“Lucas
deixa claro que o doutor estava tentando colocar-se em posição de satisfazer as
mais altas exigências da Lei. E quem é o meu próximo? Esta pergunta era uma
tentativa de limitar as demandas da Lei pela sugestão de que algumas pessoas
seriam identificadas como o próximo e outras não. O doutor da Lei estava
buscando a obediência mínima, enquanto Jesus queria a obediência absoluta.”
(BIBLIOTECA BIBLICA). Para entender porque
judeus não se davam com samaritanos. No versículo 36, Jesus pergunta ao doutor
da lei: “qual desses três te parece que foi o próximo do homem caído”? O
doutor, encurralado, responde: “o que usou de misericórdia para com ele”.
Então disse Jesus: “vai e faze da mesma maneira”.
SUBSÍDIO EXEGÉTICO
“Jesus poderia ter enfatizado ao doutor da lei que a
vida eterna é um dom de Deus, mas ele não tenta corrigir o pensamento do doutor
da lei. Ele sonda a compreensão que este perito tinha da lei, perguntando: ‘Que
está escrito na lei? Como lês?’ Sabendo que o homem era perito na lei de
Moisés, Jesus pergunta como ele entende as Escrituras. O doutor da lei responde
unindo os mandamentos de amar Deus de todo o nosso ser (Dt 6.5) e amar o
próximo como a nós mesmos (Lv 19.18). Jesus concorda com a análise, mas o
doutor da lei avança e se concentra na questão do ‘próximo’ (plesion). Os
judeus limitavam o significado do termo próximo aos integrantes da própria
nação, exceto os samaritanos e estrangeiros ([...]). Jesus redefine a palavra,
ampliando seu significado. O amor do próximo cresce por amor a Deus e deve ser
igual ao nosso amor por nós mesmos” (ARRINGTON, F. L. In ARRINGTON, French L.;
STRONDAD, Roger (Eds.). Comentário Bíblico Pentecostal. 1.ed. Rio de Janeiro:
CPAD, 2003, pp.387-88).
II. COMPAIXÃO
E CARIDADE SÃO INTRÍNSECA À FÉ SALVADORA
1.
Compaixão. A parábola, como um todo, é marcante, mas um momento indispensável em
qualquer reflexão sobre ela está no versículo 33, quando o Mestre diz que o
samaritano “chegou ao pé dele e, vendo-o, moveu-se de íntima compaixão”. A
“compaixão” aqui se refere a um sentimento intenso que causa tanto incômodo a
ponto de alterar não apenas a consciência, ou o pensamento, mas também o
aspecto físico, pois o texto diz que o samaritano “moveu-se”.
“Compaixão é um sentimento típico dos seres
humanos e que se caracteriza pela piedade e empatia em relação à tristeza
alheia. A compaixão desperta a vontade de ajudar o próximo a superar os seus
problemas, consolando e dando suporte emocional”.
“A benignidade do Senhor jamais acaba, as suas
misericórdias não têm fim; renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade.”
(Lm 3.22-23) As misericórdias de Deus provêm de Seu amor incondicional e tem
como resultado a compaixão.
“O Evangelho registra que Jesus, em suas andanças
“por todas as cidades e povoados”, ao ver as multidões, tinha compaixão delas
“porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor” (Mt 9.35-38).
Pouco adiante, Mateus volta a registrar: “Quando Jesus saiu do barco e viu tão
grande multidão, teve compaixão deles e curou os seus doentes” (Mt 14.14).
Jesus mesmo expressa verbalmente esse sentimento por ocasião da segunda
multiplicação de pães e peixes: “Tenho compaixão desta multidão” (Mt 15.32).
Porque Jesus não só enxergava, mas também se compadecia do sofrimento alheio,
muitos clamavam e gritavam diante dele: “Filho de Davi, tem misericórdia de
nós”. É o caso dos dois cegos (Mt 9.27), da mulher cananéia cuja filha estava
endemoninhada e sofrendo muito (Mt 15.22), do homem cujo filho também estava
endemoninhado e era jogado ora no fogo ora na água para ser morto (Mc 9.22), do
cego Bartimeu, que pedia esmola numa rua de Jericó (Mc 10.47). A compaixão de
Jesus pelo sofrimento alheio ia muito além do mero sentimento. Ele se entregava
ao ministério de aliviar os outros de suas dores. O povo lhe trazia “todos os
que estavam padecendo vários males e tormentos: endemoninhados, epiléticos e
paralíticos” e ele os curava (Mt 4.23-25)”. (ULTIMATOONLINE)
2.
Cuidado. O versículo 34 diz que o samaritano “aproximando-se, atou-lhe as
feridas, aplicando-lhes azeite e vinho; e, pondo-o sobre a sua cavalgadura,
levou- -o para uma estalagem e cuidou dele”. Essa ação toca no aspecto da
prática do amor, isto é, o cuidado, contida no mandamento, pois este ordena:
“Amarás ao Senhor, teu Deus […] e ao teu próximo como a ti mesmo” (v.27 cf. Lv
19.18). 0 amor de que trata o mandamento, não é retórico e muito menos
platônico, isto é, existindo apenas no mundo das ideias. Deus nos mostra e
exemplifica o amor verdadeiro no texto de João 3.16 quando diz que “amou o
mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que
nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. A expressão grega para dizer que
Deus amou, neste texto, foi agapao, que se refere ao amor prático, um amor que
se comove, um amor que se enche de íntima compaixão. Ensina-nos que não basta
dizermos que amamos, e nem mesmo apenas amarmos, há que se avançar para o
segundo estágio que é a prática do cuidado (1Jo 3.16-18). Não há demonstração
de cuidado sem prática, assim como não há amor sem compaixão.
O Novo Testamento foi escrito em língua grega, o
idioma dominante naqueles dias. No grego antigo encontramos quatro vocábulos
conceituais que foram traduzidas para o português como ‘amor’: Ágape, Philia
Eros e Storge – cada um destes vocábulos possuem conceitos diferentes (Veja aqui o conceito de cada uma delas). Na língua portuguesa, usamos a palavra amor para
descrever alguns sentimentos e atitudes distintas. Por exemplo, usa-se ‘amor’ tanto
para o amor entre irmãos ou amigos como para o amor mais erótico entre um
casal, apesar de serem tipos de amor totalmente diferentes. Paulo afirma em 1º
Coríntios 13.8 que o amor é a força mais poderosa deste mundo. O resumo
escriturístico é que Deus é amor, sendo este uma característica fundamental de
Deus. Nada é mais valioso que o amor. Mas ao se tratar deste amor
característico de Deus e que é exigido dos seus filhos, a palavra que mais se
aproxima em nossa língua, embora tenha perdido a sua força no decorrer dos
anos, é ‘caridade’; isso porque ‘Ágape’ significa o amor perfeito e
incondicional, que não depende de empatia, de sentimentos. Paulo discorre em 1º
Coríntios 13.4-7 sobre esse tipo de amor: altruísta, justo, verdadeiro e
paciente. O amor perfeito (ágape) nunca acaba. Esse é o tipo de amor que está
acima de todos os outros; É uma decisão, uma escolha incondicional de amar e
fazer o bem ao outro. Deus demonstra esse amor perfeito por nós ao nos oferecer
a salvação, sem merecermos, e nos ensina a oferecer o mesmo tipo de amor a
todas as pessoas à nossa volta.
3.
Caridade. O samaritano da parábola não apenas aproxima-se do homem que está
ferido à beira do caminho e nem somente se compadece dele, mas decide curá-lo,
dar-lhe atendimento de emergência e conduzi-lo a uma estalagem (v.34). Já na
estalagem, o samaritano recomenda ao hospedeiro que cuide do homem, pois ele
prosseguiria sua viagem e, quando voltasse, pagaria qualquer despesa que
tivesse sido gerada (v.35). Tais atitudes são uma clara demonstração de amor,
ou seja, o amor do samaritano ao próximo foi expresso em atitudes e ações, ao ponto
de se comprometer até mesmo com os gastos que seriam gerados com a hospedagem
do homem ferido. Para Cristo, só existe realmente caridade se houver
demonstração de amor, pois no texto de João 3.16 não diz apenas que Deus
“amou”, mas também que Ele “deu” o seu Filho. A evidência de que Deus ama é
demonstrada pela sua compaixão pelo mundo perdido. Deus se compadece e mostra
isso na prática (Rm 9.16).
Note como o comentarista emprega o vocábulo
‘caridade’: “se compadece”; “decide curá-lo”. O termo português ‘caridade’
tornou-se desgastado, perdeu seu sentido real ao passar dos anos. Diferente da
época quando pastor calvinista João Ferreira de Almeida (1681)
traduziu a Bíblia para a língua portuguesa. Naquela época, ‘caridade’ traduzia
bem o termo ‘ágape’; hoje, caridade é sinônimo de esmolar.
“A palavra ‘caridade’ tem sua origem no Latim, de
um termo que significava ‘afeto ou estima’, CARITAS. Este termo latino, por sua
vez, é derivado de outro CARUS, que significava ‘agradável, querido’. Este
último deu origem também ao termo ‘caro’, quando se refere a alguém que se tem
afeto, como em ‘caro amigo’” (GRAMATICANET).
Caridade é a boa disposição do ânimo para com todas as criaturas; pena que se
sente pelos sofrimentos alheios. A palavra caridade também está relacionada com
“fazer bem.” Caridade é algo que expressa ação e não apenas sentimento. Do
ponto de vista teológico digo que a tradução para caridade é mais adequada, pois
o amor de Deus por nós foi representado pela ação (Jo 3.16). E do mesmo modo só
demonstramos que temos o amor que é um mandamento, através de ação. Quando
transformamos amor em ação (caridade) cumprimos o ensinamento de Jesus em
Mateus “Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus
pequeninos irmãos, a mim o fizeste.” (Mt 25.40).
III. O NOSSO
PRÓXIMO É QUALQUER PESSOA NECESSITADA
1. O
“próximo”. Na Parábola, quem se fez “próximo” do homem ferido foi uma pessoa que o
doutor da Lei teria como completamente indigna de receber sua atenção e
cuidados, visto que judeus e samaritanos nutriam recíproco sentimento de
desprezo e quase ódio. Não havia para aquele doutor exemplo mais doloroso para
Cristo utilizar-se. Isso fica demonstrado quando, ao final da narrativa, Jesus
pergunta ao doutor da Lei qual dos três havia sido o “próximo” do homem que foi
espancado pelos salteadores (v.36) e este se limita a responder: “O que usou de
misericórdia para com ele” (v.37). Ou seja, ele sequer diz que foi o “samaritano”.
Mesmo assim, a palavra de Jesus, visando responder a pergunta inicial (v.25),
foi que o doutor da Lei fizesse o mesmo. Da mesma forma devemos colocar em
prática o amor que afirmamos ter a Deus sobre todas as coisas, e ao nosso
próximo, pois só assim fazendo estaremos aptos à vida eterna. Infelizmente, nos
tempos de Jesus a hipocrisia humana, que faz com que homens conhecedores não
sejam praticantes do próprio conhecimento, já estava bem presente na sociedade
judaica. Por isso, Jesus teve diversos embates com os doutores da Lei (Mt
23.1-36).
Nesta parábola, Jesus toca na ferida do doutor da
Lei. Ora, durante cerca de 800 anos os judeus não se davam com os samaritanos,
porque em 722, Salmanezer ou Sargão II, reis da Assíria tomara Samaria e substituíram
seus habitantes por babilônios e sírios, que trouxeram suas tradições, crenças
religiosas contrárias às dos judeus e ali nasceu uma espécie de ‘judaísmo
misturado’. Os samaritanos eram inimigos dos judeus, um foco purulento
incrustado no seu território. Eram considerados como cães e assim chamados
pelos judeus; Note como Paulo utiliza a palavra “cães” com a mesma ironia que
os Judeus chamavam os gentios de cães (Mt 15.26). Em Filipenses, ele aplica o
sentido de “cães”, aos judaizantes, que na comunidade atrapalhavam o
crescimento em Jesus Cristo, querendo um retorno a pratica a lei judaica com
todos os seus preceitos. Será que aquele mestre da Lei teria um samaritano como
seu próximo? Na concepção cristã, o nosso próximo não está limitado à nossa família,
nossas amizades, nossa raça. Nosso próximo é todo aquele que necessita de
auxílio e quem podemos ajudar. A parábola nos ensina que a verdadeira religião
é a prática do amor. É crer fazendo. É viver o que crê, e fazer o bem que se
deve fazer. Tiago diz: "A religião pura e sem mácula, para com o nosso
Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações."
(Tg 1.27).
2. Ajudar ao
próximo não salva, mas é algo que deve ser feito por quem é salvo. Nesta parábola, Jesus não quer
afirmar que o samaritano pudesse alcançar a salvação por causa de sua
beneficência e de sua atitude amorosa. Jesus apenas está respondendo à pergunta
formulada pelo professor da Lei. É importante salientarmos que fazer obras de
caridade não leva ninguém à salvação (Ef 2.8,9). Contudo, os verdadeiros filhos
de Deus são “feitos” para as boas obras, isto é, as realizam naturalmente (Ef
2.10; Tg 2.14,17). Assim, Cristo mostra ao mestre da Lei que uma pessoa sincera
soluciona facilmente essa questão que, aos olhos daquele homem, parecia tão
complexa.
No Cristianismo o fato de fazer caridade não nos
garante crédito no céu; mas é uma demonstração de que somos de fato cristãos –
parecidos com Cristo. Quando Jesus terminou de contar esta história do bom
Samaritano, disse para o doutor da lei: "Vai e procede tu de igual
modo, e mais,... faze isto e viverás." (Lc 10.37-38). Em Efésios
2.8-9, Paulo afirma que a salvação é pela graça, mediante a fé. Ele acrescenta
claramente que as obras não fazem parte do processo da salvação para que
“ninguém se glorie”. As obras, como defende Tiago, têm o seu papel, não de
salvar, mas são decorrentes da fé (são frutos): “Pois somos feitura dele,
criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para
que andássemos nelas.” (Ef 2. 10). As boas obras devem fazer parte da vida
do salvo, mas não são o agente da salvação.
3. A
medida do amor para com o necessitado. A medida do amor para com o próximo não deve
ser estabelecida com base nas diferenças de nacionalidade, de confissão
religiosa ou do grupo social, mas unicamente com base na necessidade do outro.
O próximo que se encontra em uma situação de emergência e precisa que algo seja
realizado por ele naquele momento, não pode esperar qualquer análise ou palavra
“motivacional” (Tg 2.14-16). Por isso, estamos falando em ações concretas,
ajudas materiais, assim como na parábola contada por Jesus.
Em Tiago 2.14-26, a insistência do apóstolo para que
os cristãos pratiquem a palavra de Deus, e não apenas a ouçam, e sua exigência
das obras como partes integrantes da fé, compõem esta ênfase. A obediência à
“lei da liberdade”, a exigência de Deus resumida por Jesus, deve ser sincera e
coerente. E esta obediência tem um importante aspecto social. O mandamento para
que amemos nosso próximo como a nós mesmos é a “lei régia” (2.8). Tiago insiste
em que “a religião pura e sem mácula” deve se manifestar no cuidado para com os
desprivilegiados e menos favorecidos (“visitar os órfãos e as viúvas nas suas
tribulações”, 1.27) e numa atitude altruísta e mansa diante dos outros
(3.13-18). O favoritismo demonstrado aos ricos transgredi a “lei régia”
(2.1-7), assim como também a maledicência (4.11-12).
4.
Sendo o próximo. O doutor da Lei havia perguntado quem era o próximo dele (v.29). Na
resposta de Jesus, a pergunta é inversa, ou seja, de quem eu posso, ou devo,
ser o próximo? (v.36). A questão colocada pelo doutor da Lei não continha
nenhum interesse ou compromisso em ajudar de verdade. Já a indagação de Jesus
forçava-o a pensar acerca dessa obrigação. De acordo com o ensinamento de
Jesus, o que fica claro é que o “próximo” trata-se de qualquer pessoa que se
aproxima de outras com amor verdadeiro e generoso sem Levar em conta as
diferenças religiosas, culturais e sociais. Jesus retoma a pergunta inicial e
conclui dando uma resposta inesperada, pois o caminho proposto por Ele é
pautado no amor, com demonstrações práticas, para com todos os homens (Lc
10.37). O coração cheio de amor fala e age de acordo com a consideração do
Mestre, perguntando sempre de quem eu posso ser o próximo, ou seja, a quem devo
socorrer.
“Muitos dizem ser discípulos de Cristo, mas estão
distantes das virtudes bíblicas. Estes não evidenciam sua fé por intermédio de
suas atitudes. Os pseudodiscípulos visam os seus interesses particulares e não
a glória de Deus. Precisamos urgentemente priorizar o Reino de Deus e a sua
justiça (Mt 6.33). Tiago nos ensina, assim como João Batista (Lc 3.8-14), que
precisamos produzir frutos dignos de arrependimento” (3Trim2014_Lição 1: Tiago — A fé que se
mostra pelas obras).
Observe como o samaritano ama: “Ele o viu” (Lc
10.33) - o sacerdote e o levita também, mas não demonstraram amor. Ele viu e
reconheceu a necessidade urgente de resgatar esse homem. Ele assumiu o fardo do
homem ferido como se fosse o seu próprio – isso é o amor de Deus, isso é o
significado do termo ágape.
SUBSÍDIO DIDÁTICO
Conforme estamos aprendendo, auxiliar as pessoas
necessitadas é também parte da missão da Igreja de Jesus Cristo. Proponha aos
alunos a visita a uma instituição de assistência social (orfanato, asilo,
abrigo, etc.) e instrua-os acerca do compromisso que temos, não apenas
coletivo, mas também individual, de agir de forma solidária para com o nosso
próximo. Tal visita pode ser feita em áreas carentes da cidade ou mesmo no
centro das grandes cidades onde se abrigam, embaixo das marquises, uma grande
quantidade de moradores de rua, inclusive, idosos e crianças. Há muito por
fazer e seria interessante que não ficássemos apenas com a reflexão em sala de
aula, mas saíssemos das “quatro paredes” da Escola Dominical transformando em
prática àquilo que estamos aprendendo bíblica e teologicamente em sala.
CONCLUSÃO
A parábola estudada na
lição de hoje foi uma “história-exemplo”, pois se trata de um mandamento de
amar e exercitar a misericórdia para com o próximo. Aqui aprendemos que o amor
não aceita limites na definição de quem é o próximo. Enquanto todas as
sociedades e seus segmentos sociais acabam levantando barreiras para separá-las
das demais pessoas, os discípulos de Cristo devem olhar para os seres humanos
com igualdade, pois o próprio Deus não faz acepção de pessoas (At 10.34).
A melhor maneira que existe de demonstrar que
realmente amamos a Deus é amando a todas as pessoas, independente de quem
sejam. Mesmo aquelas que não são nossos amigos, ou que pensamos que não merecem
nossa atenção, como foi o caso do bom samaritano. Nós mesmos somos naus e
apesar desta condição do nosso homem interior, Deus nos ama. Demonstrar amor
aos demais não é só falando e nem ajudando somente quem conhecemos e a quem
gostamos. Demonstrar amor é ajudar mesmo aqueles a quem detestamos por suas
práticas e conduta. Em 1 João 3.18 está escrito “filhinhos, não amemos
apenas de palavras e de boca, mas de fato e de verdade”. A parábola do bom
samaritano foi dada a fim de ilustrar o importantíssimo mandamento da lei: “Amarás
ao teu próximo como a ti mesmo”.
“Achando-se as tuas palavras, logo as comi, e a
tua palavra foi para mim o gozo e alegria do meu coração; porque pelo teu nome
sou chamado, ó Senhor Deus dos Exércitos”. (Jeremias 15.16)
Francisco Barbosa
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